Miguel Xavier, que foi um dos oradores do Encontro de Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria, apontou três barreiras à dificuldade para implementar os programas nacionais anteriores.
“A primeira barreira é o apoio político sustentado. As três reformas anteriores de saúde mental que houve em Portugal abortaram todas por motivos políticos. Ou há um apoio sustentado do ponto de vista político ou então é tudo muito difícil”, afirmou o responsável pelo novo Plano Nacional de Saúde Mental.
Segundo o psiquiatra e professor catedrático, a saúde mental “não é um parente pobre, como se diz”. “Nem parente é. Só pobre. Até há bem poucos anos grande parte da psiquiatria estava fora dos hospitais. Agora já é parente pobre, mas temos de deixar de ser pobres”, adiantou.
Miguel Xavier referiu que, “quando disse há uns meses que o ‘budget’ dedicado à saúde mental precisava de, pelo menos, duplicar”, recebeu vários telefonemas.
“Hoje volto a reafirmar que, de uma forma ponderada, a médio prazo, no mínimo temos de duplicar o ‘budget’ dedicado à saúde mental”, reforçou, ao considerar que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) “não é uma bazuca”, mas “uma fisga”.
“Dá para alguns remendos, mas não dá para tudo. Temos 15% da carga da doença mental em Portugal e temos um orçamento de 5%. Enquanto isto não mudar, não muda nada. É por isso que faltam psicólogos nos centros de saúde, faltam equipas comunitárias completas e vários serviços do nosso país ainda não têm unidades de internamento”, acrescentou.
Outra barreira apontada pelo responsável é a necessidade de “encontrar aliados na comunidade”, pessoas que sejam “capazes de fazer a pressão” que os profissionais de saúde não podem fazer.
Miguel Xavier criticou ainda “um sistema de informação que é absolutamente trágico”.
“Quando quero saber alguns indicadores de saúde mental, a maneira mais fácil é perguntar aos jornalistas. Se for tentar encontrar essa informação no Serviço Nacional de Saúde posso demorar uma semana ou duas. Isto não pode acontecer”, lamentou.
Além disso, o coordenador afirmou que existe um “deficit agudo de recursos humanos” na área da saúde mental.
“Não precisamos de muitas máquinas. Precisamos de profissionais para trabalhar e a maioria não médicos. Esta vai ser a nossa tarefa em termos de desafio global para os próximos quatro ou cinco anos”, disse.
Para Miguel Xavier, a reforma da saúde mental em Portugal “deve ser a mais atrasada da Europa e aquela que tem mais retrocessos”. “Estamos na quarta tentativa. Estamos muitíssimos preocupados em garantir que não tenha retrocessos”, sublinhou.
Olhando para os anteriores planos, Miguel Xavier, que assumiu ter sido um dos autores do programa de 2007, criticou que o documento estivesse “quase totalmente centrado na doença mental grave, esquecendo tudo o resto”.
“A segunda crítica que faço é que era um plano que não tinha orçamento. Ninguém faz planos sem orçamento. E isto é um exemplo clássico do que temos de mudar”, alertou.
Considerou ainda que “não se pode colocar coisas debaixo da cama”, aludindo a áreas que “ninguém queria falar”, como as crianças nos centros educativos, a questão da deficiência ou a psicogeriatria.
O coordenador defendeu ainda a descentralização dos poderes, pelo que uma das medidas tomadas foi a criação de núcleos executivos em cada região do país.
LUSA/HN
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