Pandemia piorou acesso e privacidade de jovens do centro Aparece

12 de Junho 2022

A acessibilidade, privacidade e confidencialidades dos adolescentes que recorrem ao centro Aparece ficaram “bastante prejudicadas” com a dispersão da equipa que, com a pandemia, deixou um espaço onde estas condições estavam garantidas, disse à Lusa a coordenadora.

A equipa do Aparece – Jovem teve de deixar o espaço que ocupava no piso 01 do Centro de Saúde de Sete Rios, em Lisboa, por este local ter sido transformado num covidário em agosto de 2020, passando o atendimento para salas dispersas, o que obriga os jovens a cruzarem-se com os outros utentes.

Toda esta situação causou “um grande prejuízo” para o Aparece porque reduziu o número de jovens que iam por iniciativa própria e aumentaram as consultas programadas, referenciadas por médicos, professores e outros técnicos, o que contraria a ideologia do serviço, disse a coordenadora do serviço, Maria São José Tavares.

Antes, o número era semelhante (cerca de 50%) e neste momento as consultas programadas rondam os 70% e as de iniciativa própria 30%.

“Infelizmente, estes últimos dois anos foram bastante prejudiciais para todos, nomeadamente para este centro de atendimento que se baseava num espaço criado para oferecer uma maior acessibilidade, privacidade e confidencialidade aos adolescentes”, lamentou a médica que está agora numa sala no piso 3.

O centro de referência na área da adolescência, o primeiro “Youth Friendly Service OMS” em Portugal, foi criado em 1999 e desde então tem dado uma resposta global e integrada às necessidades e problemas de milhares de adolescentes, permitindo ganhos importante nos indicadores de saúde nos jovens.

Começou a funcionar no Centro de Saúde da Lapa e em 2013 passou para o de Sete Rios. “Era o espaço que os adolescentes conheciam há muitos anos, onde vinham com uma facilidade enorme, onde tinham uma sala de espera específica e um apoio administrativo a tempo inteiro”, mas, disse a médica, “tudo isso desapareceu”.

Desde que saíram do piso 01, a equipa, constituída por três médicos, uma psicóloga, uma enfermeira e uma administrativa, tem feito “o melhor que consegue”.

“Os nossos indicadores de acessibilidade, de confidencialidade e de privacidade estão a ser mantidos com grande esforço da equipa e claramente com grandes custos para os adolescentes”, salientou.

Apesar dos constrangimentos, o centro continua a ter todos os dias três a quatro primeiras consultas e a atender uma média de 16 jovens, disse, realçando o aumento de 15 para 30% da procura por parte dos rapazes nos últimos “dois, três anos”.

“A procura e a resposta continuam a ser bastante razoáveis, claramente com falhas, claramente com tempos nas salas de espera muito superiores àquilo que é desejável”, salientou.

A médica ressalvou que a situação melhorou desde dezembro do ano passado quando a equipa passou a ter “salas fixas”, mas os jovens continuam a ter de partilhar a sala de espera com todos os utentes.

A agravar a situação está a falta de recursos humanos, o que fez aumentar o tempo de espera para a primeira consulta que devia ser inferior a 72 horas e é agora de 15 dias.

“O esforço que estamos a fazer para continuar é muito grande, mas já não conseguimos. Precisamos de médicos novos que venham reforçar esta equipa (…) para que seja possível continuar a ter a vitalidade que já existiu”, defendeu a médica, apelando ainda para que se mantenha este centro de referência e para que lhe seja dado “com a maior brevidade possível um espaço adequado”.

Desde 2013, que a enfermeira Manuela Santos acolhia os jovens num gabinete, onde a sua privacidade estava garantida. Atualmente, partilha uma sala com uma técnica administrativa o que coloca entraves no atendimento.

  “Muitas vezes vinham para desabafar ou falar disto ou daquilo e não falam porque estão aqui outras pessoas e esse primeiro contacto é fundamental”, disse a enfermeira, desabafando que ainda se mantém no centro “por carolice”.

Para a psicóloga Elsa Mota, esta mudança foi “muito desorganizadora” para a equipa e para os jovens. “Era para ser provisória e nós preparámo-nos para isso e aos adolescentes também foi um pouco essa mensagem que fomos transmitindo”.

Para os jovens, também foi muito desorganizador porque, apesar de situação estar melhor, disse, “os jovens às vezes andam de gabinete em gabinete à nossa procura. Portanto, aquilo que era um acesso fácil e rápido, sem barreiras, já não é bem assim”.

Elsa Mota contou que os adolescentes lhe dizem que têm “imensas saudades do seu cantinho”.

“É um espaço que sentiam que eram deles e para eles. Aliás, é esse o objetivo dos centros de atendimento aos adolescentes”, concluiu.

LUSA/HN

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