Mário Macedo: “A luta dos enfermeiros ingleses é muito semelhante à nossa”, “poderíamos falar mais uns com os outros”

23 de Dezembro 2022

Num ato de solidariedade para com os colegas do Reino Unido, que fizeram greve nacional pela primeira vez em 74 anos, 125 enfermeiros portugueses assinaram uma carta aberta, relembrando os compatriotas naquele país e a semelhança com a realidade portuguesa.

“Nos passados dias 15 e 20 de dezembro, os enfermeiros e enfermeiras do Reino Unido fizeram a sua primeira greve nacional em 74 anos de história do Serviço Nacional de Saúde (NHS), em resposta a mais de uma década de desinvestimento no serviço público e à perda real do poder de compra. Apoiados pelas suas comunidades, centenas de milhares de profissionais aderiram aos protestos, transformando-os nos maiores de sempre no país”, começa por contextualizar a carta.

“Apoiamos a sua luta por uma profissão que não seja desvalorizada nem obrigada a trabalhar em risco, reconhecendo que na base destas exigências está a defesa do direito de cidadãos e cidadãs ao acesso a cuidados seguros e de qualidade”, declaram os enfermeiros.

A carta continua com os motivos desta histórica paragem, que “não nos são distantes”: “todos os dias sentimos os efeitos nefastos de décadas de escassez de investimento no serviço público de saúde, da desadequação dos rácios enfermeiro/utente ou da perda salarial, que por cá atinge uns impressionantes 20%, ou da falta de uma carreira adequada à responsabilidade e risco desta profissão. Todos e todas nós subscrevemos a necessidade e a urgência de mobilização, reforço e otimização da intervenção dos enfermeiros e enfermeiras para salvar o SNS.”

Os enfermeiros portugueses querem “trabalhar com segurança e dignidade” e alertam que as suas carreiras “têm de ser revistas”, e “as progressões deixar de ser uma miragem”. “Merecemos mais condições para conciliar a nossa profissão com a vida familiar”, afirmam.

“Em Portugal, tal como no Reino Unido, a enfermagem pode ser um poderoso agente de mudança e evolução do SNS, dando um contributo essencial para aumentar a acessibilidade aos cuidados de saúde. Assim haja vontade política de promover as mudanças necessárias”, concluem.

O enfermeiro Mário André Macedo, um dos subscritores da carta aberta de solidariedade, explicou ao HealthNews que “a luta dos enfermeiros ingleses é muito semelhante à nossa e, para quem conhece até a realidade dos enfermeiros da Finlândia, da República Checa ou em Itália, também há muitos pontos de contacto, o que nos deveria levar a pensar que poderíamos falar mais uns com os outros, porque muitos dos problemas que nós temos em Portugal são semelhantes aos problemas que os nossos colegas em Itália, na Grécia ou em Inglaterra têm”.

“Por outro lado, ao fazer este paralelo com a nossa realidade, também serve como uma chamada de atenção e um pedido de ajuda, e termina a lembrar o papel que a enfermagem tem enquanto motor da evolução, não só do SNS, mas também do sistema de saúde como um todo, e que a enfermagem também é um dos determinantes ao acesso a cuidados de saúde de qualidade”, acrescenta o profissional de saúde.

A curto prazo, Mário Macedo gostaria que se olhasse para os profissionais de saúde como “agentes da mudança do SNS” e que estas profissões fossem “valorizadas pelo menos ao nível a que estavam há 10 anos”.

Num desabafo não contra os médicos, “antes pelo contrário”, mas porque “Portugal é dos países onde a prestação de cuidados está mais centrada na parte médica”, o enfermeiro disse-nos também que considera importante haver uma melhor distribuição das tarefas na saúde.

“Eu acredito mesmo que nós estando unidos é que prestamos o melhor serviço ao cidadão, mas esta união também tem de se refletir naquilo que cada profissão está a fazer, e a verdade é que em Portugal recaem demasiadas tarefas sobre os médicos e poucas sobre a enfermagem. Eu estou a dizer enfermagem porque sou enfermeiro, mas poderíamos alargar aqui a técnicos e a farmacêuticos. Se nós distribuíssemos melhor este tipo de tarefas, não só as profissões sairiam valorizadas, como o cidadão ganharia imenso com isto”, defende o enfermeiro.

Além de dezenas de enfermeiros envolvidos na prestação de cuidados nos setores público, privado e social, assinaram a carta aberta dirigentes e ex. dirigentes dos três maiores sindicatos de enfermagem, responsáveis da Ordem dos Enfermeiros que exerceram funções em diferentes direções, membros da academia e chefias intermédias.

HN/Rita Antunes

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