Químicos nocivos proliferam um ano após promessa de proibição pela UE, acusam ambientalistas

25 de Abril 2023

Produtos químicos nocivos para a saúde, entre eles alguns em fraldas para bebés, continuam a proliferar na Europa, um ano depois de a Comissão Europeia ter anunciado a proibição de milhares de substancias tóxicas, alertaram hoje organizações ambientalistas.

Há exatamente um ano, a Comissão Europeia publicou um “roteiro de restrições”, para servir de base ao estabelecimento de uma lista das substâncias químicas mais nocivas para a saúde humana e o ambiente a serem proibidas na União Europeia.

No mesmo dia, o Gabinete Europeu do Ambiente (EEB, na sigla original), uma rede de 170 organizações ambientais, considerou o anúncio da Comissão um “grande detox”, por ser a maior proibição de produtos químicos tóxicos de sempre.

O anúncio, parte do Pacto Ecológico Europeu, traduzia-se na maior remoção de substâncias químicas autorizadas, que era pedida há muito por grupos ambientalistas e de consumidores.

Entre outras restrições estavam por exemplo os retardadores de chama, frequentemente ligados a cancro, ou os bisfenóis, usados em plásticos de alimentos por exemplo e que afetam as hormonas humanas.

Eram também banidas todas as formas de PVC, um plástico difícil de reciclar e com aditivos tóxicos presente por exemplo em calçado, móveis ou brinquedos, e teriam restrições os PFAS (substâncias perfluoroalquiladas), que resistem à degradação e que contaminam o ambiente, o chumbo e seus compostos em munições e na pesca, e outros produtos químicos nocivos encontrados por exemplo em fraldas de bebé, chupetas e outros produtos de puericultura.

Um ano depois, o mesmo EEB, em parceria com o grupo ambiental “ClientEarth”, uma instituição de direito ambiental presente em várias cidades do mundo, advertiu que o plano da Comissão “está a falhar”.

Produtos químicos ligados a cancro, à fertilidade humana, substancias nocivas em fraldas, chupetas e produtos de puericultura continuam a ser usados sem restrições e as organizações falam mesmo, num comunicado, de “fracassos notáveis”.

Foram apresentadas proibições de 14 grupos químicos dentro do prazo previsto, indica a análise dos ambientalistas, salientando que dois desses grupos são “suficientemente fortes e abrangentes” para impedir que a maioria dos danos seja feita.

Mas 11 outros grupos cobrem apenas um pequeno número de produtos químicos ou as suas utilizações, permitindo que a grande maioria da poluição e dos seus impactos continue, enquanto um outro grupo é redundante.

A maioria dos dossiês são projetos e poderiam ainda ser reforçados, “mas na sua forma atual centenas de milhares de toneladas de substâncias tóxicas por ano” vão escapar às proibições.

Dizem as organizações que apenas cinco dos 148 bisfenóis estão definidos para serem restringidos, “deixando sem controlo dúzias, que se sabe estarem a prejudicar os humanos”. E dizem que a maioria dos usos controversos de Bisfenol A está definida para continuar.

Depois, acrescentam, os caçadores vão poder continuar a disparar milhares de toneladas de munições de chumbo, altamente tóxicas, para o ambiente, e “a ameaça de produtos químicos com riscos ´muito graves´ em fraldas / fraldas de bebé continuará após a Comissão ter rejeitado uma proibição, contra o conselho dos seus peritos”.

No documento intitulado “Um roteiro para lado nenhum?”, as duas organizações dizem também que os progressos têm sido geralmente lentos, que na maior parte dos casos os prazos não são cumpridos, às vezes durante anos, e ainda que são propostas isenções que chegam a 12 anos.

A culpa pela situação, dizem as duas organizações, é da pressão exercida pela indústria química, o quarto maior setor industrial da União Europeia (UE) e um dos mais poluentes, mas essencialmente dos responsáveis europeus, que podiam assegurar “proibições amplas e rápidas” mas que permitem e até contribuem para “uma regulamentação lenta e fraca”.

“Durante anos, temos testemunhado o fracasso da abordagem fragmentada da UE às proibições de produtos químicos. Esta abordagem significa que as pessoas e o nosso ambiente não estão protegidos contra as substâncias químicas mais nocivas. Isto tem de mudar agora – as autoridades europeias e a Comissão Europeia dispõem de todos os instrumentos legais para salvar este roteiro e corrigir um rumo de trabalho deprimente”, diz citada num comunicado a consultora de direito da “ClientEarth”, Hélène Duguy.

Um alerta também deixado por Dolores Romano, do EEB: “Ultrapassámos os limites da poluição química. O nosso ambiente, água potável, alimentos, as nossas casas e bens incluem volumes cada vez maiores de produtos químicos sintéticos perigosos ligados a alergias, doenças e infertilidade, nos seres humanos e no mundo natural”.

A produção química multiplicou-se por 50 desde 1950 e prevê-se que triplique até 2050 a nível global. A Agência Europeia do Ambiente alertou recentemente que há cada vez mais provas de que os europeus estão a sofrer impactos na saúde devido à poluição por produtos químicos.

A EEB estima que sejam utilizados na Europa cerca de 200.000 produtos químicos, cujas vendas globais mais do que duplicaram entre 2000 e 2017.

Em volume, três quartos dos produtos químicos produzidos na Europa são perigosos, diz o EEB, segundo o qual cerca de 700 químicos industriais que são encontrados hoje nos seres humanos não estavam presentes nos corpos dos seus avós.

LUSA/HN

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