A China praticamente extinguiu o novo coronavírus no seu território após as restritas medidas de prevenção adotadas no início de 2020 e que implicaram o confinamento de centenas de milhões de habitantes.
No entanto, numa altura em que vários países se abrem e retomam o tráfego internacional, a China voltou a impor restritas medidas de prevenção, que implicaram o isolamento de uma cidade e outras medidas de confinamento, apesar de grande parte da população ter sido já vacinada contra o vírus.
Esta estratégia de “zero casos” tem, no entanto, um impacto no rendimento e vida de milhões de pessoas, levando os especialistas a alertar que a China vai ter que aprender a controlar o vírus sem fechar repetidamente a economia e a sociedade.
Zhang Wenhong, médico de Xangai que se tornou proeminente durante o combate ao surto na cidade chinesa de Wuhan, no início de 2020, apontou que esta nova vaga sugere que a estratégia da China vai ter que mudar, já que o vírus não vai desaparecer.
“O mundo precisa de aprender a coexistir com o vírus”, escreveu Zhang, que tem três milhões de seguidores na rede social Weibo, o equivalente ao Twitter na China.
O Partido Comunista Chinês realizará o seu vigésimo Congresso no final de 2022. O evento é o mais importante da agenda política chinesa e realiza-se a cada cinco anos, servindo para eleger a nova liderança do único partido de poder na China.
Os líderes desejam ter condições económicas positivas para aquela data.
Em janeiro e fevereiro do ano passado, a China encerrou fábricas e empresas e cortou quase todo o acesso às cidades.
Isto causou a contração económica mais dolorosa em cinco décadas, mas Pequim permitiu a reabertura dos negócios e a retoma das viagens domésticas em março de 2020.
As novas infeções, muitas em pessoas que já foram vacinadas, sacudiram os mercados financeiros globais, com os investidores a temerem que a resposta de Pequim possa interromper a produção e as cadeias de abastecimento.
Xi Chen, da Faculdade de Saúde Pública da universidade norte-americana de Yale, afirmou que a China precisa de mudar a sua estratégia, apostando antes no aumento da vacinação e rápido tratamento de pessoas infetadas, sem afetar a mobilidade e negócios.
O especialista disse ainda que o país precisa ter acesso a toda a gama de vacinas, incluindo a inoculação desenvolvida pela BioNTech, da Alemanha.
“Não acho que a ‘tolerância zero’ possa ser sustentável”, disse Chen. “Mesmo bloqueando todas as regiões da China, as pessoas ainda podem morrer, e mais pessoas podem morrer devido à fome ou à perda de empregos”, notou.
Mas Pequim não deu sinais de abandonar as suas táticas.
O controlo da doença deve ser ainda “mais rápido, mais firme, mais rígido e mais expansivo”, disse He Qinghua, funcionário do Departamento de Controlo de Doenças da Comissão Nacional de Saúde, em conferência de imprensa.
O surto atual começou com a infeção de funcionários do aeroporto que limparam um avião oriundo da Rússia, em 10 de julho, na cidade de Nanjing, na província de Jiangsu, de acordo com as autoridades de saúde.
Alguns viajantes voaram de Nanjing para Zhangjiajie, um ponto turístico popular na província de Hunan, o que transformou a cidade num centro de disseminação do vírus.
A doença alastrou-se para Pequim e outras cidades, situadas em mais de 10 províncias.
Na terça-feira, as autoridades chinesas colocaram a cidade turística de Zhangjiajie sob isolamento, e puniram os funcionários locais, reproduzindo as medidas adotadas em Wuhan no início de 2020.
Os voos para Nanjing e Yangzhou, cidade próxima com 94 casos, foram suspensos. Comboios de 23 cidades para Pequim foram cancelados.
A província de Jiangsu montou postos de controlo nas autoestradas para testar os motoristas. O governo pediu às pessoas em Pequim e na província de Guangdong que não se desloquem para fora.
Ovos e outros alimentos passaram a escassear, depois de os consumidores esvaziarem os supermercados na expectativa de mais medidas de quarentena, segundo os residentes locais.
“O preço dos vegetais subiu. Isto para mim não tem impacto. Mas para as famílias com baixos rendimentos, é muito problemático”, afirmou um residente local, citado pela agência Associated Press.
As 1.142 infeções relatadas desde meados de julho são modestas, em comparação com dezenas de milhares de novas infeções diárias na Índia ou nos Estados Unidos, mas abalaram o país, que tinha praticamente erradicado o vírus.
O surto representa “sérios desafios para a vitória duramente conquistada do país na batalha epidémica”, escreveu em editorial o Global Times, jornal oficial do Partido Comunista.
Até à data, a maioria das pessoas infetadas em Nanjing já tinham sido vacinadas e poucos casos são graves, disse a chefe da unidade de cuidados intensivos do hospital da Universidade do Sudeste, Yang Yi, ao jornal The Paper, de Xangai.
Ela disse que isto significa que as “vacinas protegem” – embora continuem as preocupações de que as vacinas feitas na China oferecem menos proteção do que as inoculações usadas na Europa e Estados Unidos.
A China tem que aprender a “permitir a existência do vírus” em áreas com altas taxas de vacinação e um sistema de saúde mais desenvolvido, disse Chen, o economista.
“Não acho que a [liderança chinesa] tenha posto essa hipótese de parte”, disse Chen. “Eles já devem estar a pensar nisso”, apontou.
LUSA/HN
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