O médico psiquiatra João Graça foi um dos impulsionadores do projeto que promove a humanização dos cuidados de saúde no internamento, através da música e da arte, contando com a colaboração da violoncelista Sandra Martins e dos desenhadores dos Urban Sketchers Portugal.
Antes de começar mais um concerto, desta vez protagonizado pelo trio “Caixa de Pandora”, João Graça contou à agência Lusa que o projeto teve origem numa experiência com um doente oncológico.
“Não conseguíamos responder com medicação às necessidades de um doente jovem que estava gravemente deprimido” e ocorreu a ideia “fora da caixa” de levar ao hospital um músico que o doente gostasse e a experiência correu bem.
Segundo o psiquiatra, o doente reagiu, expressando “alguma raiva e zanga”, que considerou ter sido “um aspeto positivo no quadro clínico dele, porque não expressava emoções”.
“A partir daí, começámos a perceber que a música de facto tinha aqui um papel” e foi assim que começaram os concertos no Serviço de Oncologia Médica do Instituto Português de Oncologia em 2019, apenas interrompidos durante a pandemia.
Inicialmente eram realizados mensalmente e agora são quinzenais, alegrando os dias de quem está internado, mas também dos familiares e dos profissionais de saúde.
A violoncelista Sandra Martins também esteve na génese do projeto e é quem organiza os concertos, convidando artistas diferentes que tocam ou cantam o seu repertório, aos quais se junta com o seu violoncelo para tocar “três ou quatro temas com eles”.
“É muito bonito assistir à onda de amor por parte dos artistas quando são convidados” e que querem sempre repetir porque “é uma experiência sempre bonita e muito gratificante”, comentou.
Para Sandra Martins, seria muito importante alargar este projeto a mais hospitais, levando música, leveza e esperança aos doentes, muitos deles em internamento prolongados, um desejo partilhado por João Graça.
“Já há uma base científica muito sólida” de que a aliança da saúde e da arte beneficia muito toda a população de doentes”, advogou João Graça.
O “Música em Medicina” é um projeto multidisciplinar, envolvendo a psiquiatria, a oncologia, a enfermagem e o serviço social, que também tem a vertente de estudar o impacto e benefícios da arte nos doentes.
“O que temos percebido é que os doentes valorizam bastante o aspeto da regulação emocional, porque a música calma ajuda a relaxar”, revelou, adiantando que os profissionais de saúde também falam da ideia de relaxar e de tornar o ambiente da enfermaria mais leve.
Por outro lado, sustentou, “nós sentimos que este projeto também é o nosso contributo para melhorar a humanização e aumentar a proximidade entre os profissionais e os pacientes e os familiares”.
Outro dos ingredientes desta intervenção é o desenho, que a investigação fez perceber que é importante para a autoestima de alguns doentes.
Teresa Ruivo já retratou muitos destes concertos e considerou que “o desenho abre portas e facilita relacionamentos”.
“Quando se está a ver alguém desenhar, naturalmente conversa-se, as pessoas têm curiosidade, espreitam e isso é muito bom, porque cria uma dinâmica que também é o objetivo deste projeto, pôr os doentes em contacto com outras pessoas (…) e trazer alguma cor e alguma coisa boa do que se passa lá fora e fazer disto algo mais do que só um hospital”, disse Teresa Ruivo.
Para a diretora do serviço, Fátima Vaz, esta iniciativa demonstra “um esforço muito grande dos profissionais, nomeadamente dos enfermeiros”, que fazem um esforço na sua rotina para proporcionar este momento aos doentes.
A oncologista destacou também a importância do projeto de investigação que está a decorrer para tentar perceber de “uma forma sistemática e o mais objetiva possível” o impacto que a iniciativa tem nos doentes e nas suas famílias e se há algumas coisas que podem ser melhoradas, mas acentuou que têm estado a perceber “uma excelente aceitação” dos doentes que quiseram assistir aos concertos.
São as voluntárias da Liga Portuguesa Contra o Cancro que fazem o levantamento dos doentes que pretendem ver o espetáculo e “a adesão é realmente muito boa”, disse à Lusa Maria da Graça Almeida.
“Ficam realmente muito entusiasmados. É meia hora que o doente efetivamente sai do quarto e se abstrai um bocadinho do ambiente que o rodeia e ouve com muito interesse”, contou a voluntária.
“E quando sai, isto nós notamos, a disposição é na verdade outra e agradecem imenso e dizem: Da próxima vez que passe por aqui, se houver concerto com certeza que não o ou perder”.
LUSA/HN
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