O anestesista Vítor Almeida liderou o Colégio da Competência em Emergência Médica da Ordem dos Médicos (OM) que propôs a criação da especialidade que hoje, uma semana depois da aprovação em Espanha e passados dois anos do chumbo na Assembleia de Representantes da OM em Portugal, está mais perto de se concretizar. Esta segunda-feira, numa reunião em Coimbra, a Ordem aprovou a abertura do processo de criação da especialidade. Para o médico Vítor Almeida, a designação – igual à espanhola e defendida pelo Colégio que liderou – é um dos pontos positivos porque é aquela que melhor espelha os conteúdos desta especialidade, a Medicina de Urgência e Emergência. “Portanto, estamos neste momento no caminho europeu”, disse ao HealthNews Vítor Almeida.
“Segunda questão que eu acho muito positiva: houve um diálogo muito tranquilo liderado pelo nosso bastonário, que conseguiu fazer pontes em momentos que não são fáceis. Concordo plenamente com ele quando diz que a especialidade não vai resolver os problemas da urgência em si em Portugal. A especialidade vai ajudar a resolver os problemas”, acrescentou Vítor Almeida.
Em primeiro lugar, a existência de uma especialidade permite, segundo Vítor Almeida, “criar garantias formativas, supervisionadas pela Ordem dos Médicos, para prestar os melhores cuidados aos nossos doentes”. Por outro lado, “permite-nos também colocar estes profissionais em toda a rede do SNS, o que facilita a fidelização dos médicos neste sistema, e nomeadamente também na área pré-hospitalar”. Simultaneamente, “vai reduzir a pressão sobre especialidades que neste momento já têm dificuldade em recrutar médicos, nomeadamente a Medicina Interna, e vai facilitar aos internistas dedicarem-se àquilo que é a verdadeira tarefa deles, que é ter um papel absolutamente central na gestão do doente dentro dos hospitais”.
Vítor Almeida ressalvou que a Medicina Interna não pode “de forma alguma” sair do Serviço de Urgência: “deve continuar e devem ser encontrados mecanismos que permitam a estes médicos, desde que cumpram os requisitos formativos, poder ter uma dupla titulação que reconheça o valor e o trabalho deles”.
“Neste momento, os passos estão dados para uma discussão pública.” Vítor Almeida relembra que estava no programa do atual governo a especialidade, que também tem o “apoio indiscutível” da oposição. “Existe um vasto consenso nacional sobre esta problemática”, observa Vítor Almeida.
Como país, “estamos todos de parabéns”. “Os médicos do novo Colégio de Emergência Médica, que é aquele que me substituiu, fizeram um excelente trabalho em rever o plano formativo, que deve ser agora discutido de forma ampla dentro da Ordem”, comentou Vítor Almeida.
A Presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina de Urgência e Emergência, que é médica internista, também já reagiu à notícia. Adelina Pereira partilhou com o HealthNews que a sua reação “foi de grande entusiasmo”. “Estamos a tentar defender há imenso tempo a importância da criação da especialidade não só junto do meio científico, mas até junto de todas pessoas”, justificou. Com “alguma cautela” uma vez que o processo acaba de ser aberto, Adelina Pereira vê aqui “um passo muito positivo de todas as partes para que conduza à criação da especialidade”; “uma tentativa de mudança”. “E obviamente que isso me deixa profundamente feliz, porque acho que é uma mais-valia para todos”, reforçou a médica.
“Nós achamos que a especialidade é muito importante, e entendemos isso há muitos anos. Há cerca de 20 anos que um grupo de pessoas tem falado sobre a mais-valia da especialidade, no sentido de vir criar formação e organização numa área de trabalho que até à data carece de uma especialização. (…) o único serviço de ação médica que está consagrado na legislação e que não exige uma especialização é o Serviço de Urgência. Na nossa ótica, o Serviço de Urgência é exatamente aquele onde é fundamental as pessoas terem formação, terem treino (…) porque é um serviço que está aberto 24 horas, que recebe doentes desde os mais simples aos mais complexos, que têm que ser triados, e isso é uma tarefa muito difícil, triar doentes às vezes com as mesmas queixas, reconhecer aqueles que são realmente graves ou aqueles que podem até ser atendidos noutro ponto da rede. Isso requer, obviamente, formação, prática, treino”, explicou Adelina Pereira.
Trata-se de uma formação “muito mais abrangente, até, que os Serviços de Urgência, porque vai até ao pré-hospitalar, e também nas situações de exceção, de catástrofe”, destacou a presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina de Urgência e Emergência.
A internista concorda que a especialidade não chega para resolver o problema das urgências, mas pode facilitar a organização deste serviço, “e nos últimos tempos tem-se falado muito das urgências e da falta de organização, da falta de equipas, das escalas, e isso também é importante, ter equipas formadas que trabalham em conjunto, com lideranças eficazes. Isso minimiza a desorganização nos Serviços de Urgência nas épocas mais difíceis.”
“Eu sou internista, ainda trabalho no Serviço de Urgência, faço turnos, e contacto com imensos colegas, mesmo em congressos, e o que vejo é que cada vez mais os meus colegas que ainda estão no ativo, que fazem urgências, que fazem enfermaria e consulta, veem com bons olhos esta especialidade que vem ajudar na urgência”, disse Adelina Pereira. A Medicina Interna “tem crescido imenso” e, portanto, estamos a falar também de consulta, enfermaria, hospitalização domiciliária, cuidados paliativos, doentes crónicos complexos, entre uma “imensidão de tarefas” para cumprir num horário que atualmente é de 40 horas semanais, mas que os médicos querem que passe para 35, como a restante administração pública. “Imagine quantas horas sobram para todas estas tarefas”, completou Adelina Pereira. É, portanto, “tentar ajudar esta especialidade nas suas diferentes tarefas”.
Este ano, a Sociedade Portuguesa de Medicina de Urgência e Emergência vai realizar o seu primeiro congresso, contando com a participação de outras sociedades, inclusivamente de Espanha.
HN/RA
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