“Alguns grupos populacionais socialmente mais desfavorecidos lucram muito com uma legislação eficaz e abrangente, porque é a única maneira de proteger essas populações que não conseguem deixar de fumar”, disse à agência Lusa a coordenadora da comissão de tabagismo da Sociedade Portuguesa de Pneumologia.
Sofia Ravara defendeu que não se consegue prevenir o tabagismo “só com educação para a saúde, que também existe pouco”, porque estas populações têm “muito menor literacia em geral e em saúde e menos recursos cognitivos”, além de viverem num ambiente demasiado “pró-tabágico para conseguirem perceber as mensagens de educação para a saúde e depois aplicá-las no seu dia-a-dia”.
Por isso, vincou, “ao implementarmos este pacote de medidas, que espero que sejam implementadas sem exceções pela Assembleia da República, estamos também a contribuir para diminuir as desigualdades sociais e as desigualdades em saúde, porque o tabaco também é um marcador das desigualdades sociais”.
“Nós sabemos que cada vez mais fumam as populações socialmente mais desfavorecidas. (…) Fumam mais, adoecem também mais, morrem mais, têm menos acesso (…) aos cuidados de saúde e têm muito mais dificuldade para deixar de fumar. Acho que estas medidas são muito importantes”, elucidou.
Sofia Ravara destacou a importância de ser um pacote de medidas que vai além das preconizadas pela diretiva europeia que equipara o tabaco aquecido ao tabaco convencional.
As alterações à Lei do Tabaco anunciadas, que deverão ser aprovadas na quinta-feira em Conselho de Ministros, foram motivadas essencialmente pela necessidade de transpor para a legislação nacional a diretiva europeia, de 29 de junho de 2022, que equipara o tabaco aquecido a outros produtos do tabaco, proibindo a venda de tabaco aquecido com aromas.
“Nós sabemos que os sabores são muito apelativos para as gerações mais jovens experimentarem estes novos produtos e para os continuarem a usar”, afirmou.
Para a pneumologista, “a próxima questão essencial” é que o tabaco aquecido e os cigarros eletrónicos sejam taxados de “uma forma eficaz e consistente e igual ao tabaco convencional, aproveitando a oportunidade da negociação do Orçamento de Estado, o que permitia o aumento dos impostos de um modo consistente e acima da inflação”.
Assinalando que os impostos do tabaco em Portugal não têm acompanhado a inflação, defendeu que os impostos sobre o tabaco deviam aumentar anualmente e uma parcela das receitas para o Estado, como já aconteceu há alguns anos, devia ser aplicada na promoção e campanhas de educação para a saúde e prevenção do tabagismo e para a comparticipação e apoio financeiro aos fumadores que querem deixar o vício.
Devia ser igualmente aplicada na “fiscalização das leis de prevenção do tabagismo que não são eficazmente fiscalizadas”.
Outra medida defendida por Sofia Ravara é o aumento do preço do tabaco como resultado duma taxação eficaz e consistente, sublinhando que é a “medida isolada” com mais impacto para travar o consumo.
Analisando as medidas propostas pelo Governo, a pneumologista salientou a importância de alargar a proibição de fumar ao ar livre nos perímetros de acesso ao público de locais, como hospitais, centros de saúde, escolas, universidades, recintos desportivos, paragem de transportes públicos.
“É a única maneira de evitar a contaminação dos edifícios interiores”, uma vez que o fumo do tabaco, dos cigarros eletrónicos e do tabaco aquecido entra para o interior dos edifícios se as pessoas fumarem à porta.
Por outro lado, também é “uma ajuda enorme” para os fumadores quererem deixar de fumar. E muda a norma social em relação à aceitação do tabagismo, prevenindo o consumo pelos jovens e promovendo a cessação do consumo dos fumadores adultos
Contou que há muitos fumadores que vão à consulta antitabágica que dizem que uma das razões pelas quais querem deixar de fumar é porque sentem que são os únicos que fumam e que de certa maneira já não é tão bem aceite socialmente fumar.
LUSA/HN
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