O que é que há de melhor no setor da saúde em 2022? A tendência habitual é não ver o que aconteceu de bom e ver melhor tudo o que aconteceu de mau! Parece mais importante ver o que está pior! E se víssemos o que aconteceu de bom e que contribua para resolver o que aconteceu de mau?
Tem havido uma certeza em cada ano: a situação está sempre melhor! Melhor?!! Sim está melhor do que no ano seguinte!
O que aconteceu de melhor em 2022?
O Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de agosto parece-me ser esse contributo bom, fundamental e oportuno. Com esperança, pode ajudar a resolver problemas estruturais que nos afetam na organização do SNS e pode permitir encontrar soluções para as limitações da prestação de cuidados de saúde centrados na pessoa. Pode ajudar e pode permitir…!! Quer dizer que temos ainda que fazer os possíveis para que toda uma nova estratégia comece a encontrar rumo e uma nova cultura organizacional se adeque à realidade atual e necessidades reais das comunidades que temos. Será que vamos conseguir encontrar esse novo rumo em 2023 e anos seguintes? Será que ainda vamos a tempo de dar força e um novo impulso ao SNS?
A Lei 95/2019, de 4 de setembro aprovou uma nova Lei de Bases da Saúde e revogou a Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, a Lei de Bases em vigor há quase 30 anos! A nova Lei de Bases “assumiu o propósito de clarificar o papel e a relação entre os vários atores do sistema de saúde, reafirmando a centralidade do SNS, pautado pelos princípios da universalidade, generalidade, tendencial gratuitidade e dotado de estatuto próprio”. Esta nova Lei de Bases determinou também a necessidade de construir um novo Estatuto do SNS.
Com a aprovação deste novo Estatuto do SNS (Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de agosto) foi revogado o Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de janeiro que aprovara o Estatuto do SNS. Desde a publicação do Estatuto do SNS em 1993, decorridos quase 30 anos, muitas foram as transformações ocorridas no SNS, mas muito mais mudou na sociedade em todas as suas dimensões. Da demografia ao digital, da tecnologia à inteligência artificial, da cultura à política nacional e internacional, tudo mudou. Até os médicos são outros na sua maioria!
A nova Lei de Bases da Saúde de 2019 carece de regulamentação e de execução e o novo Estatuto do SNS vem permitir e impulsionar um conjunto de transformações e de inovações. Quero crer que estas transformações permitirão refundar o SNS sem o desvirtuar dos valores humanistas e princípios éticos defendidos por António Arnaut, seu principal criador em 1979.
Uma das grandes novidades do novo Estatuto do SNS é a criação de uma Direção Executiva do SNS (DE-SNS), uma nova estrutura, uma novidade de 2022. O Decreto-Lei n.º 61/2022 de 23 de setembro prevê alterações de fundo na estrutura, na organização e no funcionamento do SNS e aprova a orgânica da DE-SNS.
A DE-SNS é a grande novidade do ano 2022. Admito que é a grande esperança para renovar, incrementar e consolidar o SNS de modo a “coordenar a resposta assistencial das unidades de saúde do SNS, assegurando o seu funcionamento em rede, a melhoria contínua do acesso a cuidados de saúde, a participação dos utentes e o alinhamento da governação clínica e de saúde”. Esta é a nobre missão desta Direção Executiva. Com a reconhecida competência do seu primeiro responsável – o Professor Fernando Araújo – e com a colaboração da equipa que constituiu faz-nos admitir ser ainda possível salvar o SNS. Podemos assim admitir que foi o que de melhor aconteceu em 2022! É apenas uma esperança ainda, mas não temos nada mais a que nos possamos referir com entusiasmo!
Os Cuidados de Saúde Primários (CSP) – os primeiros, os líderes, os mais importantes – têm sido esquecidos pelos responsáveis políticos desde há vários anos. Depois da Reforma dos CSP iniciada em 2005 e desenvolvida durante uns cinco anos, o desinvestimento progressivo foi evidente. Apesar da implementação de unidades de saúde familiar constar na lista de recomendações da TROIKA como ação a desenvolver, o investimento e interesse político foram decaindo ano após ano. Talvez seja agora oportuno pensar de novo nos CSP, investir nos pilares do SNS e desenvolver centros de saúde com unidades funcionais operacionais, desburocratizadas e com autonomia técnica e organizativa.
Refundar o Serviço Nacional de Saúde. Investir de forma realista. Defender e promover a careira médica. Dignificar o ato médico.
Construir sem denegrir, promover sem ofender, criar sem destruir.
Talvez ainda possamos ir a tempo e contrariar a realidade que conhecemos do SNS: está sempre melhor em relação ao próximo ano.
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