“Este atraso gera desmotivação, sentimento agora agravado pela informação de que o Ministério da Saúde estima contratar apenas 200 dos 355 médicos de família (MF), uma das várias áreas em que o setor público tem graves carências de recursos humanos”, critica a ordem profissional.
A Ordem dos Médicos alerta que “se esta falta de estratégia, de planeamento e de ambição se mantiver”, “poderá agravar as carências de capital humano a um ponto sem retorno”. E defende que, para “deter a degradação da resposta nos cuidados de saúde”, “é fundamental que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) dê oportunidade aos serviços de fixarem os 1300 recém-especialistas, com condições atrativas que garantam a permanência dos mais novos e a renovação das equipas”.
O comunicado de imprensa sublinha ainda que “Cuidados de Saúde Primários dotados de recursos humanos em número suficiente são a única forma de termos um sistema de saúde menos ‘hospitalocêntrico’ que corresponda às necessidades da população”. “Apesar disso e de todas as sucessivas promessas políticas feitas em período de campanha eleitoral, em Portugal há mais de 1,6 milhões de utentes sem médico de família”, lamenta o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes. “No primeiro trimestre deste ano, 1300 médicos terminaram a sua formação pós-graduada, 355 dos quais escolheram e terminaram com sucesso a especialidade de Medicina Geral e Familiar (MGF). Inexplicavelmente, o Ministro da Saúde afirma que irá contratar apenas 200 desses especialistas. E, de forma igualmente incompreensível, ainda não iniciou os processos de contratação, deixando os 1300 recém-especialistas suscetíveis a propostas do setor privado ou até para emigração”, refere ainda o bastonário.
A Ordem dos Médicos insta o Ministério a: abrir de imediato os concursos para contratação dos 1300 médicos que concluíram a sua especialidade; abrir de imediato vagas em todas as unidades onde há carência de especialistas e onde existam utentes sem MF; contratar para o SNS todos os recém-especialistas em MGF disponíveis; criar condições que potenciem a fixação de especialistas no SNS, seja através de incentivos e apoio à formação contínua, seja assegurando contratualmente que o horário de trabalho contempla tempo dedicado para investigação.
“Ao não iniciar os processos de contratação para o Serviço Nacional de Saúde e ao declarar que pretende deixar de fora mais de uma centena e meia de especialistas só em MGF, o Ministro da Saúde, Manuel Pizarro, cria um obstáculo óbvio à apregoada fixação dos médicos que tanta falta fazem no serviço público”, lê-se no comunicado. “São sinais muito negativos que nos deixam extremamente apreensivos. Além de 155 médicos de família, quantos mais desses 1300 especialistas recém-formados pretende o Ministério deixar de fora do SNS?! Ao longo dos anos, a Ordem dos Médicos tem assistido ao erguer de sucessivas barreiras que contribuem para afastar os médicos, especialistas e não especialistas, do SNS. É um atentado à saúde dos portugueses a quem sucessivos governos têm prometido um médico de família, mas é também um desrespeito pelos médicos que dedicaram vários anos a estudar e trabalhar para se especializarem”, diz Carlos Cortes.
“Este é o mesmo Ministro que, enquanto secretário de Estado, em 2009, reconhecia a falta de MF e garantia a aposta do Governo na formação de novos profissionais. O mesmo Ministro que em maio de 2022, enquanto eurodeputado, num novo exercício de retórica, afirmava que a solução para o problema dos portugueses sem MF era evidente e que passava pela contratação direta pelas unidades de saúde em detrimento de concursos nacionais; este é o mesmo Ministro que afirmou que, se continuarmos a atrair apenas dois terços dos candidatos a cada ano, vamos continuar a perder centenas de MF. O mesmo Ministro que em outubro de 2022, já depois de ter assumido a pasta da Saúde, garantia ter a intenção de dar prioridade à atração para o SNS de todos os especialistas em Medicina Geral e Familiar. Promessas que, uma vez mais, parecem ser apenas isso: promessas”, critica o bastonário.
“Um SNS assegurado por médicos sem vínculo contratual é um SNS precário, a prazo. A Ordem dos Médicos quer muito mais. Exigimos mais ambição a quem tem o dever de proteger o direito constitucional à saúde. Um médico nunca abandona o seu doente. Como representante de todos os médicos não esperem que compactue com quem parece querer abandonar o SNS”, conclui.
PR/HN/RA
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