Enfermeiros gostariam que o Presidente da República apoiasse problemas laborais

11 de Agosto 2022

O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses considera as declarações do Presidente da República sobre escusa de responsabilidade uma “apreciação jurídica”, defendendo que seria importante que exercesse "a magistratura de influência" a apoiar melhores condições de trabalho no setor da saúde.

Numa entrevista à CNN, que será divulgada na integra hoje à noite, o presidente da República, Marcelo Revelo de Saúde, afirmou que as “escusas de responsabilidade não valem nada juridicamente”, defendendo que é preciso as pessoas olharem para o direito e que “há casos em que a lei permite [invocar escusa de responsabilidade], mas, em regra, não permite”.

“Sob pena de, em diversas atividades públicas (…) sem encontrar maneira de a pessoa poder invocar realidades objetivas, como a falta de dinheiro, a falta de orgânicas, de estruturas, para não cumprir a sua missão. Eu tive que explicar numa ou noutra situação em que apareceram com essa invocação e eu digo “olhe que isso não vale nada juridicamente”. As pessoas estão a assinar isso, não vale nada juridicamente”.

Os pedidos de escusa visam excluir a responsabilidade individual em sede disciplinar por falhas de diagnóstico e/ou terapêutica condicionada por mau funcionamento dos serviços e que afetem o cumprimento da boa prática médica.

Para a dirigente sindical representante dos enfermeiros, Guadalupe Simões, as declarações do Presidente da República são “uma apreciação jurídica da escusa de responsabilidade”.

“Enquanto constitucionalista não poderia ter outro tipo de declarações, mas também o que se espera é que o senhor Presidente da República exerça a sua magistratura de influência no sentido de afirmar as condições que os enfermeiros estão a trabalhar e que essas condições precisam de ser rapidamente alteradas, correndo nós o risco de todos os dias estarmos a perder enfermeiros em todas as instituições do pais”, disse em declarações à Lusa.

Guadalupe Simões sublinhou que quando os enfermeiros invocam escusa de responsabilidade têm como objetivo “alertar o ministério da Saúde, o Governo e os portugueses” para as condições de trabalho.

“Os enfermeiros sabem que, de acordo com o código deontológico, as suas intervenções são autónomas e decidem o que fazer e, por isso, podem ser responsabilizados e são responsáveis pelas decisões que tomam”, sublinhou a ex-presidente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses.

No entanto, Guadalupe Simões salienta que existem duas situações distintas: “No momento em que decidem cuidados dos doentes são responsáveis pelas intervenções que desenvolvem, outra coisa são as faltas de condições de trabalho com que estão confrontados na generalidade das instituições do Serviço Nacional de Saúde e dos alertas sucessivos que tem vindo a fazer”.

Por isso, acrescentou, quando os enfermeiros invocam escusa de responsabilidade estão a chamar a atenção e a alertar “para a necessidade de serem tomadas medidas para a contratação de mais enfermeiros” e para a retenção dos profissionais que já estão no SNS.

A Lusa contactou também a Bastonária da Ordem dos Enfermeiros que se escusou a comentar as declarações do Presidente da República.

Marcelo Rebelo de Sousa adianta que há casos em que pode ser invocado [escusa de responsabilidade], mas sublinha que “é muito importante, em política, quando se tem razão, saber explicar aos portugueses a razão que se tem. Porque, muitas vezes, tem-se razão, mas a não explicação da razão, ou o mau uso da razão, faz perder a razão”.

As declarações do Presidente da República surgem numa altura em que muitos médicos têm apresentado escusas de responsabilidade por considerarem que não estão reunidas as condições necessárias para desempenharem as funções cumprido as regras da boa prática médica, por falta de profissionais.

O último caso foi conhecido na quarta-feira, quando o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) revelou que todos os 14 médicos do serviço de urgência geral do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, no distrito de Lisboa, apresentaram escusas de responsabilidade devido à “escassez permanente de recursos humanos”.

LUSA/HN

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