Dois anos: A fadiga da pandemia e a fadiga da compaixão

11 de Março 2022

A pandemia de Covid-19 causou sofrimento psicológico acentuado de dimensão ainda desconhecida e um dos sintomas é a fadiga que provoca, incluindo a fadiga da compaixão, a perda da capacidade de preocupação para com os outros.

O alerta é de Tiago Pereira, coordenador do gabinete de crise Covid-19 da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), que em entrevista à agência Lusa, quando se completam dois anos de pandemia de Covid-19, afirma: “há pessoas em sofrimento psicológico muito significativo”.

E há pessoas, milhares de pessoas, a sofrer de fadiga da pandemia, o cansaço por uma preocupação e atenção constantes, durante muitos meses seguidos. Um cansaço que, diz o responsável, leva a terem menos a perceção do risco.

“Já não quero saber” é um sintoma desse processo, diz Tiago Pereira, acrescentando: “a fadiga da pandemia está a fazer com que provavelmente a doença tenha um impacto mais significativo, porque as pessoas estão menos disponíveis para adotar comportamentos de autoproteção e em relação a outras pessoas”.

Depois, diz também, os que trabalham em áreas sociais podem estar a perder a capacidade de compaixão, pelo mesmo cansaço, e à medida que o tempo passa mais a fadiga influencia o comportamento, remete para uma sobrecarga. “Estar sempre a obedecer a restrições dá-nos uma sensação de cansaço”.

Nas palavras do psicólogo a fadiga é influenciada pelas constantes alterações de regras, pela imprevisibilidade, pela desinformação, pela desconfiança. “Com fadiga cometemos mais erros, aceitamos menos as regras. E estamos todos muito fadigados!”.

Tiago Pereira explica que a fadiga da pandemia faz as pessoas centrarem-se mais nas suas próprias necessidades e não nas necessidades dos outros (“o que eu preciso agora é não pensar mais nisto”), e leva também aos tais comportamentos de risco. As pessoas normalizaram e tornaram rotina alguns comportamentos, mesmo “não sendo os mais positivos”, e baixaram a perceção de risco, explica.

Dois anos depois de tudo ter começado, quando os dados indicam que a pandemia pode acabar, Tiago Pereira diz que só se saberão as consequências psicológicas da Covid-19 dentro de “alguns anos”. Mas é certo, diz, que há pessoas em sofrimento psicológico “muito significativo”, desde logo pelas alterações de rotinas, restrições e imprevisibilidades.

Aumentaram nestes dois anos, enfatiza, situações de stress, ansiedade e depressão, há um conjunto de pessoas, até 05% da população, que pode desenvolver perturbações psiquiátricas, e há uma grande maioria de pessoas com sinais de instabilidade e irritabilidade.

“Os estudos indicam que há um agravamento até 20% de situações de pessoas que não tinham e que passam a ter casos de ansiedade, depressão e stress”, diz.

A OMS num estudo já em outubro de 2020 referia que o cansaço da pandemia atingia cerca de 60% da população europeia.

E também em 2020 um estudo do ISPA – Instituto Universitário de Lisboa, conduzido entre outros pela psicóloga clínica Ivone Patrão, indicou que tendo em consideração as medidas de saúde pública adotadas durante o estado de emergência aumentaram os valores irritabilidade, ansiedade, depressão e exaustão.

“Uma percentagem expressiva dos participantes – no estudo – reporta sentir-se irritado, ansioso, deprimido e exausto. Além disso, grande parte dos participantes afirma sentir que as suas rotinas foram perturbadas, bem como o seu sono”, diz-se no documento, que alerta que à medida que as restrições se mantém as pessoas sentem aumentar os sintomas, especialmente as mulheres.

As restrições, com flutuações, aconteceram nos últimos dois anos.

Passam hoje dois anos sobre a declaração do estado de Pandemia para o Covid-19 pela OMS.

LUSA/HN

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