Brenda Moura: “Apesar dos avanços a mortalidade por Insuficiência Cardíaca continua elevada”

6 de Maio 2022

A prevalência da doença é uma das principais preocupações dos especialistas. O panorama da Insuficiência Cardíaca (IC) é pouco animador, estimando-se que haja cerca de 400 mil portugueses com a doença e uma tendência para vir a aumentar. De acordo com a médica cardiologista do Hospital das Forças Armadas do Porto, a IC é muitas vezes detetada “em contexto de urgência”, provocando “um número de hospitalizações muito elevado”. A propósito do Dia Europeu da Insuficiência Cardíaca, que hoje se assinala, Brenda Moura lembra que os principais fatores de risco “são muito visíveis e fáceis de identificar na grande maioria das pessoas”.

HealthNews (HN)- A Insuficiência Cardíaca é normalmente detetada em situação de urgência hospitalar. Como explica esta realidade? 

Brenda Moura (BM)- Os doentes podem ter algumas alterações cardíacas que não desencadeiam sintomas no dia-a-dia, mas de repente uma situação aguda (uma infeção, arritmia…) pode descompensar condição clínica e desencadear o aparecimento de sintomas. É por isso que, em muitos casos, a Insuficiência Cardíaca é detetada em contexto de urgência.

HN- Em Portugal como é viver com esta doença?

BM- A IC é muito prevalente em todo o mundo e Portugal não é exceção. É uma condição que provoca um número de hospitalizações muito elevado e, apesar dos avanços da medicina, a mortalidade continua a ser elevada.

Em relação aos tratamentos que temos disponíveis em Portugal, felizmente temos acesso aos melhores medicamentos que existem, sendo que nos últimos anos tem havido muita inovação terapêutica. Tem sido possível oferecer aos doentes melhores tratamentos e dispositivos.

HN- Um novo teste, disponível unicamente em alguns estabelecimentos de saúde nos Estados Unidos, consegue prever o risco de enfarte do miocárdio e de insuficiência cardíaca em quatro anos. Qual o impacto que pode ter a introdução deste tipo de tecnologias inovadoras na vida dos doentes?

BM- Ao longo dos últimos anos têm sido disponibilizados biomarcadores que permitem prever o risco de IC. No entanto, é importante frisar que os grandes marcadores de risco são muito visíveis e fáceis de identificar na grande maioria das pessoas. Os principais fatores de risco são: os níveis de colesterol, hábitos tabágicos, ter ou diabetes ou hipertensão… Uma pessoa com estes fatores de risco vai ter uma maior probabilidade de vir a ter IC ou enfarte.

HN- Estima-se que o número de pessoas com IC venha a aumentar entre 50 a 70% até 2030. Quais as medidas que devem ser implementadas na prática clínica para mudar este cenário?

BM- É extraordinariamente importante ter medidas epidemiológicas de educação, no sentido de as pessoas perceberem que há muitos fatores de risco cujo controle está nas mãos de cada um e que são passíveis de modificar. Por exemplo, o exercício físico é essencial e é sabido que o sedentarismo está associado ao aparecimento de IC na mulher, sobretudo a partir da menopausa. Por este motivo, as campanhas que sensibilizam a população para a necessidade de manter uma vida ativa, de manter um peso e uma alimentação saudáveis e de ter a hipertensão controlada são fundamentais.

Um dos problemas da IC é que os sintomas são muito inespecíficos (cansaço fácil, falta de ar com esforços…), mas não devem ser desvalorizados. É importante que os doentes falem com o seu médico de família, de maneira a poderem ser avaliados. É importante chegar a um diagnostico correto com brevidade, de forma a atuar na IC se esta for diagnosticada.

HN- Um estudo apresentado no congresso do American College of Cardiology (ACC 2022) revelou que um alerta com as medicações que deveriam estar em uso aumenta a adesão dos profissionais às diretrizes da IC e a adesão dos doentes à terapêutica. Como olha para estes resultados?

BM- É uma mensagem muito importante- a necessidade clara de dar a medicação correta aos doentes com IC. Como neste campo tem havido muita evolução, e a forma de tratar tem mudado nos últimos tempos (com pelo menos 4 grupos de fármacos a dever ser dados a estes doentes), uma mensagem deste tipo é um lembrete que pode de facto ter impacto.

HN- Um outro estudo demonstra que vacinação para influenza traz benefícios para os doentes com maior risco de eventos cardiovasculares. Considera que o grupo contemplado no plano nacional de vacinação contra a gripe deveria ser alargado perante estes resultados?

BM- As infeções agravam o prognóstico das situações cardíacas. Portanto, nós advogamos que todos os doentes com IC devem fazer a vacina da gripe e da pneumonia. Há muitos dados que corroboram que as infeções têm forte impacto e que as vacinas são muito importantes nestes doentes. De facto, no ano passado foi publicado um artigo onde foi revelado que os doentes hospitalizados, em departamentos de cardiologia, que foram vacinados contra a gripe, independentemente da altura do ano, tiveram melhor prognóstico do que aqueles que não tinham sido imunizados.

HN- Que mensagem deixa para o Dia Europeu da IC?

BM- Vou deixar a mesma mensagem que já deixo há alguns anos e que considero que ainda é muito atual: a insuficiência cardíaca é uma condição muito impactante que reduz a qualidade de vida dos doentes, mas que é possível prevenir e tratar.

Entrevista de Vaishaly Camões

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