Especialista atribui número exagerado de casos a relaxamento de comportamentos

25 de Janeiro 2022

O virologista do Instituto de Medicina e Higiene Tropical (IMHT) Celso Cunha considera que ainda não é altura para aliviar muito as restrições para reduzir os contágios pelos SARS-CoV-2 atribuindo ao “relaxamento” atual o “número exageradíssimo” de novos casos.

Segundo o ‘site’ estatístico Our World in Data, Portugal continua esta semana a ser o quarto país da União Europeia com mais novos casos diários de contágio, passando de sexto para quinto no mundo.

“Neste momento, não tem havido muita preocupação em conter a transmissão desta variante, que é a mais prevalente em Portugal, a Ómicron, e isso tem-se visto até pelo número exageradíssimo de novos contágios que temos detetado todos os dias”, afirmou à agência Lusa o diretor da Unidade de Microbiologia Médica do IMHT.

Para o virologista, cerca de 50 mil novos contágios diários é um número “muito acima do que seria expectável” há uns meses.

Por um lado, apontou, “há um relaxamento das medidas de contenção de redução de contágios”, mas, por outro lado, o Serviço Nacional de Saúde “não tem sofrido muito com isso”.

Apesar do “número enorme de contágios”, o número de doentes em cuidados intensivos tem-se mantido em “quotas aceitáveis” para o SNS, que “muito provavelmente não irá entrar em rutura, como aconteceu em 2021.

Para o investigador, esta situação deve-se sobretudo à vacinação e ao facto de os contágios afetarem, principalmente, pessoas mais jovens que, apesar de geralmente terem sintomatologia leve, são veículos de transmissão do vírus, sendo esse um dos motivos de haver tantos casos.

O diretor da Organização Mundial da Saúde Europa afirmou, no domingo, que a Ómicron iniciou uma nova fase da pandemia na Europa que a pode aproximar do seu fim, mas pediu cautela devido à imprevisibilidade do vírus.

Para Hans Kluge, as políticas de saúde devem agora centrar-se em proteger as pessoas vulneráveis, em vez de procurarem diminuir a intensidade da transmissão do vírus.

Questionado sobre esta situação, Celso Cunha afirmou que os mais vulneráveis (idosos, pessoas com comorbilidades e imunodeprimidos) são prioritários em Portugal em termos de vacinação.

Advertiu, contudo, que apesar de estarem vacinados com a dose de reforço, os idosos “não estão totalmente protegidos”, porque as vacinas não protegem a 100%, e nesta população, à partida, a sua eficácia “é um bocadinho menor”.

Por estas razões, defendeu que não é o momento para “aliviar muito” as restrições: “Devemos continuar a testar, a ter algumas restrições nos contatos, continuar a usar máscara” e a vacinar.

“Se toda a gente estivesse vacinada podíamos andar a pedir que fossem aliviadas algumas restrições, mas acho que não temos o direito de estar a exigir que se aliviem as restrições, sabendo que isso vai causar um grande número de mortos”, advertiu.

“Talvez daqui por umas semanas, uns meses, passado este pico da variante Ómicron e o tempo começar a melhorar”, com reflexo na redução de casos, hospitalizações e de mortes, poderá aliviar-se “um bocadinho mais” as medidas de contenção, mas neste momento “ainda é prematuro”.

Também considera prematuro falar-se em endemia: “Endemia significa que temos uma infeção numa determinada zona geográfica, numa determinada população e que vamos ter surtos dessa infeção com alguma regularidade que até conseguimos de algum modo prever”, mas para isso é necessário ter “muita gente imunizada”, ou porque teve a doença, ou foi vacinada.

Se isso acontecer em Portugal, e na maior parte da Europa, poderá chegar-se a “um ponto de equilíbrio”. “Quando o nosso ‘R’ [índice de transmissibilidade] ficar à volta de 1, com uma população vacinada, o número de casos vai tender a estabilizar”.

“Mas é cedo, nem sei se vamos conseguir, porque para termos este vírus endémico vamos ter que ter sempre uma grande parte da população imunizada”, insistiu.

Celso Cunha está convicto que, depois desta “grande onda” epidémica, “uma grande parte da população” ficará imunizada “nas próximas semanas ou meses”.

