Triagem através do SNS Grávida serve para esconder anos de desinvestimento

11 de Abril 2025

A Associação de Médicos pelo Direito à Saúde (AMPDS) considerou hoje desadequada a triagem de grávidas através do SNS Grávida, salientando que “visa exclusivamente ocultar as consequências de anos de desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde (SNS)”.

“Este tipo de triagem é desadequado para a situação de gravidez, que em qualquer fase do seu percurso se pode transformar em gravidez de alto risco, com necessidade de atendimento atempado antes de se tornar um perigo de vida, e acrescenta sofrimento ético aos profissionais de saúde que fizeram a triagem se as coisas correrem mal”, indica a AMPDS, em comunicado.

Questionando o processo de triagem, a associação precisa que a falta de investimento no SNS limita “hoje, gravemente, a sua capacidade de resposta em áreas fundamentais para a saúde, especialmente na saúde materna”.

“Como pode uma triagem do SNS 24 ou um algoritmo utilizado pela mesma, ou uma consulta nos cuidados primários de saúde garantir que o feto da uma grávida está vivo, se há ou não um descolamento de placenta ou uma gravidez ectópica, ou se a referência a dores de estômago corresponde ou não a uma pré-eclampsia, se não tiverem acesso rápido a análises, ecografia e a um profissional credenciado”, questiona.

Para a associação, a saúde das grávidas e dos fetos “deve ser uma prioridade absoluta e não um peão no jogo cosmético que evita aumentar e fixar o número de profissionais de saúde no SNS e melhorar as suas carreiras, mantendo as urgências obstétricas fechadas, num caminho inexorável para privatização do SNS”.

“A gravidez deve ser encarada como única nas suas características individuais, que dependem de fatores particulares como seja a idade da grávida, as comorbilidades, o passado obstétrico, tendo em conta que as mulheres têm o primeiro filho cada vez mais tarde”, sublinha.

Assim, a associação recorda que o novo modelo de funcionamento das urgências de ginecologia/obstetrícia e blocos de partos “atenta contra os mais elementares princípios científicos e éticos, com potenciais consequências na saúde e segurança da grávida e consequentemente do seu filho não nascido”.

A AMPDS observa ainda que as exceções apresentadas pelo Governo para o recurso à pré-triagem – nomeadamente um traumatismo grave ou dores muito intensas – “revelam um total desconhecimento do que é o risco de uma gravidez”.

“Uma perda de consciência pode significar um AVC (Síndrome de HELLP), convulsões provavelmente será uma eclampsia, são situações muito graves e de uma alta mortalidade, e que poderiam ter sido evitadas se atempadamente tivessem sido diagnosticadas, salvando a vida da mulher e do bebé, caso não se tivesse perdido tempo em triagens telefónicas e idas a consultas”, acrescenta.

Até fevereiro, mais de 94 mil mulheres foram triadas no SNS Grávida, uma derivação da Linha SNS 24 (808 24 24 24) que entrou em funcionamento em 01 junho de 2024, sendo que cerca de 9.300 ficaram em autocuidados e mais de 16 mil foram encaminhadas para os cuidados de saúde primários.

O SNS Grávida – acessível através do mesmo número do SNS 24 (808 24 24 24) – é uma medida do Plano de Emergência e de Transformação da Saúde, que facilita a resposta à procura de urgências de ginecologia/obstetrícia, enquanto área em que se sentem maiores dificuldades no SNS.

Numa primeira fase, o projeto-piloto do SNS Grávida abrangeu os hospitais de Santa Maria, São Francisco Xavier, Amadora-Sintra, Loures e Cascais, bem como as unidades de Vila Franca de Xira, Santarém, Abrantes, Caldas da Rainha e Leiria.

A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, disse na segunda-feira que a Comissão Nacional de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente vai anunciar “em breve” o resultado do projeto-piloto, bem como o alargamento do programa a todo o país.

lusa/HN

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