A China registou um novo decréscimo no número de infeções por covid-19 nas últimas 24 horas, ao diagnosticar 16.797 novos casos, entre os quais 13.160 são assintomáticos, anunciou hoje a Comissão Nacional de Saúde. Não foi relatada nenhuma morte pela doença desde domingo passado.
“Estes dados são inconsistentes com aquilo que se observa no terreno”, considerou Hu Xijin, um influente comentador chinês e antigo editor-chefe do Global Times, jornal oficial do Partido Comunista da China, na sua conta oficial na rede social Weibo, equivalente ao Twitter no país asiático. “Certamente, ninguém acredita nestes números”, acrescentou.
O comentador apelou a que a Comissão Nacional de Saúde corrija os dados ou forneça uma explicação. “Estes números seriamente distorcidos não devem continuar a ser transmitidos ao público através de órgãos oficiais sem qualquer explicação”, afirmou Hu. “É muito importante que a nossa sociedade não permita que erros tão grosseiros sejam cometidos na publicação de dados cruciais para entender o desenrolar da pandemia”, realçou.
A queda no número de casos diários surge numa altura em que o país está a abolir testes em massa, quarentena em instalações designadas, para casos positivos e contactos diretos, e a utilização de aplicações de rastreamento de contactos, numa acelerada reversão das medidas altamente restritivas que vigoraram na China ao longo dos últimos três anos.
Citado pelo jornal Financial Times, o economista Raymond Yeung, do banco ANZ, com sede na Austrália, afirmou também que observações no terreno indicam que algumas cidades têm já “altos números de infecções”. Mais cidades devem enfrentar níveis semelhantes de casos nas próximas semanas, acrescentou.
“Como em Hong Kong, os dados não são mais informativos. À medida que os números ‘oficiais’ de infecção caem, o governo pode eventualmente reivindicar o seu sucesso na luta contra o vírus”, disse.
Em Pequim, dez pessoas que testaram positivo em autotestes de antígeno feitos em casa, após sentirem sintomas, contaram à agência Lusa experiências semelhantes: o resultado do teste PCR feito na mesma altura num dos quiosques da cidade não foi atualizado no código de saúde.
De acordo com dados oficiais, Pequim, que tem cerca de 22 milhões de habitantes, registou 2.673 casos nas últimas 24 horas.
Mas hospitais e farmácias na capital chinesa estão já a ficar sem alguns suprimentos médicos, incluindo ibuprofeno e paracetamol, segundo funcionários de saúde.
Ben Cowling, professor de epidemiologia da Universidade de Hong Kong, alertou para os riscos de abandonar os requisitos de teste e relatar casos de forma imprecisa. “À medida que a intensidade do sistema de testagem é reduzida, vai ser mais difícil ter consciência do nível de infecções na comunidade”, disse.
Segundo um modelo elaborado pela consultora Wigram Capital Advisors, um grupo de consultadoria com sede na Nova Zelândia e que foca a sua pesquisa na Ásia, um milhão de chineses poderá morrer com covid-19 durante os próximos meses de inverno, à medida que a China põe fim à estratégia de ‘zero casos’,
Com 1.400 milhões de habitantes, a China é o país mais populoso do mundo. A estratégia de ‘zero casos’ significa que a esmagadora maioria da população chinesa carece de imunidade natural. Pequim recusou também importar vacinas de RNA mensageiro, consideradas mais eficazes do que as inoculações desenvolvidas pelas farmacêuticas locais Sinopharm e Sinovac.
A taxa de vacinação entre os idosos, o grupo mais vulnerável, permanece também baixa. Segundo dados oficiais recentemente publicados, 86 por cento dos chineses com mais de 60 anos receberam o esquema vacinal completo, embora a percentagem diminua no grupo com mais de 80 anos (65,7%). A proporção de idosos com mais de 80 anos que recebeu a dose de reforço, a nível nacional, é de 40%.
A remoção das restrições poderá desencadear uma ‘onda’ de casos sem paralelo este inverno, sobrecarregando rapidamente o sistema de saúde do país, de acordo com as projeções elaboradas pela Wigram Capital Advisors, que forneceu modelos de projecção a vários governos da região, durante a pandemia.
O número de casos no inverno poderá ser exacerbado pelo feriado do Ano Novo Lunar. A principal festa das famílias chinesas, equivalente ao natal nos países ocidentais, regista, tradicionalmente, a maior migração interna do planeta, com centenas de milhões de chineses a regressarem à terra natal.
A mesma projecção aponta que a China pode registar 20.000 mortes por dia em meados de março. No final do mesmo mês, a procura por unidades de cuidados intensivos poderá ultrapassar em dez vezes a capacidade do país, situando-se em 70.000 hospitalizações diárias.
LUSA/HN
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