Arménia celebra domingo legislativas antecipadas num país crispado

19 de Junho 2021

A Arménia elege no domingo o seu parlamento em legislativas antecipadas convocadas pelo primeiro-ministro, Nikol Pashinyan, que tenta preservar o poder apesar da crise desencadeada pela recente derrota militar face ao Azerbaijão em torno do enclave do Nagorno-Karabakh.

Após alcançar a liderança do país através de uma revolução pacífica em 2018, com a promessa de afastar as elites corruptas do Governo desta ex-república soviética do Cáucaso, a popularidade de Pashinyan, 46 anos e antigo jornalista, foi questionada pelo conflito no Nagorno-Karabakh no outono de 2020, com um desfecho particularmente amargo para os arménios.

Um cessar-fogo com mediação de Moscovo pôs termo a seis semanas de combates que provocaram cerca de 6.000 mortos e Erevan foi forçada a ceder territórios que mantinha há mais de 30 anos, uma decisão que implicou importantes manifestações da oposição e apelos à demissão de Pashinyan.

Esta derrota, recebida na Arménia com uma humilhação nacional, desencadeou uma crise política, incluindo um conflito entre o primeiro-ministro e uma parte da hierarquia militar, que apelou à demissão do chefe de Governo.

Após ter resistido, e assumido pessoalmente a liderança de contramanifestações de rua para denunciar uma “tentativa de golpe de Estado”, Pashinyan acedeu finalmente à convocação de legislativas antecipadas com o objetivo de tentar diminuir a tensão interna e renovar o mandato.

No entanto, a sua vitória eleitoral está longe de adquirida, com uma campanha caracterizada por uma extrema polarização da sociedade e das lideranças políticas e quando, no rescaldo do conflito, muitos dos seus antigos apoiantes se juntaram aos seus rivais, maioritariamente provenientes das elites afastadas do poder em 2018.

No pequeno país do Cáucaso do Sul – a primeira nação do mundo a adotar o cristianismo como religião de Estado, no século IV – a figura de Pashinyan continua a dividir a população, mas ainda conserva um importante grau de popularidade por ter reformado o país e enfrentado os poderosos e riquíssimos oligarcas e as elites corruptas.

No entanto, os seus sucessos económicos ficaram comprometidos com o rescaldo da guerra com o Azerbaijão muçulmano – um aliado muito próximo da Turquia que forneceu apoio militar a Baku no recente conflito –, e a crise desencadeada pela pandemia.

Pelo seu empenho no combate às “elites corruptas”, o chefe de Governo exortou na quinta-feira os seus apoiantes durante num grande comício em Erevan, a capital, para se dirigirem às urnas e realizar uma “revolução de aço”.

“Aviso todos aqueles que exercerem pressões sobre as pessoas: após as eleições, vamos procurar-vos”, assinalou. Mais tarde, e perante a televisão, acusou as “forças que provocam confrontos políticos, uma guerra civil”.

O seu principal rival e ex-Presidente Robert Kocharian, que dirigiu o país entre 1998 e 2009, tem acusado sistematicamente as autoridades de incompetência após o regresso do conflito armado com o arqui-inimigo e vizinho Azerbaijão, repetindo que “a Arménia está sem líder”.

Numa mensagem vídeo emitida na sexta-feira, Kocharian apelou aos seus compatriotas para “não se deixarem enganar de novo”.

“A escolha é entre uma paz digna ou uma humilhante vergonha (…). Cuidemos as nossas feridas!”, disse Kocharian, que reuniu os seus apoiantes sexta-feira na praça central de Erevan.

Apesar de ter obtido mais de 70% de votos nas legislativas de há três anos, a única sondagem disponível fornecia ao partido Contrato Civil de Pashinyan apenas 25% dos votos, atrás da formação de Kocharian (cerca de 29%), mas à frente da coligação do ex-Presidente Serge Sarkissian (7,4%). A abstenção poderá rondar os 37%.

“O risco de confrontos de rua é muito elevado após uma votação precedida de uma campanha tão agressiva”, lamentou em declarações à agência noticisa AFP o analista político Viguen Hakobian.

A Arménia já registou diversos tumultos pós-eleitorais. Antes da “revolução pacífica” de 2018, Pashinyan foi detido durante cerca de dois anos pelo seu envolvimento durante manifestações violentamente reprimidas em 2008.

O acordo de cessar-fogo negociado em novembro pelo Presidente russo, Vladimir Putin, e o envio de uma força de paz russa permitiu a Erevan manter o essencial do Nagorno-Karabakh, a região secessionista em território azeri habitada por uma maioria de arménios.

No entanto, a Arménia perdeu importantes territórios em torno deste enclave separatista, que mantinha desde o violento conflito no início da década de 1990, e não impediu o regresso do Azerbaijão às suas fronteiras, com diversas escaramuças militares registadas nas últimas semanas.

Cerca de 2,6 milhões de arménios são convocados às urnas para elegerem pelo menos 101 dos 132 lugares de deputados por cinco anos.

Quatro coligações eleitorais e 22 partidos, um recorde, apresentam-se ao escrutínio, com diversas formações com possibilidade de elegerem deputados, segundo uma sondagem publicada na sexta-feira pelo instituto MPG, filial da norte-americana Gallup.

Caso não seja garantida no domingo uma maioria estável no hemiciclo, prevê-se a organização de uma segunda volta em 18 de julho entre os dois partidos mais votados.

LUSA/HN

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