A Escola Nacional de Saúde Pública trouxe a debate duas questões: a importância da vacinação contra a gripe sazonal para mais saúde pública, moderado por Gonçalo Figueiredo Augusto, da ENSP; impacto económico da vacinação antigripal. Depois da intervenção da diretora da Escola, Sónia Dias, que adiantou alguns números e “novos” e “velhos” desafios depois discutidos, Ricardo Mexia introduziu o primeiro tema e Francisco Ramos o segundo.
Ricardo Mexia, médico de Saúde Pública, analisou a gripe sazonal com dados de 2022-23 do ECDC (regresso a níveis pré pandémicos, início mais precoce, pico mais precoce, variabilidade da circulação ao longo da época e por países, predomínio no mundo de Influenza A [H3N2], casos UCI sobretudo relacionados com Influenza A e acima dos 60 anos, cobertos pelas estirpes incluídas na vacina), bem como a efetividade da vacina e a cobertura vacinal em Portugal, destacando a menor cobertura em profissionais de saúde.
O especialista baseou-se em evidências quando afirmou que Portugal é tipicamente descrito como um caso de sucesso, mas Sofia Duque questionou o sucesso do caso português enquanto médica interna. A Medicina Interna “teme muito o início da época gripal”, confessou. Muitos doentes vacinados continuam a adoecer e alguns precisam mesmo de cuidados intensivos, e a Medicina Interna, sem mãos a medir, assiste à sobrelotação dos hospitais, que faz com que a gripe se propague ainda mais. Os doentes continuam a sofrer e a ter deterioração da qualidade de vida, por isso “precisamos de vacinas mais eficazes e, se as há, de as aplicar de uma forma mais generalizada”, defendeu a médica. Tal como o colega de painel, Sofia Duque entende que os profissionais de saúde devem ser vacinados – mas também não é a favor da obrigatoriedade.
“Para nós, médicos de família, esta época gripal também é muito complicada”, afirmou Nuno Jacinto. A aposta na literacia em saúde e o trabalho antecipado (“prepararmos as coisas a tempo”) são para o clínico aspetos-chave. Nuno Jacinto lamenta que em Portugal continuemos a “fazer as coisas em cima do joelho”. A sua equipa, por exemplo, ainda não tem respostas sobre o processo deste ano.
O especialista em Saúde Pública Francisco George deu também o seu contributo, esclarecendo a audiência sobre alguns aspetos do vírus e da vacinação, e a sua história. A gripe, “a zoonose mais importante que temos no nosso planeta”, atrai os especialistas em Saúde Pública há quase 90 anos. “E logo a seguir as primeiras vacinas foram preparadas. (…) É provavelmente a mais fascinante das áreas da Saúde Pública moderna”, referiu. Para o médico, Portugal devia criar um grupo de trabalho permanente para esta questão – exclusivamente dedicado à gripe.
A representante da Direção-Geral da Saúde destacou que este ano há a possibilidade de gratuitidade para a população entre os 60 e os 64 anos. E se Diana Costa também concorda que é preciso sensibilizar os profissionais de saúde, na audiência Jorge Barroso Dias perguntou quantos profissionais de saúde naquele auditório tinham médico do trabalho, e pediu serviços de Saúde Ocupacional para responder a este e outros problemas.
O segundo debate, sobre a relevância económica da vacina, reuniu Julian Perelman (moderador), Francisco Ramos e Ana Rita Goes, da Escola Nacional de Saúde Pública; Baltazar Nunes, do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge; e Jorge Barroso Dias, da Sociedade Portuguesa de Medicina do Trabalho.
Francisco Ramos elogiou o Programa Nacional de Vacinação, “altamente custo-efetivo”, e frisou que, neste momento, “a principal preocupação é não estragar”. Quanto à vacina contra a gripe, é economicamente eficiente, sendo que a maior eficácia da vacina, mesmo com o aumento dos custos, continua a ser eficiente. A passagem da vacina trivalente para a vacina tetravalente é custo-efetiva. A proteção dos serviços essenciais, manter a concorrência entre produtores, a distribuição – que em Portugal “funciona bem” – e a administração de vacinas são também preocupações de Francisco Ramos. “Em relação aos profissionais de saúde, não há nenhuma boa razão para que não haja um movimento concertado e liderado pela Direção-Geral da Saúde, junto de todos os serviços de Saúde Ocupacional dos serviços prestadores de cuidados de saúde, para que esta seja uma prioridade do seu trabalho.”
Jorge Barroso Dias explicou precisamente como é que a Saúde Ocupacional pode ajudar na literacia em saúde, nos mecanismos de reporte e estatísticos, na prevenção (primária, quinquenária e terciária), na comunicação direcionada, e com impacto positivo na produtividade nacional. “Nós fazemos campanhas de promoção da saúde, nós fazemos campanhas de literacia, nós lemos a organização para identificar que tipo de comunicação, que tipo de campanhas é que precisa”, disse.
Baltazar Nunes defendeu uma maior ligação entre a decisão e a evidência e monitorização. Medição da efetividade é importante e pode melhorar em Portugal. O país poderia, por exemplo, utilizar mais ferramentas de simulação. Podemos também maximizar o impacto com medidas de proteção complementares, como a utilização de máscaras ou o combate ao presentismo (trabalhar presencialmente doente).
Ana Rita Goes disse que temos de aceitar questionamentos se queremos viver numa sociedade autónoma, temos de reconhecer que a aceitação “é um espectro” e não tomar por garantido o facto de termos “bons números”. É preciso estar atento a “subgrupos específicos” de hesitação, promover a confiança e perceber que receios e dúvidas também existem em níveis elevados de literacia em saúde, e combater as reações negativas a estas situações. As suas duas sugestões são: formação para abordagens motivacionais e investigação sociocomportamental para perceber o que está em causa e o que funciona melhor no nosso contexto.
HN/RA
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