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Um problema de atuação desinformada
Um dos grandes problemas (na origem de um dos grandes desastres ainda por acontecer) da gestão centralizada dos recursos de saúde foi que (além de todos os adjectivos que se poderiam utilizar, como “errática”, “populista”, “acrítica”, “exagerada”, etc…) se geriu a pandemia em Portugal como se ela tivesse a dimensão da italiana, ou espanhola.
E se algumas medidas provavelmente foram boas apesar da descontextualização (convinha também termos a modéstia de perceber que muito do que dizemos e fazemos nestes tempos são mais do domínio do “achismo”, e do peso relativo que atribuímos a uma série de princípios fundamentais), quer em termos nacionais para evitar a entrada “em peso” do vírus, quer em termos regionais em função dos surtos (no Norte primeiro, e agora mais a Sul), muito mais houve também de francamente desproporcionado às realidades do terreno.
Os suecos (sempre os suecos…) dizem que o confinamento resulta muito bem, só que… não é possível (vide Tegnell ou Giesecke). A não ser que o vírus desapareça subitamente por artes mágicas. Que quem confina tem que desconfinar (com a mesma certeza que as pessoas têm que comer), e que os riscos que a “psicologia do confinamento” induz são altamente ameaçadores de princípios básicos de Liberdade individual que damos precipitadamente por adquiridos nessa fase, e que é aquela que vivemos agora. Com uma eficácia no mínimo incerta, dos sucessivos reconfinamentos ou semi-confinamentos que invariavelmente se seguem a desconfinamentos mais ou menos parciais.
Até neste fórum não faltam vozes que, perante qualquer aumento de casos ou notícia de surto localizado, desatam a clamar por restrições, proibições e punições diversas. Sem sequer saber se os sistemas de saúde estão saturados ou não, se o aumento está descontrolado ou continua local/regional, residual e estável. E essa paranóia (“do medo”) é obviamente multiplicada por muitos quando falamos de população em geral.
Junte-se a isso as dificuldades económicas crescentes, uma economia convalescente que volta a agonizar antes sequer de se ter curado completamente, dependente de Turismo e das suas poucas exportações, empregos que se perdem, empresas a falir e dinheiro que não chega ao fim do mês, e não é complicado perceber-se que o nível de dificuldade presente é um mero aperitivo para o que há de vir.
Aliado a isso houve a brutal exigência (legal!) de preparação permanente dos profissionais de saúde, com apelo a reservistas e tudo, daquilo que se esperava ser uma primeira e brutal vaga, mas afinal nunca motivou sequer uma mudança para bandeira amarela de um mar globalmente flat, salvo alguns focos bem localizados. Houve desmultiplicação de camas que ficaram, globalmente, vazias, com multiplicação de horas de trabalho para assegurar as presenças e prevenções para as mesmas, stress e cansaço para todos os actores, e afinal nem se ultrapassaram, objectivamente, sequer os números de uma banal época de gripe. Não porque o coronavírus tenha a mesma benignidade, mas simplesmente porque nunca chegou realmente a penetrar, profundamente, no nosso país como o fez noutros.
Ou seja, e tal como não deveria surpreender ninguém, decisões altamente centralizadas com avaliações enviesadas que confundem situações regionais com imperativos nacionais (e neste caso até internacionais), alicerçadas em estruturas públicas esclerosadas e sem qualquer flexibilidade de adaptação, maioritariamente geridas por personalidades medíocres oriundas do tachismo endémico no nosso país, resultou no esgotamento da totalidade do pessoal de saúde em nome de uma vaga que, para a maioria, nunca passou de uma miragem. Com a agravante da acumulação de tudo o que se devia ter feito e deixou de fazer (e terá que ser feito um dia…).
E como a pandemia é de facto real, e o vírus efectivamente demasiado letal para poder ser subestimado, a verdadeira vaga, verdadeiramente “primeira”, e que ainda está por vir, e que segundo muitos é uma inevitabilidade, vai encontrar um ponto fraco no último sítio onde ele devia existir. E numa altura em que certas medidas tidas como muito “virtuosas” deixam sequer de ser equacionáveis, sob pena de todos acabarem por morrer de fome.
Mas também pode ser que tudo, simplesmente, vá acabar por ficar mesmo bem.
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