“Esta variante está a infetar quase toda a gente, temos 50, 60 mil casos por dia, isso significa que, a este ritmo, ao fim de 20 dias teremos quase um milhão de pessoas imunizadas e isso abrangeria uma parte dos que estão vacinados, mas sobretudo aqueles que não estão vacinados”, indicou.

Sobre o que acontecerá depois disso, disse ser imprevisível: “As taxas de vacinação no mundo inteiro são muito diferentes e a qualidade das vacinas que são administradas em diversas partes do mundo também é diferente”.

“Neste momento, estamos a falar da Ómicron, mas poderão surgir novas variantes” que não se sabe se irão “ser mais graves ou menos graves, mais ou menos transmissíveis com patologias associadas também mais graves”.

LUSA/HN

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

Menezes exige esclarecimentos à ministra da Saúde sobre futuro da ULS Gaia/Espinho

O presidente da Câmara de Gaia, Luís Filipe Menezes, desafiou a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, a esclarecer os planos para a ULS Gaia/Espinho, manifestando oposição a eventuais medidas de desvalorização da oferta de saúde. Em publicação nas redes sociais, o autarca alertou para a necessidade de tranquilizar autarcas, profissionais e cidadãos, sublinhando a importância de valorizar o maior centro hospitalar a sul do Porto.

Médicos aderem à greve geral em defesa do SNS e contra pacote laboral

Os médicos representados pela Fnam vão parar a 11 de dezembro, juntando-se à greve geral convocada contra as medidas do Governo. A decisão, tomada por unanimidade no congresso da federação, enquadra-se numa luta mais ampla por melhores salários e condições, bem como na defesa intransigente de um SNS público. A presidente da organização criticou veementemente a visão da ministra da Saúde

Diabetes: O Peso Silencioso na Mente

Mais de metade das pessoas com diabetes em Portugal sente que a doença afeta significativamente o seu bem-estar emocional. Um estudo revela um impacto mental profundo, com dois terços dos inquiridos a reportarem ansiedade. O sentimento de isolamento e a discriminação são realidades para muitos, agravando um quotidiano já de si complexo

Depressão Precoce e Risco de Suicídio: Estudo Revela Marcadores Genéticos Distintos

Um estudo internacional publicado na Nature Genetics identificou diferenças genéticas significativas entre a depressão de início precoce e a tardia. A investigação, que analisou dados de mais de meio milhão de pessoas, conclui que a forma da doença que surge antes dos 25 anos tem uma carga hereditária mais forte e está associada a um risco consideravelmente elevado de tentativas de suicídio, abrindo caminho a abordagens de medicina personalizada

PS de Gaia acusa Ministério da Saúde de desinvestir em pediatria local

A secção do PS em Vila Nova de Gaia acusou esta sexta-feira o Governo de planear a desclassificação da pediatria e da cirurgia pediátrica na ULS local. Os socialistas consideram a intenção inaceitável, alertando que obrigará milhares de utentes a deslocações ao Porto, com custos acrescidos e perda de qualidade no atendimento, saturando outros hospitais

Novo método permite localizar microplásticos em tecido humano sem o destruir

Investigadores da Universidade Médica de Viena desenvolveram um novo método que localiza microplásticos no interior de tecidos humanos sem os destruir. A técnica OPTIR identifica quimicamente partículas e preserva a estrutura do tecido, permitindo correlacionar a sua presença com alterações patológicas. O avanço técnico, já testado em amostras de cólon humano, pode impulsionar a investigação sobre os efeitos dos plásticos na saúde

Agricultor belga transforma adversidade em sorrisos com quinta multifuncional

Dois acidentes graves forçaram Marc De Boey e a mulher a repensar a sua quinta pecuária na Bélgica. Com assessoria especializada, converteram o negócio num caso de sucesso: uma exploração multifuncional com produção própria de gelados, visitas e uma cooperativa que junta onze produtores locais, demonstrando a viabilidade de novos modelos rurais

Proteína Vegetal nas Escolas Pode Reduzir Impacto Ambiental em 50%

Um estudo liderado pela Universitat Oberta de Catalunya, em colaboração com o ISGlobal e a ASPCAT, concluiu que as sucessivas atualizações das diretrizes para ementas escolares na Catalunha diminuíram o impacto ambiental das refeições em 40% desde 2005. A substituição de proteína animal por leguminosas e cereais diversificados pode levar a uma redução de até 50%, sem comprometer o valor nutricional

MAIS LIDAS

Share This
Verified by MonsterInsights