Envelhecimento das pessoas LGBTQI+ em debate em Coimbra

30 de Setembro 2024

As pessoas LGBTQI+ com mais de 60 anos passaram por momentos “particularmente desafiantes” e muitas enfrentam hoje solidão e discriminação ou vêm-se obrigadas a regressar a “um armário”, questões que serão debatidas no primeiro fórum sobre o tema.

Hoje e terça-feira decorre em Coimbra o primeiro Fórum Internacional sobre envelhecimento LGBTQI+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans, Queer, Intersexuais) organizado pelo Centro de Estudos Sociais (CES), da Universidade de Coimbra, e, à agência Lusa, a coordenadora explicou que nasce da constatação de que é necessário promover uma reflexão mais alargada sobre o tema.

Ana Cristina Santos apontou que o objetivo é ir além da discussão de questões como a saúde ou o envelhecimento ativo, “olhando para os silêncios”, tendo como ponto de partida que as pessoas LGBTQI+ que hoje têm mais de 60 anos “ao longo da sua vida atravessaram tempos particularmente desafiantes”.

Deu como exemplos a descriminalização da homossexualidade, que em Portugal aconteceu só em 1982, oito anos depois do 25 de Abril, ou o “estigma associado à chamada crise da SIDA”.

“Estas pessoas (…) chegaram ao século XXI em contextos em que finalmente há um enquadramento jurídico que permite a proteção de direitos, mas isso não significa que este setor da população se sinta visível ou ouvido naquelas que são as suas expectativas enquanto pessoas mais velhas”, salientou a responsável.

Admitiu que há questões comuns e transversais, mas apontou que “há também especificidades que muitas vezes passam ao lado” exatamente porque quando se fala de velhice subentender-se que os problemas são iguais para todos.

No que às pessoas LGBTQI+ diz respeito, a responsável lembrou que são pessoas que muitas vezes não têm laços familiares ou uma rede informal de apoio, “justamente por via da discriminação”, porque “viram os seus laços familiares, biológicos, cortados a partir do momento em que se assumiram”.

Por outro lado, referiu, quando estas pessoas eram mais jovens, o casamento entre pessoas do mesmo sexo não estava garantido e a parentalidade também não, o que explica que muitas não tenham filhos e, por isso, “a solidão [seja] agravada”.

“Quando estas pessoas chegam a uma situação em que precisam de recorrer a uma instituição, em que se sentem particularmente vulneráveis, os relatos que temos é que muitas vezes regressam a um armário”, denunciou.

Ana Cristina Santos explicou que “há o pressuposto de que aquela pessoa, aquele utente, é heterossexual” e que “em muitas das situações, as pessoas não sentem coragem para enfrentar esse peso, essa expectativa social”.

“Isso é uma violência psicológica que é agravada nestes casos e que tem consequências sobre o seu bem-estar”, defendeu.

A isto soma-se o facto de os profissionais das áreas da gerontologia ou geriatria não terem formação sobre estas matérias.

“Nós queremos que todas as pessoas se sintam seguras quando entram em espaços que têm a ver com cuidado, têm a ver com saúde, independentemente da idade e independentemente da orientação sexual e identidade de género”, acrescentou.

A responsável frisou, por outro lado, que o fórum não vai servir apenas para falar de “sofrimento, dor ou solidão” e que pretende ser também um momento para celebrar a vida destas pessoas, “justamente enquanto sobreviventes”.

“É uma narrativa de libertação que não existia na vida destas pessoas quando tinham 20, 30 ou 40 anos por razões diversas e que finalmente, através do envelhecimento e daquilo que lhe está associado, surge com força [e traz] essa sensação de finalmente posso ser quem eu sou”, apontou.

Destacou que estão em causa pessoas que são elas próprias “autênticos arquivos de momentos históricos irrepetíveis”, através dos seus corpos e das suas vidas.

Ana Cristina Santos explicou que o fórum incide sobre os países do sul da Europa, para o qual foram convidados vários especialistas, sobretudo da academia, de vários países europeus para discutirem em conjunto questões associadas a políticas sociais e medidas a implementar.

O Fórum termina na terça-feira, dia 01 de outubro, quando se assinala o Dia Internacional do Idoso.

LUSA/HN

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