Franceses “aliviados” e sem medo perante a vacinação em massa

17 de Abril 2021

O maior centro de vacinação de França fica em Seine-Saint-Denis, onde uma grande concentração de pessoas em espaços pequenos levou à rápida disseminação do vírus e onde o esforço de vacinação traz "alívio" aos residentes.

“É um alívio, não tenho medo nenhum. Vou respirar ainda melhor quando tiver a segunda dose”, garantiu à agência Lusa Claudine, reformada de 63 anos e residente no departamento de Seine-Saint-Denis, que se deslocou até ao Stade de France para ser vacinada.

A agência Lusa passou uma manhã no maior centro de vacinação de França, instalado no Stade de France, e as reações dos franceses vacinados – a vacinação está a atualmente aberta a todas as pessoas com mais de 55 anos – são de “alívio” e também de retoma de alguma liberdade após três confinamentos desde março de 2020.

Claudine conseguiu vaga para ser vacinada na véspera, uma facilidade de que não estava à espera, dados os relatos de atrasos de entrega das vacinas por parte dos laboratórios Pfizer e Moderna – a AstraZeneca não é administrada nos centros de vacinação. Mas as surpresas não ficaram por aí.

“Cheguei às 10:20, passei na segurança e fizeram-me os papéis, não houve grande fila de espera. Vacinei-me e tudo se passou rápido, em menos de uma hora”, contou.

O estádio – o maior de França e acostumado a acolher grandes eventos desportivos e musicais – transformou-se desde o início do mês em ‘vaccinodrome’, ou centro de vacinação, e tem acolhido diariamente cerca de 2.600 pessoas para a primeira e segunda doses, tendo atingido 11 mil vacinas na primeira semana de abertura.

A organização desta operação está a cargo da Cruz Vermelha e a vacinação é levada a cabo pelos Bombeiros de Paris. Uma organização nunca vista à escala nacional.

“Estamos muito habituados à gestão de crise, especialmente de cariz excecional, a partir do momento em que há uma catástrofe, como aqui, portanto vamos logo montar os locais para fazer a vacinação em massa. A Cruz vermelha já tem essas competências, mas até agora mais a nível internacional, como por exemplo na crise do ébola”, explicou Philippe Testa, responsável de Saúde e Redução de Riscos na Cruz Vermelha francesa, em declarações aos jornalistas.

Não é por acaso que a maior operação de vacinação em França acontece neste departamento. Localizado nas imediações de Paris, com uma área de cerca de 230 quilómetros quadrados e uma população de aproximadamente 1,654 milhões de pessoas, Seine-Saint-Denis tem constituído durante a pandemia uma das zonas de maior circulação do vírus.

“É um departamento com uma forte densidade de população, um distrito jovem, que também tem uma problemática social e económica, onde o desemprego é forte. Nós, eleitos locais, temos muitas vezes o sentimento que há um certo abandono por parte das autoridades nacionais e já várias vezes solicitámos um olhar diferente para o nosso território”, detalhou Paulo Marques, lusodescendente e vice-presidente da Câmara de Aulnay-sous-Bois, uma das maiores cidades de Seine-Saint-Denis.

Cerca de 50% das vagas no Stade de France são destinadas a pessoas que vivem neste departamento, com as restantes provenientes da região Île-de-France, que engloba Paris e todos os departamentos à volta. O centro de vacinação quer crescer até 40 mil vacinas por semana, mas há uma disparidade com outras regiões de França menos afetadas pela covid-19.

Maryline, 65 anos, vive em Seine-Saint-Denis e foi vacinada antes da mãe, que tem 93 anos, e vive na província.

“Acho que aqui em Seine-Saint-Denis, houve um esforço porque havia muita gente doente, mas no interior do país, onde vive a minha mãe, não é assim. É muito difícil encontrar vacinas”, declarou.

Numa operação que mobiliza mais de 100 pessoas entre seguranças, pessoal administrativo, bombeiros, enfermeiros e médicos, o sentimento é gratificante para quem está no lado da prevenção em vez dos cuidados intensivos com casos graves do vírus.

“É muito gratificante estar aqui. Eu já tinha sido mobilizada na primeira vaga, num lar, claro que voltarmos a ser remobilizados tem um impacto na nossa formação, mas é menos complicado estar aqui, onde as pessoas estão contentes de ser vacinadas do que ver os pacientes em estado grave”, constatou Camille, estudante de enfermagem que vigia os utentes durante 15 minutos após receberem o medicamento e lhes entrega os certificados de vacinação.

Apesar de se ter mostrado em muitas sondagens um dos países mais reticentes em relação à vacinação, devido ao seu critério voluntário e à necessidade de um regresso progressivo à vida normal, a “confiança” acaba por sobressair em quem se desloca ao Stade de France.

“As pessoas estão confiantes e quando lhes perguntamos elas estão contentes e sentem-se mais seguras de ter sido vacinadas”, garantiu Philippe Testa.

Quanto à perceção do departamento de Seine-Saint-Denis a nível nacional, Paulo Marques considera que há agora mais “solidariedade” e compreensão em relação às dificuldades deste subúrbio parisiense.

“Seine-Saint-Denis está a ser visto de forma diferente, porque as pessoas estão a compreender a realidade e temos de ser todos solidários, afinal estamos todos ligados”, concluiu.

LUSA/HN

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