A iniciativa é promovida por aquela autarquia do distrito de Aveiro, e já conta com cerca de 70 participantes inscritos no ‘webinar’, entre pais, professores, profissionais de saúde e outros técnicos com atividade na área.
“Os dois confinamentos provocados pela covid-19 foram difíceis para toda a gente, mas para este grupo concreto acarretaram desafios adicionais, seja porque o risco de infeção em crianças com deficiência é maior e cria muito mais ansiedade nos cuidadores, seja porque a maioria das estruturas de apoio fecharam ou reduziram a sua oferta, o que sobrecarregou os pais e educadores, deixando-os ainda mais cansados “, explicou à Lusa Mara Alves, a psicóloga municipal que vem trabalhando com a comunidade ligada à deficiência.
Para agravar a situação, “esses cuidadores também deixaram de ter folgas, ficando sobrecarregados, saturados, sem tempo para descansar”.
Mara Alves reconhece que, no segundo confinamento, as escolas “começaram a dar algum apoio” a essas famílias depois de “olearem melhor o que não correu bem no primeiro” e aponta também respostas sociais que a Câmara da Feira desenvolveu para ajudar os referidos cuidadores, como a criação de uma linha de apoio psicológico para a comunidade educativa e de uma plataforma para esclarecimento de dúvidas sobre as ferramentas atuais de ensino à distância.
À sociedade falta, contudo, “despertar para a realidade destas famílias”, sobretudo para que os cuidadores possam sentir à-vontade suficiente para solicitar auxílio quando necessário.
“Grosso modo, o povo português não tem a cultura de pedir ajuda e ainda há muito estigma quanto a falar-se das dificuldades que estas pessoas enfrentam. É por isso que os cuidadores se sentem desconfortáveis em abordar os seus problemas, em assumir que precisam de ajuda, em admitir que precisam de descansar”, nota Mara Alves.
Esse não é o caso de Elvira Baptista, que, sendo mãe de duas gémeas de 13 anos, uma das quais com uma paralisia cerebral que lhe afeta a mobilidade, está habituada a expor as suas dificuldades de forma mais aberta, enquanto presidente da Federação de Associações de Pais do Concelho de Santa Maria da Feira.
“Sempre fui de falar destas questões, mas sei que há muitas pessoas que não conseguem porque são mais reservadas e não querem expor-se. Envolvi-me na Federação já por causa disso: para trazer estes temas à discussão e despertar a comunidade educativa para uma realidade que ainda se conhece mal”, revela.
Elvira Baptista assume que “o primeiro confinamento foi mais esgotante porque fecharam a fisioterapia, as piscinas” e outras atividades terapêuticas de que a sua filha Leonor precisava, mas diz que o segundo período de isolamento domiciliário continua a ser muito restritivo para crianças com deficiência.
“À piscina a Leonor já pode ir, mas continua sem massagista, por exemplo, e está tão farta de ficar fechada que, mesmo sabendo que devia usar o andarilho para exercitar os músculos, é um sacrifício pô-la a fazer alguma coisa”, conta a mãe.
Passando a maior parte do tempo em cadeira de rodas, a jovem estudante “está saturada, sente falta dos amigos”, tem momentos de mau humor e fica desmotivada.
A mãe assegura que só consegue equilibrar tudo porque trabalha na empresa do marido e isso lhe proporciona liberdade de horários.
“Posso tratar da Leonor quando é preciso e depois fico a trabalhar até à uma da manhã, para despachar serviço. Se trabalhasse para outra pessoa, era impossível! Já teria deixado o emprego para a minha filha não ficar sozinha e não sei como íamos sobreviver, atendendo à despesa das terapias”, confessa.
O “webinar” de sexta-feira prevê não só a partilha de experiências de cuidadores de crianças com deficiência em idade escolar, mas também de estratégias para lidar com as dificuldades do quotidiano e valorizar conquistas.
Um desses mecanismos, recomenda Mara Alves, é criar uma lista de desafios a superar diariamente.
“A ideia é definir uma série de tarefas pelas quais o cuidador deva ser premiado, atendendo à dificuldade que é realizá-las no contexto específico da sua vida. Pode ser só: Hoje mereço uma taça porque consegui pôr a sopa na mesa a horas. Parece pouco, mas de certeza que conseguir isso exigiu muito dele”, conclui.
Lusa/HN
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