António de Sousa Uva Médico do Trabalho, Imunoalergologista e Professor Catedrático da ENSP (UNL)

COVID-19: o que é “invisível” é muito mais do que é “visível”

08/04/2020

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COVID-19: o que é “invisível” é muito mais do que é “visível”

04/08/2020 | Opinião | 0 comments

Há muito tempo que nos encontramos em modo “globalização” da COVID-19 e vamos conseguindo, pelo menos na Europa, “conviver” com o SARS-Cov-2 evitando, como podemos, a dimensão do impacto na nossa forma de viver e mantendo o melhor nível possível de qualidade de vida. Esta sim é uma verdadeira “quadratura do círculo”.

De facto, o número de novos casos vai sendo controlado e, se dúvidas houvesse, a percentagem da população, avaliada serologicamente, mantém-se muito baixa sendo uma verdadeira “prova do algodão” dos principais meios de transmissão da doença. Tal não invalida que a conjugação do número de casos de COVID-19 e que o doseamento de anticorpos específicos não multiplique por seis, sete ou oito a prevalência “oficial”. Não se andava muito longe da realidade quando se multiplicava por dez o número de casos “oficiais”.

O número de novos casos diário tem um perfil em “dentes de serra”, aparentemente numa tendência decrescente ainda que os óbitos, a ocupação dos Cuidados Intensivos e o número de outros internados se mantenha, aparentemente, estável no seu declínio há já alguns meses.

As leituras que se vão fazendo da “galopante” criação de conhecimento sobre a história natural da COVID-19 (ainda que com muitos “escotomas”) são, quase sempre, norteadas pelo “oásis” da imunidade de grupo (ainda tão longe de alcançar e sempre “sebastianista” em relação à imunização específica …) e vamos “esquecendo” outras interpretações da realidade. Por exemplo, e de forma caricatural, a nossa estrutura de luta contra o SARS CoV-2 está supostamente dirigida a cerca de 15% dos casos “reais” já que os outros 5/6 ou 7/8 (ou mais) de casos não são casos “oficiais”. Tal tem por certo mais a ver com o vírus (mas infelizmente os vírus são todos eles, oficiais ou não) que com o sistema de “enfrentamento” instalado.

Mas sabendo-se isso pelos já frequentes estudos serológicos, também em Portugal, não deveríamos investir mais ainda na prevenção dessa transmissão “invisível” que só adquire visibilidade quando aparece um sintomático ou um assintomático testado positivo que “desencadeia” o referido sistema de “enfrentamento” instalado? E de que forma, neste instável equilíbrio entre a Economia, a Sociologia e a Saúde Pública?

As “politics” quase tomam conta das “policies”, como já antes foi por nós referido, e o plano de contingência nacional mantém-se o mesmo, seis meses depois. Mas, de facto, as regras de actuação em relação aos assintomáticos deverão (ou não) ser “tendencialmente” semelhantes às adoptadas para os casos sintomáticos?

Os “combatentes” essencialmente nos hospitais (mais visíveis) ou na estrutura de Saúde Pública (menos visíveis), com o actual conhecimento, não necessitarão de melhores políticas públicas de saúde que deveriam (ou não) estar mais alinhadas com esses conhecimentos que se vão adquirindo?

Como já antes referimos a gestão do risco numa emergência em Saúde Pública tem, definitivamente, de assentar na “teoria do risco” e não na “teoria da culpa” por uma razão simples: o que se pretende é, no mínimo, uma menor proporção de casos (já que a erradicação, por agora, não parece possível) e a existência de “culpados” não altera a distribuição da doença porque essa não é uma característica válida. Não deveria esse enquadramento, e o actual conhecimento obtido nos estudos serológicos, determinar políticas públicas de saúde mais alinhadas com esse conhecimento adquirido que deixou de ser “opinião”?

Não há ninguém mais interessado na sua saúde do que os próprios e, como aconteceu com o uso da máscara, todos nós temos que nos tornar “agentes” dessas “novas” políticas públicas. Sem pessoas não há (ou reduz-se imenso a) “circulação” do vírus e o distanciamento físico é, de facto, o “Gold standard” da prevenção da doença e é nas pessoas que temos que investir ainda mais.

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