Matemáticos desenvolvem modelo para prevenir fístulas em grávidas

16 de Setembro 2020

É melhor investir em medidas que facilitam as visitas de uma grávida ao médico do que em medidas para tratar lesões pós-parto, são as conclusões de dois matemáticos que utilizaram o Uganda como exemplo.

Uma fístula é uma ligação entre a vagina e a bexiga ou o reto que pode tornar-se saliente nas mulheres durante um parto prolongado ou como o resultado de uma violação. Esta ligação causa incontinência em que o paciente fica incapaz de reter urina ou fezes, o que por sua vez conduz a mais problemas médicos e sofrimento físico, mental e social.

O sistema de cuidados médicos no Uganda está bem desenvolvido, particularmente nas áreas metropolitanas, apesar disso a o número de ocorrência de fístulas durante o parto está entre os mais altos de África. Foi calculado que entre 1,63% e 2,25% das mulheres em idade de ser mãe, dos 15 aos 49 anos, são afetadas.

Betty Nannyonga, pós-doutorada na Universidade de Linköping (LiU), que também trabalha na Universidade de Makerere, em Kimpala no Uganda, e Martin Singull, professor associado em estatística matemática no Departamento de Matemática da LiU publicaram um artigo na publicação científica PLOS ONE, que demonstra como os recursos disponíveis podem ser melhor rentabilizados.

“Tentámos construir um modelo matemático para mostrar como prevenir fístulas obstétricas em mulheres durante a gravidez prolongada. Isto é muito importante num país como o Uganda”, diz Martin Singull. 

O Estudo analisa dados do Levantamento Demográfico de Saúde do Uganda de 2016. Este levantamento colecionou informação de 18506 mulheres com idades entre os 15 e os 49 anos que vivem em 15 regiões do Uganda. Durante os últimos anos têm sido estabelecidas algumas clínicas especiais conhecidas como acampamentos de fístulas para oferecer cirurgias às mulheres afetadas. Dados recolhidos junto de duas destas clínicas, em partes diferentes do país, foram também incluídos no estudo.

A investigação concluiu que um número de mulheres significativamente inferior ao que seria esperado foi alvo de cirurgia. “Os nossos resultados mostram que o Uganda tem um enorme atraso no que diz respeito às mulheres que deveriam ser operadas à fístula. Numa das regiões que analisámos descobrimos que por cada mulher que foi sujeita a cirurgia, pelo menos oito mais deveriam ter recebido tratamento”, acrescenta Betty Nannyonga.

Os investigadores olharam para a relação entre os recursos necessários para fornecer a cirurgia para as mulheres depois de se terem lesionado, e para os recursos correspondentes necessários para fornecer cuidados de saúde profissionais às mulheres durante a gravidez, que inclui a disponibilidade de parto por cesariana, se necessário. Uma outra estatística arrepiante que tem que ser considerada é que no caso de a mãe contrair uma fístula, apenas 9% dos bebés sobrevivem

O modelo matemático demonstra que o número de mulheres que sofre de fístula decresce mais rapidamente se os recursos forem alocados a cuidados de prevenção maternos, e possibilitando o parto no hospital.

Contudo, os autores apontam para várias dificuldades que contribuem para a relativamente elevada ocorrência de fístulas, “mesmo que os cuidados médicos e profissionais de saúde estejam disponíveis no Uganda, a maioria das mulheres não disfruta de bons cuidados durante a maternidade. Em alguns casos, isto é porque a distância aos provedores desses cuidados é demasiado longa. Outras razões são a falta de dinheiro, ou a necessidade de autorização do marido. Não faria diferença investir nos centros de saúde se as mulheres não aparecerem”, diz Betty Nannyonga.

As regiões diferem consideravelmente na forma como prestam cuidados. É duplamente mais provável que uma mulher numa cidade visite um médico do que é para alguém que viva numa área rural. Um outro fator é a educação: aqueles com educação superior secundária são também duplamente mais prováveis do que aqueles sem esse grau, e o fato de terem educação superior à superior secundária aumenta as probabilidades por um fator de dois. O estatuto social desempenha também um papel importante: a probabilidade de prestar uma visita ao médico está, em algumas ocasiões, ligada diretamente à remuneração.

Uma moda positiva salientada pelas estatísticas é um aumento na fração de mulheres que recebem cuidados profissionais durante o parto (apesar de os números serem apenas para aqueles casos em que a criança nasce viva). Este número subiu de 37% no período de 2001, para 42% em 2006, 58% em 2011 e 74% em 2016.

“Os nossos resultados mostram que cuidados profissionais de saúde e cirrgia por si só não podem prevenir todos os casos de fístula: outras medidas serão necessárias”, conclui Betty Nannyonga.

NR/HN/João Marques

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