Sindicato vai mentalizar ex-jogadores sobre riscos de doenças neurodegenerativas

31 de Janeiro 2021

O Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol (SJPF) “está pronto” para acionar este ano um plano de consciencialização dos ex-praticantes face ao risco de desenvolvimento de doenças neurodegenerativas em idade avançada.

“O projeto Reminiscências – ‘As memórias do futebol não envelhecem’ visa apoiar ex-futebolistas vítimas de demência ou outras doenças degenerativas, utilizando as recordações dos seus tempos de jogador para estimular e retardar os efeitos devastadores destas patologias”, explicou à Lusa o presidente Joaquim Evangelista.

A iniciativa está a sofrer atrasos devido à pandemia de covid-19, já que “requer muita proximidade e implica contactos com uma população de risco”, embora sinalize uma “questão de cidadania e consciência social” coligada aos diversos agentes do futebol.

“É fundamental debatê-la e pode fazer a diferença no envelhecimento saudável que se pretende que todos os jogadores e jogadoras tenham, para que o futebol, a profissão que tanto amaram, não se revele o pior inimigo da sua própria saúde. É um tema prioritário dentro da área da saúde, à semelhança do que fizemos com a saúde mental”, frisou.

Várias investigações científicas sugerem que a prática de futebol profissional, a envolver incessantes atos de cabecear a bola e choques com outros atletas, pode favorecer o desenvolvimento de doenças neurodegenerativas após a despedida dos relvados.

“Em geral, o foco reside no imediato e nos problemas dos jogadores que estão no ativo, mas vai existindo uma maior preocupação em encontrar mecanismos de apoio e projetos onde se perspetiva o futuro. Apesar de tudo, o futebol começa a garantir respostas no setor da saúde e setor social, na investigação a fazer e nas respostas a criar”, vincou.

O SJPF coopera desde dezembro com a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) na adaptação à realidade nacional das novas recomendações globais sobre a concussão cerebral em treino e jogo, nas quais pretende envolver as equipas médicas dos clubes.

“Estamos articulados para trabalhar o assunto e criar um protocolo que passe a regular procedimentos básicos na defesa da saúde física e mental dos jogadores, ao agir de forma precisa no diagnóstico de concussão e protegê-los dos efeitos nefastos, nomeadamente respeitando o tempo de recuperação”, enumerou o líder sindical.

O mote partiu do Grupo de Peritos em Concussão do International Board (IFAB), no qual estavam Joaquim Evangelista e Pedro Proença, inseridos nas respetivas delegações da Associação Internacional de Futebolistas Profissionais (FIFPro) e das Ligas Europeias.

Os dois organismos comprometeram-se a apertar os atuais protocolos, estimular ações formativas com jogadores, equipas médicas e técnicas e árbitros ou colocar profissionais clínicos independentes nos estádios para identificar e avaliar suspeitas de concussão.

Nessa lógica, o IFAB, regulador das regras do futebol, seguiu os métodos de outras modalidades de contacto e começou a testar este mês a inclusão de uma substituição adicional, caso um atleta manifeste suspeitas de concussão cerebral durante o jogo.

“Existem muitos casos, gravados pelas transmissões televisivas, de jogadores a sofrer esses efeitos ou mesmo a perder os sentidos em campo. Se uns se recusam a serem substituídos, outros são mantidos em jogo por decisão errada da equipa médica. Neste contexto, o mais seguro é proteger o jogador e retirá-lo do terreno de jogo”, defendeu.

Joaquim Evangelista nota “pouco estudo sobre os efeitos do futebol no envelhecimento dos atletas”, numa altura em que alguns ex-praticantes ingleses diagnosticados com demência até avançaram com ações judiciais contra as entidades reguladoras locais.

Ao acusarem-nas de negligência pela omissão das repercussões de golpes na cabeça, procuram indemnizações similares às do futebol americano, que já veio admitir ligações entre a prática desportiva e o desenvolvimento de doenças neurodegenerativas.

“O futebol não tem tido atenção especial às consequências nefastas da atividade nos ex-jogadores, talvez porque estes terminam a carreira em idade ativa muito jovem e os anos que decorrem até ao aparecimento de sintomas de demência ou outras doenças associadas afastam a relação causa-efeito. É um processo cruel a vários níveis”, alertou.

Além de exercer pressão nas principais instâncias, a sucessão de mortes por patologias cerebrais veio multiplicar estudos, estando o SJPF a apoiar uma investigação da Universidade Católica sobre “concussão nos futebolistas e deterioração cognitiva”.

“Mais do que preocupação ou alarme, é preciso identificar o problema e ouvir a ciência para traçar um plano de ação. Os futebolistas devem estar atentos e os ex-jogadores, sobretudo com mais idade, não devem ignorar os sinais de alerta. Neste momento, a ciência e a tecnologia são aliados dos futebolistas”, enfatizou Joaquim Evangelista.

LUSA/HN

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