CDU/Bernardino Soares, Membro do Comité Central do PCP e Candidato da CDU às Eleições Legislativas

04/23/2025
Bernardino Soares, Membro do Comité Central do PCP e Candidato da CDU às Eleições Legislativas

Guião CDU – Legislativas 2025

1. Modelo de Funcionamento do SNS

Considerando que a saúde é apontada como uma das principais preocupações dos portugueses, qual é a visão do PCP sobre o futuro do Serviço Nacional de Saúde? Especificamente, como preveem a articulação entre os setores público, privado e social no programa eleitoral?

O PCP considera o fortalecimento do SNS como uma medida fundamental para a garantia do direito à saúde das populações. O SNS continua a ser a maior e na maioria dos casos a única garantia de que todos, independentemente da sua condição social ou económica, têm acesso aos cuidados de saúde de que necessitam. Continua a ser também a única garantia de que a promoção da saúde e a prevenção da doença são uma prioridade, designadamente com o investimento nos cuidados de saúde primários.

O SNS precisa de valorização dos profissionais de saúde, do fim do subfinanciamento das suas instituições, de mais investimento em construção, aquisição e renovação de instalações e equipamentos, de uma gestão democrática, participada e com autonomia. Precisa que os seus recursos sejam efectivamente utilizados no desenvolvimento das suas capacidades e não no financiamento dos agentes privados da saúde, como cada vez mais tem vindo a acontecer.

Independentemente da liberdade de funcionamento de sectores privados na saúde, o que não pode acontecer é que a sua viabilidade económica seja em grande parte assegurada pelo financiamento do Estado, ou assente na drástica redução da capacidade dos serviços públicos.

2. Valorização dos Profissionais de Saúde

Um dos grandes desafios do SNS é a fixação e captação de profissionais. Que medidas concretas o PCP propõe para valorizar, motivar e reter os profissionais de saúde no SNS, particularmente em zonas mais carenciadas?

É essencial o aumento significativo das remunerações base de todas as profissões da saúde, bem como a garantia de carreiras verdadeiramente atractivas para os profissionais e com garantia de progressão. Igualmente decisiva é a garantia de condições de trabalho, desde logo horários adequados. Finalmente, a participação dos profissionais na gestão das unidades, a eleição dos seus representantes nas administrações, o fomento do trabalho em equipa, a garantia de formação ao longo da carreira e de acesso a actividades de investigação, são medidas importantes para a valorização dos trabalhadores da saúde.

Só com a melhoria das condições de trabalho, em particular da remuneração base, o SNS se tornará mais atractivo, invertendo quer a saída de profissionais para o sector privado e a emigração, quer a recusa de integrar o SNS por parte de muitos dos profissionais recém-formados.

Nesse aspecto, a retoma de um regime de dedicação exclusiva, de carácter opcional, que propomos com um aumento de 50% da remuneração base e com a bonificação da progressão na carreira, para além de outras medidas de apoio especificas, poderá ter um papel decisivo na retoma da atractividade do SNS. No caso dos médicos, a integração do internato de especialidade como primeiro grau da carreira poderá também ter um papel muito importante para a fixação destes profissionais no SNS. Também em relação às zonas carenciadas estas medidas são essenciais, bem como outras relacionadas com os obstáculos à fixação existentes em cada região. A existência de instalações e equipamentos modernizados e da possibilidade de acesso às práticas profissionais inovadoras e aos modernos meios tecnológicos são também factores muito relevantes.

3. Cuidados de Proximidade e Acesso

Que estratégias específicas o PCP propõe para melhorar o acesso aos cuidados de saúde primários e assegurar que todos os cidadãos tenham acesso a médico de família? Como pretendem reduzir as listas e os tempos de espera para consultas e cirurgias?

O PCP entende que a valorização das carreiras e remunerações atrás descrita é a medida essencial para garantir a fixação de um maior número de médicos, em particular na Medicina Geral e Familiar. Há muito que se podia prever um pico de aposentações de médicos de família por estes anos, fruto da política de numerus clausus nas décadas de oitenta e noventa, e consequentemente a necessidade de suprir esta carência.

