Em declarações à Lusa, Miguel Ricou, também professor universitário de Bioética, considerou ainda “inaceitável e inadmissível” não haver diferenciação no processo de eutanásia entre casos de lesão definitiva e de doença terminal.
A Assembleia da República aprovou ontem o decreto que regula as condições em que a morte medicamente assistida não é punível, alterando o Código Penal, depois de o Presidente da República ter vetado por inconstitucionalidade o diploma aprovado a 15 de março, dando por terminado o processo de reapreciação parlamentar do diploma sobre a eutanásia.
“Depois da tomada de decisão tem que ser dada ao doente a possibilidade de ser acompanhado no caminho que tem pela frente. Este acompanhamento não deve ser obrigatório, o doente tem que poder decidir se o quer ter ou não, mas devia vir obrigatoriamente contemplado no diploma aprovado a possibilidade desse acompanhamento”, explicou Miguel Ricou.
Para antigo presidente do Conselho de Bioética da Ordem dos Psicólogos, “o acompanhamento psicológico tem que ser garantido logo após a tomada de decisão e ao longo de todo o processo e não apenas referido em modo de apontamento de rodapé”.
“Estamos a deixar as pessoas sozinhas numa decisão tão difícil como esta”, alertou.
Sobre o papel do psicólogo ao longo do processo de morte medicamente assistida, Miguel Ricou salientou que “não é fazer mudar de ideias, não é fazer voltar atrás na decisão mas ajudar o doente depois da decisão tomada, ajudá-lo a percorrer” os vários passos do percurso.
“Quem toma uma decisão destas não a toma de ânimo leve. Precisa de acompanhamento, de falar e, muitas das vezes, não o consegue fazer com a família ou quem lhe é mais próximo. É aqui que o psicólogo tem um papel fundamental, sempre e só se o doente quiser. Mas a possibilidade de o ter sem o pedir tem que estar prevista logo à cabeça, estipulada”, referiu.
O psicólogo criticou ainda o diploma aprovado por não fazer distinção no processo de morte medicamente assistida entre quem toma a decisão por doença terminal ou incurável e lesão definitiva.
“Não é aceitável, nem admissível, que ambos os contextos sejam tratados da mesma forma. O diploma devia contemplar uma diferenciação entre os dois pressupostos. Um quadro de doença terminal, em que há uma evolução para a morte já reconhecida, em que a pessoa pode perder qualidade de vida, capacidades, é diferente de um quadro de lesão incurável, em que há uma incapacidade de adaptação a uma nova realidade que não tem um fim já definido temporalmente”, apontou.
LUSA/HN
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