Rosa Valente de Matos Presidente do Conselho de Administração do CHULC

O retorno à normalidade e o “Novo Normal”

05/03/2020

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O retorno à normalidade e o “Novo Normal”

03/05/2020 | Opinião | 0 comments

Com o fim do estado de emergência e decorridos 60 dias após o primeiro caso de COVID-19 em Portugal, entramos agora numa nova fase.
A pandemia COVID-19 acordou Portugal e o Mundo para uma realidade nunca antes vivida, tomada até aqui por muitos como impossível num contexto de progresso e evolução social e tecnológica. Esta pandemia veio mudar paradigmas, alterar comportamentos e, sem dúvida, vai deixar sequelas graves, muitas delas com impactos ainda difíceis de calcular.
A evolução prevista da pandemia COVID-19, ocorrida em vários países e essencialmente em países europeus mais próximos – Itália, França e Espanha – conduziu a um processo reorganizativo onde a confiança nas autoridades politicas e técnicas foi fundamental para a contenção da doença. Em Portugal, podemos afirmar que a sociedade se uniu em torno de uma causa única, fomos solidários e compreensivos, fechámos as portas das nossas casas e das nossas vidas sociais, respeitámos o distanciamento e cumprimos as normas.
Neste processo, as entidades de saúde, os hospitais e em concreto o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (CHULC), com hospitais de referência para a COVID-19, redefiniram o modelo de prestação de cuidados de saúde, assumindo um conjunto de medidas ao longo deste período, tendo como prioridade a proteção e segurança de todos os profissionais e doentes, bem como a manutenção dos elevados níveis de qualidade de tratamento em todas as situações. Como exemplo destas medidas no CHLUC, realço a definição de planos de crescimento e de contingência para a especialidade de Medicina Intensiva, a manutenção do Hospital Santa Marta como hospital sem casos COVID-19 para tratamento de outros doentes em total segurança, a promoção de modelos de teleconsulta, sempre que aplicável, e o uso obrigatório de equipamentos de proteção individual em todos os hospitais.
Esta nova fase, de regresso progressivo à normalidade, coloca novos desafios que nos obrigam a um exercício complexo e incerto de definição do “novo normal”, enquanto mantemos a luta constante contra a pandemia.
O regresso, como manda o bom senso, deve e vai ser lento, teremos, com alguma probabilidade, alguns avanços e recuos. Por vezes, penso que este momento poder ser comparado à oportunidade de voltar a nascer, mas com conhecimento profundo da vida anterior, ou seja, sabemos o que fizemos até agora para controlar a pandemia, temos agora mais certezas sobre o que teremos de mudar ou fazer ainda melhor caso exista uma nova aceleração do número de casos.
Neste momento de retoma progressiva das atividades que foram suspensas ou reduzidas durante o período em que vigorou o estado de emergência, a missão dos hospitais é assegurar a manutenção da capacidade de resposta aos doentes afetados pela COVID-19 e a segurança dos profissionais de saúde e de doentes com outras patologias. Em simultâneo, torna-se igualmente importante nesta fase, tomar medidas concretas para que todos os cidadãos voltem a confiar nos serviços de saúde, uma vez que, com o inicio da pandemia, assistimos a uma quebra acentuada da procura dos hospitais por insegurança dos utentes e perda de confiança, confiança essa que queremos agora recuperar gradualmente.
Assim, para garantir o cumprimento da missão acima descrita, definimos um conjunto concreto de medidas, entre as quais se destacam: o aumento progressivo do número de consultas realizadas, privilegiando a realização de teleconsultas; o aumento gradual dos tempos cirúrgicos; a retoma da realização dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica que estiveram suspensos ou reduzidos; a reorganização dos circuitos para separação de doentes COVID-19 e não COVID-19; e o reforço da articulação com os Cuidados de Saúde Primários na referenciação e atendimento de doentes.
Este período de retoma representa também uma oportunidade de reorganizar os serviços, dando mais autonomia e responsabilidade aos profissionais de saúde, através dos Centros de Responsabilidade Integrados. Esta reorganização permitirá aumentar a produtividade dos serviços, tornando-os mais flexíveis, adaptados e eficientes, promovendo o trabalho em equipa e a orientação clara aos objetivos definidos. Assim, e com o atingimento dos objetivos, será também possível repensar os modelos de remuneração e aumentar a satisfação dos nossos profissionais.
Numa vertente mais pessoal, acredito que o que vivemos até aqui tem sido a prova que definir uma estratégia clara desde o inicio, comunicar de forma eficaz essa estratégia a todos os responsáveis pela implementação da mesma e atuar de forma coordenada entre setores, entidades e indivíduos é a chave para o sucesso da gestão em momentos de crise. Isto não significa que, ao longo do percurso percorrido e no futuro que nos espera, não tenham sido e venham a ser cometidos erros, mas a forma ágil como estes foram, até agora, ultrapassados em conjunto, mantendo a cooperação entre equipas, é um exemplo daquilo que devemos manter no novo modelo de gestão pós-crise COVID-19.
Enquanto administradora hospitalar e atual Presidente do Conselho de Administração do CHULC, posso afirmar que este foi, é, e será, sem dúvida, um dos maiores desafios da minha carreira profissional. Desde o primeiro dia, tenho um enorme orgulho no trabalho que conseguimos realizar e na forma como nos conseguimos reinventar com enorme rapidez, garantindo sempre a qualidade dos nossos serviços. Acredito que o mundo nunca mais será igual, estaremos perante um “novo normal” e como tal, também nós, gestores e administradores da saúde teremos de nos adaptar a esta nova realidade e transformar a forma como nos organizamos para assegurar a excelência dos nossos serviços mesmo nas condições mais adversas.

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