Neste momento o problema não se coloca apenas, nem fundamentalmente, nas vagas de acesso ao curso de medicina, mas na cativação de estudantes de medicina para a especialidade de medicina geral e familiar e sobretudo na sua atracção para o SNS. De facto, todos os anos centenas de médicos recém-formados optam por não concorrer às vagas postas a concurso para os cuidados primários de saúde, o que significa que não consideram esta opção atractiva. Esse aspecto tem de ser invertido com melhores condições no SNS.

A entrega ao sector privado de centenas de milhares de utentes ao nível dos cuidados primários de saúde não é uma resposta adequada para este problema e agravará a desumanização dos cuidados, a desvalorização da promoção da saúde e o afastamento de profissionais do SNS.

No que diz respeito às listas de espera para cirurgias e consultas de outras especialidades e sem prejuízo de pontualmente e de forma transitória se recorrer nos casos em que isso seja indispensável, a sectores não públicos, a solução terá de ser o reforço da capacidade do SNS.

4. Dependências e Saúde Pública

A gestão do consumo de substâncias como tabaco, álcool e drogas continua a ser um desafio para a saúde pública. Que medidas preventivas e terapêuticas o seu partido pretende implementar para abordar estas dependências, e como planeiam integrar estas intervenções no sistema de saúde?

O combate ao consumo e abuso de substâncias nocivas e às dependências exige a intervenção em múltiplos factores, designadamente sociais, mas não dispensa uma resposta adequada dos serviços públicos de saúde. Nos últimos anos, a desvalorização dos cuidados primários de saúde e do seu papel na prevenção, bem como dos organismos públicos de combate às dependências, retirando-lhes meios essenciais de intervenção  desbaratando o conhecimento e experiência acumulados, causaram severos prejuízos na abordagem e tratamento destas áreas. É preciso inverter estas políticas reforçando quer os cuidados primários de saúde, quer os organismos de combate às dependências e adicções e apostando fortemente em políticas de prevenção.

5. Saúde Mental

A saúde mental tem ganhado crescente reconhecimento como componente essencial do Bem-estar geral. Quais são as propostas do PCP para fortalecer os serviços de saúde mental no SNS, garantir acessibilidade aos mesmos e reduzir o estigma associado a estas condições?

Mais uma vez, um forte investimento nos serviços públicos e nos seus profissionais é essencial. A saúde mental é uma das mais frágeis áreas do nosso País no que diz respeito à protecção das populações e à resposta dos serviços de saúde. Em boa parte, estes cuidados de saúde estão privatizados, só acedendo a eles quem tem recursos para o fazer.

Continuamos a ter carência na rede de cuidados na comunidade, que não vai ser resolvida com o financiamento do PRR em curso (aliás com atrasos), que não corresponde ao número de equipas comunitárias de saúde mental que são necessárias. Também no plano hospitalar faltam camas e profissionais.

É necessário garantir meios humanos e materiais para a intervenção na área da saúde mental, particularmente na prevenção, sobretudo em meio escolar e laboral.

6. Financiamento e Sustentabilidade

Face aos desafios do envelhecimento populacional e do aumento da prevalência de doenças crónicas, qual é o compromisso financeiro do PCP com o setor da saúde para os próximos quatro anos? Como pretendem garantir a sustentabilidade do sistema mantendo a qualidade e a universalidade do acesso?

É preciso garantir o financiamento público, em montante suficiente e adequado, do Serviço Nacional de Saúde e das suas instituições. É preciso concretizar o investimento público, que tem sido executado sistematicamente em menos de 50% do valor orçamentado, já de si insuficiente. É preciso qualificar hospitais e centros de saúde com equipamentos e instalações adequados, aumentando a sua capacidade de resposta.

A saúde é um direito fundamental. Investir na saúde é poupar na doença. O SNS é o mais barato dos sistemas que garantam a cobertura geral de toda a população, território e necessidades em saúde. A entrega de prestação de serviços a privados custa mais caro ao Estado e exclui situações clínicas mais graves e populações mais carenciadas. Entregar metade do orçamento do SNS ao sector privado não e sustentável.

A longevidade não pode ser entendida como um problema, mas como uma conquista civilizacional. O que é um problema é o baixo número de anos saudáveis vividos, a precocidade da doença e das limitações à qualidade de vida, em que Portugal apresenta indicadores degradados em relação a outros países da Europa. Investir nos cuidados de saúde é essencial para garantir a sustentabilidade do SNS.

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