Em declarações à agência Lusa, o presidente do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SCIF/SEF), Acácio Pereira, afirmou que a questão dos trabalhadores das explorações agrícolas no Alentejo tinha sido levantada num congresso que esta estrutura organizou em 2018.
Acácio Pereira disse que, além do sindicato ter denunciado as situações de exploração, o próprio SEF reportou no Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) a existência de casos de tráfico de seres humanos e crimes conexos ligados à questão dos migrantes em Portugal.
“O Governo tem andado a dormir e mais concretamente o senhor ministro da Administração Interna fazendo de conta que a situação não existe, permitindo que as empresas escravizem os trabalhadores, porque é de escravização que estamos a falar, permitido que esse trabalho entre na economia e que essa miséria humana continue a existir”, criticou o presidente do sindicato.
Acácio Pereira disse que o sindicato que representa os inspetores do SEF “não aceita que o Governo diga que não sabe” porque essa situação foi denunciado e está relatada no RASI.
“A própria segurança social tem registo das entradas das contribuições, as próprias entidades ligadas à constituição de empresas têm noção do número de empregados e de empresas que são criadas e depois extintas. Há todo um conjunto de situações que o Governo não se pode alienar”, sublinhou.
O presidente do sindicato acrescentou que esta situação “só veio à ribalta por questões de saúde e era impossível escondê-la”.
“As empresas têm vivido em completa roda-livre, tirando um lucro desmesurado”, disse, perguntando às pessoas se “quando vão ao supermercado têm consciência de que aquelas embalagens bonitas têm por detrás a miséria humana e o aproveitamento do trabalho escravo”.
Para o presidente do SCIF/SEF, o Governo “não age, reage”.
O sindicato que representa os inspetores deste serviço de segurança considera que Portugal deve “ser um país humanista, acolhedor”, mas também deve dar as condições para “não escravizar as pessoas”.
“O Governo tem permitido essa escravização dos trabalhadores migrantes”, salientou, considerando que se trata de casos de “escravatura da era moderna”, que passa em pôr as pessoas a trabalhar, dando-lhe um pagamento baixo, tendo em conta que são pagos a preços dos países de origem, e vivem em condições sub-humanas ao dividirem “10, 20, 30, 40 a mesma casa”.
Segundo o sindicato, este problema passa-se um pouco por todo o país, sendo mais visível nesta altura do ano em Odemira, mas acontece também durante a apanha da cereja, na beira interior, na época das vindimas, no Douro, e das castanhas, em Trás-os-Montes.
Duas freguesias do concelho de Odemira (São Teotónio e Longueira/ Almograve) estão em cerca sanitária por causa da elevada incidência de Covid-19 entre os imigrantes que trabalham na agricultura e que vivem em condições precárias.
Na segunda-feira, fonte da Procuradoria-Geral da República avançou à Lusa que Ministério Público de Odemira tem em curso onze inquéritos sobre auxílio à imigração ilegal para efeitos de exploração laboral.
Também o SEF revelou à Lusa que tem a decorrer 32 inquéritos em diversas comarcas do Alentejo, seis dos quais em Odemira, pelos crimes de tráfico de pessoas, auxílio à imigração ilegal e angariação de mão-de-obra ilegal.
Numa informação enviada à agência Lusa, o SEF sublinha que tem vindo “a acompanhar de perto a permanência e a atividade de estrangeiros no Alentejo, em especial os que trabalham nas explorações agrícolas intensivas”.
O RASI de 2020 refere que “a exploração laboral continuou a ser um fenómeno presente em Portugal” e que trabalhadores, maioritariamente da Roménia, Moldávia, Paquistão, Nepal e Índia, foram recrutados para o trabalho em campanhas sazonais, como a apanha da azeitona, castanha, frutos ou produtos hortícolas, sendo transportados para as explorações onde passam a trabalhar e residir”.
“A extensão geográfica dos locais onde são colocados a trabalhar, geralmente situados no interior do Alentejo ou na zona oeste do país, dificultam a atuação das entidades de fiscalização”, sustenta o RASI do ano passado.
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