O estudo liderado por investigadores da Universidade McGill, publicado na revista “Social Science & Medicine”, é o primeiro a mostrar como as diferenças globais na mortalidade por Covid-19 se relacionam com a desigualdade de rendimentos. Também inclui inquéritos sobre confiança social e confiança em instituições públicas.
A falta de confiança nas instituições foi associada a mais mortes – consistente com a investigação durante as pandemias da SARS e H1N1. Surpreendentemente, porém, os investigadores descobriram que a confiança social e a pertença a grupos também está associada à mortalidade. Embora a ligação com amigos e familiares seja uma resposta natural em tempos de crise, em alguns países esta confiança e o desejo de socialização podem estar a interferir com os esforços para conter a transmissão através do distanciamento físico.
Além disso, fortes laços de grupo podem, por vezes, reforçar comportamentos de saúde arriscados, de modo que sociedades com elevada confiança podem ser mais suscetíveis à desinformação sobre a severidade da Covid-19, tratamentos falsos, ou atitudes desdenhosas em relação ao distanciamento físico. “As pessoas esperam que haja benefícios para a saúde por confiar nos outros e por pertencer a grupos – e geralmente há. Mas no contexto de uma pandemia, quando é preciso que as pessoas se isolem, a confiança cega nos outros pode atrapalhar”, diz Frank Elgar, autor principal do estudo, professor da Universidade McGill e da “Canada Research Chair in Social Inequality in Child Health”.
Por outro lado, a confiança nas instituições públicas e a participação cívica estão ligadas a menos mortes, possivelmente porque mobilizam as pessoas para usar máscaras, lavar as mãos e praticar o distanciamento físico. Os investigadores observam que estar envolvido na comunidade é particularmente benéfico quando se pede aos grupos que comprometam alguma liberdade pessoal para o bem comum, como o uso de uma máscara em público.
“Os Governos e outras organizações podem capitalizar este envolvimento durante uma pandemia, apoiando formas seguras de as pessoas socializarem e permanecerem envolvidas nas suas comunidades e atividades culturais”.
Os investigadores descobriram também que a desigualdade de rendimentos está associada a mais mortes, mesmo depois de contabilizados outros fatores sociais como a riqueza nacional e a idade da população. “Países com um fosso maior entre ricos e pobres, como os Estados Unidos, a Rússia e o Brasil, estão a sofrer uma pandemia mais mortal”, diz Frank Elgar, que é também membro do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina.
“Em muitos países, os trabalhadores com salários mais baixos estão sobre-representados entre os trabalhadores essenciais do comércio a retalho, dos transportes públicos e dos serviços de saúde, que não podem praticar facilmente o distanciamento físico”, diz Elgar. Uma maior exposição ao vírus e menos acesso aos serviços de saúde entre os pobres poderia explicar porque é que países economicamente mais desiguais – não necessariamente os mais pobres – registam taxas de mortalidade significativamente mais elevadas. Os investigadores observam, contudo, que os países mais ricos também podem ter dados mais exatos ou atrasos mais pequenos no fornecimento das contagens das mortes.
“Esta é uma mensagem séria sobre os novos desafios que provavelmente iremos enfrentar nesta segunda vaga da pandemia, e a nossa capacidade de montar as defesas”, diz Elgar.
NR/HN/Adelaide Oliveira
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