A Saúde vive melhor em democracia

09/15/2023
por Luis Mós Enfermeiro

Há uma linha que separa a Saúde em Portugal e essa linha é definitivamente a democracia. Para podermos entender melhor esta premissa teremos de fazer uma breve resenha histórica. 

Antes de 1974 a Saúde estava dependente do poder económico das famílias mais abastadas que podiam recorrer ao setor privado e, quando estas não conseguiam pagar os seus cuidados de Saúde, havia instituições sociais e de previdência para os mais necessitados e indigentes, sem a garantia de chegar a toda a população que carecia desses cuidados. 

O Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi implantado após o 25 de Abril de 1974, mais precisamente em setembro de 1979, passando a oferecer um serviço com cobertura verdadeiramente nacional da responsabilidade do Estado. 

A área da Saúde tem muitas vantagens num regime democrático. Uma delas é a da participação pública na formulação das políticas, através do exercício do direito de voto em quem acreditamos que oferece as melhores políticas de Saúde, além da imprescindível prestação de contas públicas aos cidadãos. 

Por outro lado, um SNS na esfera do Estado oferece garantias de equidade de acesso aos serviços médicos. Senão vejamos, o exemplo bastante elucidativo dos médicos dentistas. A grande maioria destes profissionais pertence ao setor privado. Cerca de 92.5% exerce em clínicas privadas, 4,1% em hospitais privados e apenas 2,4% em Centros de Saúde, o Estado tem um número residual destes profissionais. Poderemos concluir que quando a intervenção do Estado é reduzida o Privado não defende os valores de carreiras dignas a atrativas, atualmente cerca de 50% de jovens médicos dentistas, auferem 1500 Euros Brutos, o que equivale a pouco mais de 1000 euros líquidos, segundo a Ordem dos Médicos Dentistas. 

É premente manter a Saúde na esfera do Estado, garantindo uma carreira digna aos profissionais e uma oferta verdadeiramente universal, sem que a Saúde seja vista como um negócio. Desta forma, poderemos depreender que quando o Estado se alheia de determinado serviço/setor é a lei da oferta e procura a funcionar, sem a preocupação de abrangência à população e sem capacidade de oferecer carreiras dignas aos profissionais. 

A Saúde como SNS do Estado assegura que as decisões sejam tomadas de forma transparente e responsável, levando em consideração as necessidades e opiniões de diversos grupos da sociedade. Por outro lado, o Estado garante a inovação na pesquisa médica e no desenvolvimento de soluções de Saúde, ao permitir a livre expressão de ideias e a colaboração entre especialistas e cidadãos. 

Assim, poderemos concluir que o Estado deve apostar cada vez mais no serviço público como garante de oferta de cuidados à população. 

Os tempos atuais enfrentam grandes e novos desafios. Por um lado, o SNS terá de se apresentar moderno, aliciante e cativante, através de carreiras dignas, e ter capacidade de oferta de cuidados de Saúde. O setor privado pode coexistir como complemento, mas nunca como substituição de serviços. 

Principalmente ao nível de pequenas clínicas de análises, tratamentos, etc, na comunidade, o que também ajuda a desenvolver as economias locais. 

Assim, resta apostar num SNS forte e robusto, capaz de reter os profissionais e de assegurar os cuidados à população. Esta capacidade só é real em democracia e com o Estado como detentor dessa capacidade. 

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

Mensagem de Manuel Pizarro. Médico e Ministro da Saúde

O SNS é uma criação da democracia portuguesa, tendo tido consagração constitucional em 1976 e lei fundadora aprovada em 1979.
Durante estas quatro décadas e meia mudou de forma radical o panorama sanitário do nosso País. O velho Portugal do fascismo, em que as pessoas estavam abandonadas à sua sorte, e os indicadores de saúde espelhavam um verdadeiro atraso civilizacional, foi transformado num país moderno, com resultados em saúde que ombreiam com os melhores do Mundo.

Democracia e Saúde: avanços e recuos

por Eduardo Paz Ferreira
Advogado; Presidente do Instituto de Direito Económico, Financeiro e Fiscal (IDEFF) e do Instituto Europeu (IE) da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

Saúde e Democracia

por Delfim Rodrigues
Coordenador do Programa Nacional de Implementação das Unidades de Hospitalização Domiciliária nos hospitais do SNS

SNS – Pilar da Democracia

por Arlindo Carvalho
Empresário; Ministro da Saúde nos XI e no XII Governos Constitucionais

O Estado de Mercado Social

Contributo para um pensamento Social Democrata Reformista.
por António Alvim
Médico

Prof. António José Barros Veloso: “CSP não cumprem a sua missão de forma eficiente”

“Os cidadãos têm de ter o seu médico assistente, no centro de saúde, para os atender quando adoecem”, defende o Prof. Doutor António José Barros Veloso, diretor do Serviço de Medicina do Hospital dos Capuchos (1986 a 2000), presidente da Sociedade Médica dos Hospitais Civis (1987- 1989), da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (1992-1994) e da Comissão de Ética para a Investigação Clínica (2005-2011). Além da dificuldade que os cidadãos têm para aceder aos cuidados de saúde primários, «os médicos de família foram sobretudo preparados para fazer prevenção da doença e promoção da saúde e não para tratar doenças agudas. E não me parece que a reforma que o Ministério da Saúde está a fazer vá corrigir isto».

ORGANIZAÇÃO

Fundação para a Saúde
Healthnews - Jornalismo de Saúde
Share This