Em abril de 2020, cerca de um mês depois de as salas de espetáculos terem encerrado e terem deixado milhares de pessoas sem trabalho, cinco amigos começaram a promover recolhas de alimentos, para ajudarem colegas de profissão de um setor no qual a informalidade das relações laborais é bastante comum.
“Na altura, achámos que seria uma coisa para acontecer durante um curto período de tempo. Mas, efetivamente, isso não aconteceu. Tudo isto foi ganhando proporções à medida que as carências alimentares começaram a surgir cada vez maiores”, recordou Rita Diedra, da União Audiovisual, em declarações à Lusa.
O grupo informal de cinco pessoas, formado em abril de 2020, em Lisboa, é hoje uma associação na qual trabalham, de forma voluntária, mais de 50 pessoas de Norte a Sul do país, “a produzir e a organizar os cabazes alimentares que continuam a ser distribuídos”.
Com o tempo, “existiu um decréscimo [de pessoas ajudadas], até porque já existem atualmente muitas pessoas a trabalhar no mercado”. No entanto, de acordo com Rita Diedra, “cerca de 500 pessoas continuam a ser ajudadas a nível nacional, o que corresponde a cerca de 210/215 famílias”.
“Sendo que o polo de Lisboa continua a ser o que tem mais pedidos. Ainda fazemos em Lisboa cerca de 110 cabazes mensais”, disse.
O ‘pico’ de pessoas ajudadas foi de cerca de 800, “correspondente a cerca de 350 famílias”. “Só no polo de Lisboa estávamos a ajudar cerca de 140 famílias”, recordou Rita Diedra.
O número de pessoas ajudadas, apesar de ter diminuído, “oscila muito”.
“Há pessoas que deixaram de ter necessidade de receber esta ajuda durante determinados períodos, mas depois voltam a necessitar desta ajuda alimentar, o que tem a ver com a forma como o próprio mercado se encontra. Quando há expectativa de abertura de mercado e de voltarem a trabalhar, recusam a ajuda alimentar, porque se conseguem organizar durante alguns meses, mas efetivamente muitos pedidos acabam por voltar a existir”, contou.
Inicialmente, as recolhas de bens alimentares eram feitas todas as semanas, em vários locais, que iam sendo anunciados numa página criada na rede social Facebook.
“Mantemos a recolha, mas atualmente temos pontos de recolha fixos de Norte a Sul do país e também nos Açores”, referiu Rita Diedra, salientando que, “de facto, neste momento, praticamente não existem donativos alimentares, nem de outros bens de primeira necessidade”.
“Atualmente, a forma como conseguimos ter estes bens alimentares é também de todo o trabalho que já desenvolvemos ao longo de todo este tempo e que nos permite ainda podermos fazer esse investimento, e de iniciativas [como concertos, galas, exposições, que promovem recolha de bens ou canalizam parte das verbas para a UA] que vão existindo um pouco por todo o lado, mas sobretudo na zona da Grande Lisboa, e que vão permitindo fazermos esta recolha”, contou.
Segundo Rita Diedra, o “grande decréscimo” em termos de apoios, sentiu-se também nos donativos financeiros.
A União Audiovisual considera importante “desmistificar a ideia de que esta é uma área [Cultura] que já não necessita de qualquer apoio, porque efetivamente os pedidos de ajuda alimentar continuam a existir”.
“Muitas pessoas consideram que a maior parte dos profissionais do setor já está a trabalhar, porque já há espetáculos a serem realizados, digressões, o mercado abriu. Mas, efetivamente, ainda não abriu totalmente, e há pessoas que continuam a não ter possibilidade de ter um sustento financeiro trabalhando nesta área”, alertou Rita Diedra, lembrando que, nos últimos dois anos, “houve muitos que acabaram por mudar de profissão, optando por outras áreas mais estáveis e que permitiam alguma segurança financeira”.
Com a chegada do verão e o regresso em pleno dos festivais de música, Rita Diedra acredita que “possa haver um decréscimo” de beneficiários da ajuda da UA. “Mas existem outras áreas que são muito difíceis, como a do circo. Continuam a não abrir e a ter, na mesma, dificuldades em poder continuar o seu trabalho”, alertou.
Há várias formas de poder ajudar a União Audiovisual. “Através do Facebook ou do Instagram dá para fazer donativos diretos. No nosso ‘site’ [https://uniaoaudiovisual.pt/] estão todas as formas em que é possível fazer donativos, quer através da entrega de bens alimentares nos sítios de recolha, quer donativos financeiros”, elencou Rita Diedra.
Além disso, vão sendo partilhadas nas contas da UA nas redes sociais “as iniciativas pontuais, que vão existindo em todo o país, em que há possibilidade de contribuir”.
A UA vai continuar a existir “enquanto houver pedidos” de ajuda, mas os voluntários desta associação estão a tentar que esta “não seja apenas para entregar cabazes”.
“Temos o objetivo de ajudar estes profissionais. Temos uma assistente social que trabalha connosco e nos ajuda a encontrar situações alternativas para alguns agregados. Somos um bocadinho psicólogos, terapeutas, consultores. Vamos manter esta associação numa perspetiva muito solidária, queremos dar continuidade ao trabalho tendo por base espírito de entreajuda, que não é só através de bens alimentares”, disse.
Para que tudo isso aconteça, a UA precisa “que continuem a existir donativos”.
LUSA/HN
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