Guiné-Bissau estava “completamente impreparada” para os primeiros casos de Covid-19 e houve muita resistência da população

23 de Março 2021

O coordenador do Centro de Operações de Emergência de Saúde da Guiné-Bissau (COES), Dionísio Cumba, disse esta terça-feira que o país estava "completamente impreparado" quando foram detetados os primeiros casos de Covid-19, em março de 2020.

“O país na altura estava completamente impreparado e houve muitas dificuldades. Mudámos de Governo. Lembro-me quando me ligaram, eram duas da manhã, a dizer que havia um alerta e os casos eram importados e o país não estava preparado”, afirmou à Lusa Dionísio Cumba.

A Guiné-Bissau confirmou oficialmente os dois primeiros casos de Covid-19 a 25 de março de 2020, mas as autoridades sanitárias não conseguirem antecipar as dificuldades que iam enfrentar no terreno, nomeadamente a recusa da população em aceitar que a doença existia e o estigma social, o que ainda hoje é visível.

“Naquela altura muitas pessoas não estavam a colaborar. Era uma situação dos brancos e havia muito estigma. Quando se confirmaram os casos, as pessoas diziam muita coisa. Estávamos sempre sob pressão”, recordou o também diretor clínico do Hospital Nacional Simão Mendes e presidente do Instituto Nacional de Saúde Pública.

Segundo Dionísio Cumba, as pessoas diziam que a Covid-19 não existia, que o país não tinha capacidade para diagnosticar a doença e que os testes não prestavam.

“Foi muito difícil convencer as pessoas. Continua a haver essa dificuldade de mentalizar as pessoas para cumprirem as medidas de prevenção”, sublinhou.

E essa negação, disse o médico, criou “muitos problemas”.

“Antes, até os próprios técnicos tinham medo de enfrentar os pacientes com Covid-19. Eram ameaçados. Ninguém dava oportunidade aos técnicos de fazer o seu trabalho. Lembro-me de uma jovem que o pai ameaçou os técnicos e nem a polícia a conseguiu trazer. Foram ameaçados com feitiçaria”, contou.

Mas, depois os casos começaram a reduzir e só no início deste ano a Guiné-Bissau voltou a registar um aumento de casos e a entrada das novas estirpes do coronavírus SARS-CoV-2, mais virulentas.

“Agora estamos com esta esperança das vacinas. Que possa trazer a esperança de controlar a situação. Este período é mais crítico. Estamos bastante preparados para dar assistência, a capacidade de resposta é muito melhor”, mas ainda há desconfiança, afirmou Dionísio Cumba.

Segundo o médico, essa desconfiança existe porque o sistema não dá às pessoas a certeza que a doença existe, porque as medidas decretadas acabam por nunca ser implementadas.

“E muitos continuam a fazer esta resistência. Estamos a ter vidas ceifadas devido à situação, sobretudo, à nova variante que está a circular”, disse.

Questionado sobre a atual situação no país, Dionísio Cumba explicou que não está a ser testada a realidade.

“Os técnicos estão em greve. A situação piorou entre as pessoas que já têm outras patologias”, afirmou.

“Portanto, estamos a ter esta grande dificuldade em saber se o país está com uma descida ou com uma subida. Só com o fim da greve, com um rastreio mais alto, é que podemos eventualmente ter uma ideia clara da tendência. Os dados que vimos mostram uma ligeira descida de casos, mas não espelham efetivamente o que temos neste momento”, disse.

A Guiné-Bissau registou mais de 3.500 casos de Covid-19 desde o início da pandemia e 55 vítimas mortais.

Na sequência do aumento de casos que se tem registado desde o início do ano, o Governo guineense decidiu prolongar o estado de calamidade por mais 30 dias, até 25 de março.

LUSA/HN

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