As dores de crescimento existem mesmo?

30 de Junho 2021

Nuno Craveiro Lopes Especialista de Ortopedia Infantil Hospital Cruz Vermelha Portuguesa

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As dores de crescimento existem mesmo?

30/06/2021 | Hospital cruz vermelha

Entre os motivos frequentes de consulta de ortopedia infantil destacam-se as queixas de dores nos membros inferiores. Os pais veem com uma história de uma dor inexplicável ao nível das coxas ou barrigas das pernas, que muitas vezes fazem com que a criança tenha dificuldade em andar ao fim do dia ou acorde durante a noite. É frequente virem com um diagnóstico de “dores de crescimento” feito por conhecidos da família ou mesmo médicos.

Em 1823, á quase 200 anos, o médico francês Marcel Duchamp, foi o primeiro a notar que um grande número de crianças apresentava dores musculo-esqueléticas sem causa aparente e aplicou o termo “dores de crescimento” para as descrever, acreditando que elas eram causadas pelo rápido crescimento esquelético. 

Ao contrário do que se possa pensar, as “dores de crescimento” não se devem ao crescimento da criança. É consensual que o processo de crescimento é indolor por si só, senão todas as crianças deveriam sentir dor. Ainda não são conhecidas ao certo as suas causas, mas provavelmente a dor e desconforto são causados pelos esforços e hiperatividade destas crianças, o que origina fadiga muscular após um longo dia de atividades, causando dores musculo-esqueléticas.

Apesar do termo “dores de crescimento” ser universalmente aceite por deixar implícito o seu caráter benigno e de curta duração, hoje é empregue na literatura médica a denominação alternativa “dor noturna benigna da infância” ou “dor recorrente dos membros inferiores”.

Esta dor musculo-tendinosa ou osteo-perióssea manifesta-se entre os três e os cinco anos e mais tarde, entre os oito e os 12 anos, com mais frequência ao fim do dia ou noite, sem causa aparente e o diagnóstico é feito por exclusão de outras possíveis causas de maior gravidade. A sua prevalência varia consoante os estudos, entre 4 e 37%.

Não estão associadas a problemas de saúde, mas incomodam as crianças e, claro os pais. Inclusive, como de manhã já tudo passou, os pais ou médico podem achar que a criança estava a fingir.

A dor do crescimento é benigna, inofensiva, não causa nenhum problema à criança além do incômodo da própria dor e tende a desaparecer sozinha em alguns minutos ou horas. A principal preocupação deve ser o diagnóstico correto, feito por exclusão de partes.

O exame físico, os exames laboratoriais e de imagem não apresentam alterações. A dor tem habitualmente uma duração de 10 a 15 minutos e diminui de forma espontânea nas horas seguintes. Sintomas gerais como febre, perda de peso, inchaço ou vermelhidão local, cansaço e claudicação não fazem parte do quadro clínico, devendo-se investigar outras doenças.

Existem múltiplas patologias mais graves que num exame menos correto podem ser diagnosticados como “dores de crescimento”. Estão entre outros as infeções osteo-articulares, a artrite juvenil, a leucemia, os tumores musculo-esqueléticos, a fibromialgia, a síndrome de hipermobilidade articular, a drepanocitose, o raquitismo, a doença de Legg-Calvé-Perthes, etc.

Assim, os pais devem procurar um especialista em ortopedia infantil nos casos em que a dor não passa e persista por mais de um dia, o movimento do membro faz com que a dor agrave ou surjam os sintomas referidos que não fazem parte do seu quadro clínico.

Diagnosticado corretamente um quadro de “dor noturna benigna da infância”, os pais são aconselhados a aplicar uma toalha morna húmida ou tomar um banho de imersão quente antes de deitar, massajar suavemente o local e mobilizar as articulações. Se a dor for intensa não deixando a criança dormir, poderá ser necessário dar um analgésico do tipo ibuprofeno ou paracetamol, segundo prescrição médica.

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