Projetos para acesso de estudantes de medicina a dados de saúde sem consenso no parlamento

21 de Outubro 2021

O parlamento debateu esta quinta-feira dois projetos de lei do PS e do BE para assegurar o acesso de estudantes de medicina a dados de saúde, mas as iniciativas não reuniram consenso, com os restantes partidos a manifestarem reservas.

O objetivo dos dois proponentes é alterar o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) de forma a assegurar que os estudantes de medicina (o BE inclui ainda investigadores académicos) têm acesso a sistemas de informação e a plataformas nos quais são registados dados de saúde dos utentes dos serviços de saúde.

“O projeto de lei afigura-se como mais um passo no sentido de melhorar o ensino e a aprendizagem dos estudantes de medicina do nosso país, estudantes esses que serão o futuro dos cuidados de saúde prestados pelo Serviço Nacional de Saúde”, começou por justificar a deputada socialista Sofia Andrade.

Da parte do BE, o deputado Luís Monteiro considerou que o último ano e meio demonstrou a importância do papel dos estudantes de medicina e da investigação científica no combate à pandemia da Covid-19 e essas sinergias, defendeu, devem ser agora valorizadas.

“Não há razão para que os estudantes que estiveram na linha da frente no combate à covid-19, mas também que aqueles que monitorizaram os problemas da covid-19, não tenham hoje acesso a estes dados”, sublinhou o bloquista.

Reconhecendo que o tema é complexo, devido à sensibilidade dos dados em questão, os dois deputados manifestaram abertura para melhorar os diplomas e apelaram ao parlamento que permitisse uma discussão mais alargada em sede de especialidade.

No entanto, não ficou claro ao longo do debate se os diplomas chegarão até lá, já que todos os restantes grupos parlamentares, apesar de se mostrarem sensíveis ao problema, manifestaram reservas quanto a diferentes pontos dos textos.

Miguel Arrobas, do CDS-PP, foi o primeiro a colocar várias ressalvas, afirmando que eventuais alterações legislativas não podem ignorar os pareceres da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e da Ordem dos Advogados, defendendo também que se oiçam outras associações como a Ordem dos Médicos e o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.

O PSD, pela voz da deputada Sara Madruga da Costa, mostrou-se preocupado com a intenção de permitir o acesso a dados clínicos independentemente da vontade dos utentes e considerou que as propostas colocam em confronto dois interesses contraditórios, cuja conciliação não está traduzida nos diplomas.

“Não podemos resolver um problema criando um novo. É esse o risco que corremos e não podemos correr”, afirmou a social-democrata, adiantando que o PSD se irá abster na votação de forma a criar “condições para que o debate não morra aqui”.

Bebiana Cunha, do PAN, admitiu que o debate é importante, mas considerou que a solução encontrada pelo grupo de trabalho que integra a CNPD, as Escolas Médicas, os Reitores e os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde era preferível.

“Essas soluções garantiam o acesso dos estudantes aos dados que necessitavam para a sua formação, mas também preservavam aquela que é a privacidade dos utentes e respeitando o consentimento informado, sem necessidade de mudar a lei”, recordou.

A comunista Paula Santos sublinhou uma outra questão, que já tinha sido apontada também por outros grupos parlamentes, relacionada com a equiparação prevista entre a prestação de cuidados e tratamentos de saúde ou serviços de diagnóstico pelos estudantes nas instituições em que decorre a sua formação àquela assegurada por médicos.

“A equiparação é complexa, perigosa e deve merecer muita cautela”, alertou a deputada do PCP, acrescentando também que o parecer da CNPD foi muito crítico e levanta preocupações que não podem ser ignoradas.

O líder do Chega, André Ventura, criticou a distinção “intolerável” entre as instituições de ensino públicas e privadas, uma vez que a iniciativa do BE só contempla estudantes de medicina a frequentar cursos de Medicina em hospitais universitários, o que exclui a Faculdade de Medicina da Universidade Católica, e investigadores de instituições de ensino superior públicas.

LUSA/HN

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