“Iria sobretudo promover um enorme sentido de justiça da nossa parte e, sobretudo, a possibilidade dos centros mais centrais”, nomeadamente os hospitais de São José e Santa Maria que são os únicos que asseguram a urgência noturna de oftalmologia na área metropolitana de Lisboa, serem “mais apelativos” para conseguirem reter especialistas, disse Rita Flores.
Apesar de a urgência ser “muito importante” na parte assistencial, “não é nada apelativa” para os hospitais conseguirem preencher quadros, requisitar pessoas, criar e reter talentos.
“Muitos desses talentos preferem ir para sítios, onde o seu horário, o seu calendário, seja mais simpático”, afirmou a diretora do Serviço de Oftalmologia da Unidade Local de Saúde (ULS) São José, Rita Flores, em entrevista à agência Lusa, a propósito da integração, em janeiro, do Instituto Oftalmológico Dr. Gama Pinto nesta ULS.
Rita Flores criticou o facto de apenas Santa Maria e São José contribuírem para a urgência metropolitana de Lisboa, numa região que integra “muitos outros hospitais com serviços de oftalmologia bem recheados”.
“Há muitos profissionais de quadro da função pública a exercerem funções nesses serviços e se tudo isto fosse distribuído por todos de uma forma harmónica eu acho que não ia promover nenhuma disrupção nas vidas pessoais de cada um”, defendeu.
No seu entender, “é um problema que merecia uma reflexão do poder político” e uma revisão, que tem sido reclamada, “porque gera um enorme sentimento de injustiça” para quem está nestes hospitais.
A agravar a situação está o facto dos médicos a partir dos 55 anos estarem dispensados de fazer urgência e a partir dos 50 deixarem de fazer urgência noturna.
“Os nossos quadros estão envelhecidos e para manter uma urgência aberta cirúrgica e médica 24 horas por dia são necessários muitos profissionais, além de que a rentabilidade dos nossos serviços também fica altamente comprometida, porque temos muita hora alocada ao serviço de urgência, o que também é injusto até em termos de rentabilidade”, salientou.
A passagem do Gama Pinto para a ULS São José também levou a alterações no serviço de urgência noturna, uma vez que os médicos do instituto colaboravam com o Hospital Santa Maria na urgência, no âmbito de um protocolo antigo que incorporava um dia por semana e um fim de semana por mês.
Com a transição dos médicos para a ULS São José, o Hospital Santa Maria perdeu esse apoio e o Hospital São José passou a fazer mais um dia de urgência por semana, passando a funcionar 24 horas todos os dias da semana.
“Agora que somos todos ULS São José tenho que também criar algum sentido de justiça em todos os elementos do meu serviço e as pessoas são escaladas de acordo com o seu horário de serviço. Não posso abrir exceções”, justificou.
Esta situação motivou descontentamento em alguns profissionais do Gama Pinto e quatro mais jovens, dois com horário de paternidade, acabaram por deixar a instituição, revelou, comentando que “são os acertos das equipas e os acertos secundários à realocação de tarefas e de funções que tem a ver com a estrutura de cada serviço”.
“É muito desestruturante para a vida das pessoas, de repente, ter que programar os fins de semana, as suas férias, de acordo com os seus bancos (…). É disruptivo para a vida pessoal de cada um e as gerações mais novas têm uma forma de pensar também muito particular nestes assuntos”, declarou.
Segundo Rita Flores, o quadro de oftalmologistas do Gama Pinto é “mais envelhecido” do que o de Lisboa Central: “Temos pessoas à beira da reforma e, aliás, este ano já se reformaram dois na sua plenitude de direitos e vão se reformar mais dois ou três até ao final do ano”, disse, contando que em janeiro 14 profissionais tinham mais de 60 anos.
Apesar da “fusão plena” dos serviços só acontecer no segundo semestre do ano, com a passagem dos profissionais e dos doentes do Hospital dos Capuchos para o Gama Pinto, alguns doentes do instituto já foram observados nos Capuchos.
“É a única forma que tenho de ajudar a reduzir a lista de espera [cirúrgica] no Gama Pinto é levar alguns doentes, que vão em grupos de centenas, para serem operados nos Capuchos” até estar tudo a funcionar em pleno.
“Se ficarem curados do seu problema oftalmológico, porque era única e exclusivamente catarata, terão alta (…) se tiverem necessidade de vigilância irão voltar seguramente para o Gama Pinto porque é aqui que estamos”, vincou Rita Flores na instituição centenária.
Relativamente à atividade assistencial, disse que o serviço de Oftalmologia do Hospital dos Capuchos faz cerca de 50.000 consultas por ano, um número que não difere muito do Gama Pinto.
LUSA/HN
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