“Em termos de quantidade de vida, Portugal compara-se, sem nenhum problema, com países tão avançados como os nórdicos, mas quando vemos a qualidade [de vida] dos últimos oito a 10 anos, é um trambolhão desgraçado. Estamos vivos, mas não temos uma vida como gostaríamos de ter”, observou.
A medicina regenerativa é um dos temas em debate na Conferência Astellas que, na quinta-feira, vai juntar especialistas no Pavilhão Rosa Mota, no Porto, e na qual o psiquiatra Júlio Machado Vaz é ‘chairman’ e moderador.
Numa altura em que a esperança de vida em Portugal aumentou para 81,06 anos, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), o especialista salientou que as inflamações, traumas e dificuldades de cicatrização são problemas que surgem “numa sociedade cada vez mais envelhecida” e para os quais a medicina regenerativa pode ser “uma extraordinária ajuda”, ao fazer com que o corpo “rejuvenesça e seja capaz de aguentar melhor o embate de complicações habituais”.
“A minha geração e gerações depois da minha foram formadas sobretudo para curar, há uma doença, faz-se o diagnóstico, encontra-se o tratamento e a doença desaparece, mas com o envelhecimento da população, nós o que temos cada vez mais é pessoas que têm de ser cuidadas porque aquele reumatismo não vai desaparecer”, salientou.
De acordo com o clínico, há “muita esperança” que esta especialidade possa contribuir para duas questões, nomeadamente, na regeneração de células pancreáticas para a resolução da diabetes, sobretudo, a diabetes tipo 2, mas também ao nível dos transplantes de órgãos.
“Não há órgãos suficientes, há pessoas que morrem em lista de espera, através da medicina regenerativa, um dia esse problema poderá ser resolvido, até a dois níveis, não só a escassez de órgãos, mas também todos os problemas de rejeição imunitária”, afirmou.
Considerando que o conhecimento das potencialidades da medicina regenerativa “ainda não é o desejável”, tanto ao nível da sociedade em geral, como de algumas classes de profissionais de saúde, Júlio Machado Vaz afirmou que “há ainda um longo caminho a percorrer”.
“Este tipo de realizações [conferência] é importante. Vamos ter um modelo misto presencial e ‘online’ o que aumenta muito a capacidade de tocar as pessoas aos mais diversos níveis, mas há um longo caminho a percorrer”, frisou, acrescentando ser preciso “apoio à investigação” e articulação entre a investigação e clínica.
A par da medicina regenerativa, outro dos temas que Júlio Machado Vaz vai destacar no evento é a medicina humanizada, ainda que tal seja “uma contradição”.
“É quase com nostalgia que uma pessoa emprega a expressão medicina humanizada. Mas isto não é redundante? Temos de dizer medicina humanizada? Mas isso significa que há medicina desumanizada?”, questionou, acrescentando que, no século XX, houve por parte de “alguma medicina uma arrogância” e “um discurso em que a medicina defrontava a doença e esquecia-se que a obrigação em termos éticos é cuidar da pessoa”.
“A pessoa não é um mero campo de batalha entre os especialistas e a doença. Não, a pessoa é fundamental. A pessoa é o centro de toda a nossa atividade, em toda a medicina tem de ser assim”, afirmou, defendendo que para que a relação entre médico e paciente seja “eficaz”, os poderes políticos “não podem privilegiar a quantidade de atos terapêuticos em detrimento da qualidade”.
“Não há consultas de oito minutos que quem vai à consulta e o profissional saiam satisfeitos. Isso não é possível e talvez isso acontecer (…) Parafraseando, a guerra é demasiado importante para ser deixada na mão dos generais e a saúde é demasiado importante para ficar só nas mãos dos ministérios da Saúde”, afirmou, acrescentando ser fundamental o papel dos cuidados de saúde primários.
Além de Júlio Machado Vaz, a Conferência Astellas conta com a presença do investigador Lino da Silva Ferreira e do escritor Afonso Reis Cabral. A nível internacional, vão marcar presença no evento, o vice-presidente e diretor médico da Astellas Europa, Alan McDougall e representantes do Astellas Institute Regenerative Medicine, Erin Kimbrel e Robert Lanza.
LUSA/HN
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