Afegãs regressam ao trabalho sem grandes mudanças sob o jugo talibã

1 de Setembro 2021

Algumas afegãs já regressaram ao trabalho duas semanas depois de o poder no Afeganistão ter sido assumido pelos talibãs, que prometeram ser mais flexíveis em relação às mulheres, do que durante o seu anterior regime.

Nos setores da saúde e da educação, as mulheres contactadas pela agência France-Presse afirmam que até agora viram poucas mudanças em relação à situação no início de agosto, antes da tomada do poder pelos talibãs.

Outras funcionárias aguardam autorização para retomar as suas atividades. Os talibãs comprometeram-se a deixá-las trabalhar de acordo com a sua interpretação da ‘sharia’ (lei islâmica), ou seja, separadas dos homens.

Em Cabul, uma enfermeira de uma clínica apoiada pelo governo francês já regressou ao trabalho. “Algumas colegas minhas não voltaram e algumas tentam abandonar o Afeganistão”, indicou, recusando ser identificada como todas as outras interrogadas para evitar eventuais represálias.

Durante o primeiro regime dos talibãs (1996-2001), a grande maioria das mulheres não podia trabalhar, mas algumas tinham autorização para tal, em particular no setor da saúde. Na sexta-feira, o novo Emirado Islâmico pediu a estas profissionais que regressassem ao trabalho “normalmente”.

“Os médicos homens não podem examinar as mulheres”, disse à AFP uma parteira empregada numa clínica perto de Kandahar (sul).

Esta regra não escrita, que não foi confirmada pelo novo governo, já esteva em vigor durante as duas últimas décadas em grande parte do Afeganistão, um país muito conservador, sobretudo no meio rural.

Em Cabul e nas principais cidades do país, as mulheres estavam habituadas a consultar médicos homens, com exceção de ginecologistas.

Depois de no seu anterior regime ter determinado uma estrita segregação entre os géneros, o movimento fundamentalista tem agora insistido na condescendência.

As mulheres têm “o direto inato” de trabalhar, declarou um quadro talibã, Sher Mohammad Abbas Stanikzai, na sexta-feira em Doha.

“Elas podem trabalhar, estudar, participar na política e fazer negócios”, adiantou.

Inicialmente, os novos dirigentes talibãs pediram às mulheres para ficarem em casa, temporariamente, enquanto alguns combatentes eram formados para as tratarem corretamente.

Agora, além de profissionais de saúde, também professoras regressaram ao trabalho. Os talibãs declararam que as raparigas podem continuar a estudar, mesmo na universidade, mas recusam as aulas mistas. No entanto, a separação de género já era a norma na educação afegã desde 2001.

Durante o primeiro governo dos talibãs, as raparigas não estudavam, com raras exceções podiam fazê-lo em casa graças a acordos locais.

Em Kunduz (norte), uma professora recomeçou a ensinar o dari (variedade do persa falado no Afeganistão) a raparigas de 10 e 11 anos. “Eles mudaram os uniformes dos rapazes, mas não alteraram nada do que ensinamos ou as regras”, explicou à AFP.

Uma professora universitária em Herat (oeste) disse já ter voltado várias vezes à universidade, mas as aulas ainda não recomeçaram.

Alguns acreditam que as aulas não mistas permitirão que as raparigas de famílias conservadoras frequentem a universidade, outros preocupam-se com a falta de professores qualificados.

“Eu dou aulas aos rapazes, por isso não sei se me autorizarão já que sou uma mulher”, declara emocionada uma professora de inglês de um liceu de Cabul.

Mas a maior preocupação destas mulheres qualificadas continua a ser a situação económica. Num país largamente dependente da ajuda estrangeira para os seus serviços públicos uma diminuição dos subsídios internacionais pode ter consequências devastadoras, assinala a AFP.

LUSA/HN

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