“A questão de exceder as horas extra de trabalho previstas – as tais 150 -, assim como a eventualidade de [os médicos internos] poderem não estar acompanhados é fundamental”, disse à Lusa o presidente do Colégio da Especialidade de Ginecologia/Obstetrícia da Ordem dos Médicos (OM), João Bernardes, sublinhando que, no limite, pode levar à perda da idoneidade formativa atribuída pela Ordem aos hospitais.
De acordo com João Bernardes, o colégio de Ginecologia/Obstetrícia da OM ainda não recebeu a carta, divulgada na terça-feira, que os médicos internos enviaram à ministra a informar que entregaram minutas de escusas de responsabilidade, para serem usadas sempre que estiverem destacados para trabalho em urgência e as escalas não cumprirem o regulamento.
Sublinhou: “a questão de se exceder as horas extra de trabalho previstas [150/ano] e a eventualidade de poderem não estar acompanhados é fundamental para a ordem e para os colégios”.
O responsável explicou que sempre que os colégios da especialidade fazem visitas para atribuir idoneidade formativa a um serviço verificam se essas condições estão a ser cumpridas, “quer junto dos diretores e dos conselhos de administração, quer junto dos especialistas e também dos internos”.
O cumprimento do regulamento “é um ponto fundamental na garantia da segurança e na formação dos internos” e, quando não é reiteradamente cumprido, a Ordem dos Médicos “terá de atuar porque isso pode por em causa a capacidade formativa dos serviços” para receberem internos, afirmou.
Questionado pela Lusa, João Bernardes disse que até ao momento o colégio da especialidade não recebeu qualquer queixa formal, mas explica que, nas visitas de idoneidade aos serviços que o colégio faz todos os meses (uma a duas) tem verificado “que há sempre pontualmente situações deste tipo”.
“Damos sempre um prazo para resolver esse problema e, se não for resolvido, temos de por em causa a idoneidade do serviço e comunicar essa situação”, acrescentou.
Explicou que todos os anos a OM recebe respostas a inquéritos que faz a todos os serviços que têm formação e que faz revisitas de cinco em cinco anos, ou “sempre que há problemas”.
“Como tem havido muitos problemas nos últimos anos temos feito muitas revisitas”, revelou, acrescentando: “Há serviços em que num espaço de um ano fizemos duas ou três revisitas”.
O responsável insistiu no cumprimento do regulamento e explicou: “exceder as horas extra é uma questão de segurança clínica, para eles [internos] e para os doentes, mas também um problema na formação. Se eles tiverem muitas horas na urgência não têm tempo para fazer formação em ecografia ou em bloco operatório, por exemplo”.
João Bernardes sublinhou que a prioridade é “cativar as pessoas”, não só para que entrem no SNS, mas para que não saiam: “É preciso condições para que eles entrem e não saiam. Temos tido especialistas a não quererem concorrer e ainda agora, no último concurso, houve especialistas que não ocuparam as vagas”.
Lembrou ainda que não se trata apenas de questões remuneratórias.
“Não é só uma questão remuneratória. É preciso que os concursos sejam previsíveis: temos verificado que só no fim do internato é que os internos constituem família (…) e se nessa altura não fazem a mínima ideia onde podem ficar, vão tentar resolver o problema ou no próprio Estado [como tarefeiros] ou no privado”.
“Depois, tem de haver uma previsibilidade da progressão na carreira, abrir vagas, saber quando abrem as vagas para assistentes graduados, para assistentes graduados sénior. Estamos sem assistentes graduados sénior no SNS. E tem de haver um bom ambiente em termos de formação e um bom ambiente de trabalho em termos de instalações e equipamentos”, acrescentou.
“Na pandemia falou-se muito em quem estava da primeira linha e a certa altura essa primeira linha era muito espessa. Mas a linha era muito fina, muito ténue… e a primeira linha era dos internos. Foram eles que vestiram aqueles escafandros, naquela fase de terror, e foram eles que foram para a linha da frente. Antes de entrarem nos hospitais, nos cuidados intensivos e nos outros serviços, os internos estavam na primeira linha, nas tendas”, insistiu.
Questionado sobre a formação destes profissionais, explicou que o curso de medicina (mestrado integrado) tem a duração de seis anos e, no caso da especialidade de ginecologia/obstetrícia, há mais sete anos até se ser considerado especialista (um ano de treino geral, o chamado ano comum, e mais seis de internato). Os internos fazem provas anuais e, no fim, uma prova nacional.
Alem desta formação, explicou João Bernardes, se depois o especialista quiser ter competência nalguma subespecialidade – como, por exemplo, a ecografia obstétrica – terá mais dois ou três anos de formação.
LUSA/HN
0 Comments