No dia em que arranca a primeira fase da vacinação gratuita contra a gripe, que vai abranger utentes de lares, rede de cuidados continuados, profissionais do Serviço Nacional de Saúde e grávidas, o cardiologista Carlos Rabaçal, da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, sublinha que é essencial a vacinação de quem tem problemas do coração, assim como a manutenção durante inverno das medidas de proteção, como a máscara (em aglomerados), a distância e a desinfeção das mãos.
“Hoje, face à situação que ainda estamos a viver da pandemia de covid, percebemos que os vírus podem ter uma influência dramática na função de vários órgãos e de vários sistemas do corpo humano, em particular do coração”, considerou o especialista, sublinhando: “É incrível como antigamente se via pessoas aglomeradas nos bancos das urgências dos hospitais, com tosse, e ninguém usava máscara”.
Em declarações à Lusa a propósito do Dia Mundial do Coração, que se assinala no dia 29, o cardiologista lembra que o efeito conhecido da Covid-19, tanto no coração como nos pulmões, é, em parte, “resultado de um processo inflamatório que o próprio vírus espoleta a partir da resposta do hospedeiro”, uma situação que “também acontece na gripe”.
“As pessoas que têm maior risco, particularmente aquelas que já têm uma qualquer doença, que já tiveram um enfarte do miocárdio, que sofrem de angina de peito ou que têm insuficiência cardíaca, são aqueles que passam pior por qualquer infeção, seja ela viral ou bacteriana”, sublinha o especialista.
Carlos Rabaçal acrescenta que “uma situação cardiovascular traduz um aumento do risco para qualquer doença” e que “todos os organismos internacionais recomendam que as pessoas que tenham um qualquer tipo de doença cardiovascular devem vacinar-se contra a gripe para não correrem mais riscos de terem problemas sérios”.
Apesar de ser uma área “algo controversa”, o cardiologista defende que “mesmo as pessoas que não têm doenças, com a gripe têm um maior risco de vir a desenvolver um problema cardíaco”.
“Há vários estudos dos últimos anos que mostram de uma forma clara (…) que, por exemplo, nos primeiros três dias após a contração de uma infeção gripal pela influenza, o risco de enfarte do miocárdio é cerca de seis a 10 vezes maior e o risco de acidente vascular cerebral também é cerca de 12 vezes maior do que fora destas épocas”, explicou o especialista, sublinhando: “Há efetivamente uma relação entre as infeções por influenza, seja A ou B, e o aparecimento de doenças cardiovasculares em pessoas aparentemente saudáveis”.
Este risco – concluiu – “é superior em quem já tem um fundo [problema], seja ele cardiovascular, seja ele respiratório, ou até metabólico”.
“Nós sabemos que estas coisas todas têm custos, mas, por exemplo, a vacina contra a gripe está indicada em vários locais do mundo para indivíduos que não têm qualquer tipo de substrato de doença”, acrescentou.
Aponta ainda um estudo feito em Portugal, que pretendeu avaliar o impacto não só nas pessoas, mas também nos recursos, particularmente nos custos dos internamentos, e que mostrou que nas estações gripais entre 2009 e 2018 houve “muitos internamentos de gente abaixo dos 65 anos, dos 50 e até dos 40”.
“Hoje não temos dúvida de que a melhor forma de prevenir as complicações da gripe é a vacinação. Assim como a melhor forma de prevenir as complicações da pneumonia é a vacinação”, defendeu.
Carlos Rabaçal sublinha que durante a estação gripal, que é definida entre outubro e maio, “há uma coincidência nos picos de influenza e de internamento por enfarte do miocárdio”.
“Nesta época, habitualmente a taxa de internamentos por enfarte é cerca de 20% superior ao que é fora desta época”, insiste, lembrando também a importância de na época gripal se manter algumas das medidas de proteção impostas pela pandemia.
“Faz sentido apelarmos às pessoas, particularmente as que têm doenças crónicas, para não correrem riscos e se vacinarem contra a gripe e também contra a pneumonia, se não o fizeram. Assim como que se continue a ter os cuidados elementares de distanciamento e uso de máscaras, sobretudo em aglomerações, de forma a prevenir o aparecimento de outras epidemias”, concluiu.
LUSA/HN
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