A Fundação para a Saúde, uma organização de carácter cívico e independente de poderes políticos ou económicos, apresentou um documento intitulado “Contributos para transformar e salvaguardar o SNS”, onde identifica as principais limitações do atual sistema de saúde português e propõe um conjunto abrangente de medidas para a sua transformação.
No documento, a Fundação constata que o SNS enfrenta sérias limitações que precisam de ser ultrapassadas, nomeadamente: insuficiência de equipas de saúde familiar nos centros de saúde, escassez de recursos nos serviços de urgência, problemas na resposta de diversos serviços hospitalares e dificuldades crescentes na retenção de profissionais de saúde.
O trabalho destaca a necessidade de “Pensar Saúde” numa perspetiva positiva de saúde e bem-estar, menos “remediativa”, estabelecendo-a como prioridade a todos os níveis. Mais que apontar o que fazer, a Fundação sublinha a importância de saber como fazer e, efetivamente, fazer acontecer através de “Equipas de missão” lideradas por profissionais reconhecidos, com mandatos explícitos, públicos e de curta duração, com prestação pública e periódica de contas.
O documento estabelece nove desafios e prioridades para o futuro do SNS. O primeiro foca-se na centralidade das pessoas, propondo a gestão integrada dos percursos nos cuidados de saúde e um sistema organizado de participação das comunidades locais. Entre as medidas concretas, sugere-se o estabelecimento de uma provedoria da saúde, a recuperação da Carta de Participação do Cidadão, a aposta em inquéritos de satisfação e o desenvolvimento dos Conselhos da Comunidade, Conselhos Consultivos e Gabinetes do Cidadão.
O segundo eixo prioritário visa valorizar, reter e atrair profissionais, reconhecendo-os como o recurso mais valioso do sistema. Propõe-se a qualificação das carreiras na saúde, com carreiras verticais e horizontais, sistema retributivo misto e concursos de promoção céleres e calendarizados. O documento advoga pela diversidade nas formas de contratação, condições de trabalho adequadas e remunerações justas associadas ao desempenho. Sugere ainda a criação de um “Fórum para as Profissões de Saúde” e um Portal dos Recursos Humanos para uma visão global e funcional das necessidades, bem como o planeamento a médio prazo da formação necessária.
O terceiro desafio prioriza a mudança de foco da “doença” para a prevenção e do “hospital para a comunidade”, fazendo do acesso aos cuidados de saúde uma prioridade. Defende-se a valorização dos centros de saúde com novas competências e maior integração comunitária, a melhoria da acessibilidade à saúde materna, infantil e planeamento familiar, além do desenvolvimento da literacia em saúde para profissionais e cidadãos. Propõe-se ainda o alargamento das competências da enfermagem e outros profissionais, como psicólogos, nutricionistas e fisioterapeutas.
O quarto eixo aborda o desenvolvimento de novos modelos de investimento e financiamento, orientados para mais acesso e melhores resultados. Sugere-se assegurar estabilidade e previsibilidade orçamental plurianual para o SNS, baseada em metas de bem-estar e com financiamento justo e imune a cativações. Propõe-se também um novo estatuto para o INFARMED que permita reorganização e capacidade de utilizar as receitas geradas.
A transformação e qualificação dos modelos de governação constitui o quinto desafio, visando responder aos desafios atuais. O documento propõe o desenvolvimento de competências e equipas de governação clínica e de saúde nas ULS (Unidades Locais de Saúde) e serviços integrados, a implementação de um dispositivo de coordenação em articulação com o Conselho Municipal de Saúde, e autonomia para o SNS através da revisão do modelo de gestão.
O sexto ponto prioriza a flexibilização organizativa de serviços e equipas, adaptando-os às características geodemográficas e necessidades de cada comunidade local. Propõe-se uma carteira de serviços focada nas respostas oferecidas e não nas estruturas, a implementação de redes colaborativas de proximidade, e o desenvolvimento de estratégias nacionais de apoio a soluções locais para os 1.500.000 utentes sem equipa de família.
A melhoria do sistema de informação de saúde é o sétimo desafio, propondo um desenvolvimento coerente com arquitetura integrada e inteligente. Sugere-se a definição e publicação de um modelo de governação dos sistemas de informação, a publicação dos termos de referência do Registo de Saúde Eletrónico e do Plano Individual de Cuidados, além da criação de uma Unidade de Missão para desenvolver a gestão do conhecimento e simplificar processos nas plataformas existentes.
O oitavo ponto centra-se na qualidade dos dirigentes de saúde, estabelecendo critérios para a sua seleção: publicitação do perfil e competências para a função, validação curricular pela CRESAP (Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública), e assinatura e divulgação de uma Carta de Compromisso entre o dirigente e a tutela.
Por fim, o documento advoga por uma colaboração ativa e transparente com o setor social e privado, através de parcerias de interesse mútuo. Propõe-se facilitar o acesso a determinados tipos de cuidados, partilhar experiências inovadoras, favorecer a integração dos cuidados de saúde com os de caráter social, e instituir consultas regulares entre os setores público, social e privado. O documento enfatiza a necessidade de transparência e rigor nos contratos, garantia de regulação, qualidade e segurança dos serviços prestados.
A Fundação para a Saúde, com este documento, procura contribuir para o debate nacional sobre o futuro do SNS, apresentando propostas concretas e estruturadas que visam responder aos desafios atuais do sistema de saúde português, colocando sempre as pessoas no centro das decisões e promovendo a eficiência, qualidade e acessibilidade dos serviços.
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