“O país na altura estava completamente impreparado e houve muitas dificuldades. Mudámos de Governo. Lembro-me quando me ligaram, eram duas da manhã, a dizer que havia um alerta e os casos eram importados e o país não estava preparado”, afirmou à Lusa Dionísio Cumba.
A Guiné-Bissau confirmou oficialmente os dois primeiros casos de Covid-19 a 25 de março de 2020, mas as autoridades sanitárias não conseguirem antecipar as dificuldades que iam enfrentar no terreno, nomeadamente a recusa da população em aceitar que a doença existia e o estigma social, o que ainda hoje é visível.
“Naquela altura muitas pessoas não estavam a colaborar. Era uma situação dos brancos e havia muito estigma. Quando se confirmaram os casos, as pessoas diziam muita coisa. Estávamos sempre sob pressão”, recordou o também diretor clínico do Hospital Nacional Simão Mendes e presidente do Instituto Nacional de Saúde Pública.
Segundo Dionísio Cumba, as pessoas diziam que a Covid-19 não existia, que o país não tinha capacidade para diagnosticar a doença e que os testes não prestavam.
“Foi muito difícil convencer as pessoas. Continua a haver essa dificuldade de mentalizar as pessoas para cumprirem as medidas de prevenção”, sublinhou.
E essa negação, disse o médico, criou “muitos problemas”.
“Antes, até os próprios técnicos tinham medo de enfrentar os pacientes com Covid-19. Eram ameaçados. Ninguém dava oportunidade aos técnicos de fazer o seu trabalho. Lembro-me de uma jovem que o pai ameaçou os técnicos e nem a polícia a conseguiu trazer. Foram ameaçados com feitiçaria”, contou.
Mas, depois os casos começaram a reduzir e só no início deste ano a Guiné-Bissau voltou a registar um aumento de casos e a entrada das novas estirpes do coronavírus SARS-CoV-2, mais virulentas.
“Agora estamos com esta esperança das vacinas. Que possa trazer a esperança de controlar a situação. Este período é mais crítico. Estamos bastante preparados para dar assistência, a capacidade de resposta é muito melhor”, mas ainda há desconfiança, afirmou Dionísio Cumba.
Segundo o médico, essa desconfiança existe porque o sistema não dá às pessoas a certeza que a doença existe, porque as medidas decretadas acabam por nunca ser implementadas.
“E muitos continuam a fazer esta resistência. Estamos a ter vidas ceifadas devido à situação, sobretudo, à nova variante que está a circular”, disse.
Questionado sobre a atual situação no país, Dionísio Cumba explicou que não está a ser testada a realidade.
“Os técnicos estão em greve. A situação piorou entre as pessoas que já têm outras patologias”, afirmou.
“Portanto, estamos a ter esta grande dificuldade em saber se o país está com uma descida ou com uma subida. Só com o fim da greve, com um rastreio mais alto, é que podemos eventualmente ter uma ideia clara da tendência. Os dados que vimos mostram uma ligeira descida de casos, mas não espelham efetivamente o que temos neste momento”, disse.
A Guiné-Bissau registou mais de 3.500 casos de Covid-19 desde o início da pandemia e 55 vítimas mortais.
Na sequência do aumento de casos que se tem registado desde o início do ano, o Governo guineense decidiu prolongar o estado de calamidade por mais 30 dias, até 25 de março.
LUSA/HN
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