Alguns medicamentos para a hipertensão podem alterar o risco cardíaco em pessoas com VIH

28 de Maio 2021

Quando pessoas que vivem com o vírus da imunodeficiência humana (VIH) desenvolvem hipertensão, o tipo de medicamento escolhido para o tratamento inicial pode influenciar o seu risco cardiovascular, de enfarte e de insuficiência cardíaca, segundo uma nova investigação publicada na revista “Hypertension”, da “American Heart Association”.

Com os medicamentos antirretrovirais atuais, as pessoas com VIH vivem mais tempo. No entanto, as pessoas com VIH que recebem terapia antirretroviral (TARV) têm maior probabilidade de desenvolver hipertensão, e problemas cardíacos relacionados com a hipertensão, em comparação com as pessoas que não têm o vírus.

O estudo publicado na “Hypertension” é o primeiro que analisa como a escolha de medicamentos para a pressão arterial influencia o risco, a longo prazo, de doenças cardíacas, enfarte e insuficiência cardíaca, numa população com maior risco de doenças cardiovasculares (DCV).

“Suspeitamos que poderia haver diferenças no risco cardiovascular, com base nos medicamentos que são selecionados para tratar a hipertensão nas pessoas com VIH, devido a potenciais interações entre os medicamentos para a pressão arterial e algumas terapias usadas para o VIH. Além disso, fatores como a forma como o corpo lida com o sal, a inflamação e o envelhecimento acelerado dos vasos sanguíneos, podem afetar o risco de eventos cardíacos em pessoas com VIH de maneira diferente das pessoas que não têm VIH. Isso pode ser influenciado pelo uso de medicamentos para tratar a hipertensão”, referiu a autora sénior do estudo, Jordana B. Cohen, professora de Medicina e Epidemiologia na “Perelman School of Medicine” da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia.

Neste estudo, os investigadores fizeram uma revisão dos registos de 8.041 veteranos com VIH (idade média de 53 anos, 97% homens, 49% adultos negros) que desenvolveram hipertensão entre 2000 e 2018; 6.516 nunca foram diagnosticados com problemas cardíacos ou dos vasos sanguíneos.

No início do estudo, dos 8.041 pacientes, 5.979 (74%) estavam a fazer medicação antirretroviral e 6.582 (82%) receberam terapia com medicação anti-hipertensiva única: 1.025 (13%) betabloqueadores, 848 (11%) bloqueadores dos canais de cálcio (CCB), 1.905 (24%) IECA/ BRA, e 1.865 (23%) diuréticos. Os investigadores compararam então a ocorrência, entre os participantes no estudo, de doença cardíaca, enfarte ou insuficiência cardíaca nos 6,5 anos seguintes, com base nos diferentes tipos de medicamentos para a hipertensão.

Durante o período médio de acompanhamento de 6,5 anos, 25% dos veteranos registaram um evento cardiovascular. Entre os veteranos que não foram diagnosticados com doença cardíaca no início do estudo, o risco de desenvolver doença cardíaca, insuficiência cardíaca ou enfarte pela primeira vez, foi 90% maior entre aqueles que tomavam betabloqueadores em comparação com os veteranos que faziam IECA / BRA. O risco aumentado estava presente independentemente de a pressão arterial estar ou não controlada. Os diuréticos tiazídicos e os CCB não aumentaram o risco.

Entre os veteranos com VIH que não tinham doença renal crónica, o uso de IECA/BRA foi associado a menor risco de desenvolver insuficiência cardíaca, em comparação com os pacientes que tomavam outros medicamentos e que apresentavam um risco cerca de 50% maior de insuficiência cardíaca.

“A pressão arterial e o risco de doença cardíaca em pacientes com VIH podem ser controlados com segurança com o tratamento de primeira linha da hipertensão com IECA, BRA, CCB, diuréticos tiazídicos e pode haver benefícios adicionais do tratamento inicial com IECA e BRA”, referiu Jordana Cohen.

Embora os CCB estejam entre os medicamentos recomendados para o tratamento inicial da hipertensão, neste estudo verificou-se que os betabloqueadores foram prescritos com mais frequência do que os CCB.

“Ficamos surpreendidos com as altas taxas de betabloqueadores prescritos, uma vez que não são recomendados como tratamento de primeira linha”, referiu a investigadora. “Suspeitamos que isso pode ser devido ao facto de muitas pessoas com VIH receberem cuidados de saúde primários das equipas de doenças infecciosas, que fazem um trabalho incrível no controlo do VIH, mas podem não estar focadas nas diretrizes e contraindicações do tratamento da pressão arterial. Idealmente, a equipa de cuidados de saúde primários do paciente e a equipa de doenças infecciosas devem trabalhar juntas para atingirem os melhores resultados possíveis”.

A investigadora afirmou que os resultados do estudo mostram a existência de possíveis danos dos betabloqueadores como tratamento de primeira linha para a hipertensão, independentemente de a pessoa ter HIV ou não.

Sendo uma análise retrospetiva, o estudo não pode estabelecer uma relação de causa e efeito entre a escolha do medicamento e eventos de doença cardíaca. Os resultados do estudo também podem ser afetados por fatores que os investigadores não foram capazes de medir, como alguns fatores sociodemográficos e as preferências do paciente na escolha do medicamento.

Embora os resultados do estudo tenham sido idênticos em homens e mulheres, a grande proporção de homens da amostra limita a possibilidade de generalizar os resultados para o sexo feminino. Os resultados deste estudo de veteranos que recebem cuidados de saúde através da “Veterans Health Administration” também não podem ser generalizáveis para não veteranos ou pessoas que não têm seguro saúde ou acesso a cuidados médicos de rotina.

“Os pacientes com VIH requerem uma atenção redobrada devido ao risco elevado de doenças cardíacas. É necessário desenvolver mais investigação dedicada ao estudo das necessidades únicas das pessoas com VIH e das que tomam TARV para otimizar a prevenção cardiovascular ”, referiu Jordana Cohen.

HN/Adelaide Oliveira

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