Associação lamenta discriminação salarial nos cuidados continuados face à Função Pública

15 de Setembro 2023

A Associação Nacional dos Cuidados Continuados lamentou hoje a "discriminação salarial" dos funcionários destas instituições face aos do Estado, apelando ao Governo para ter em conta, nos valores que paga, as atualizações salariais na Função Pública e a inflação.

“Sendo o Governo o mesmo decisor do aumento salarial da Função Pública e dos salários nos cuidados continuados – porque é o Governo que decide o preço dos cuidados continuados, logo, indiretamente, também decide o aumento dos salários, (…) – como é possível esta discriminação”, questiona José Bourdain, presidente da ANCC.

E exemplifica com o caso dos enfermeiros: “Na função pública o aumento foi na casa dos 93 euros e, no setor social e nos cuidados continuados, o aumento foi de 20 euros no contrato coletivo de trabalho”.

Em declarações à Lusa, o presidente da ANCC sublinha a “enorme discriminação salarial” dos funcionários das instituições de cuidados continuados, insistindo: “Estes funcionários também prestam serviço público, mas são altamente discriminados pelo Governo”.

O responsável salientou a urgência da revisão dos valores pagos pelos cuidados continuados – em todas as valências -, para garantir a sobrevivência das instituições, lembrando um estudo da Faculdade de Economia da Universidade do Porto que aponta o subfinanciamento nesta área, com maior prejuízo para as unidades de média duração (para internamentos entre 30 e 90 dias).

O estudo, feito a pedido da ANCC, concluiu que, nas unidades de média duração em cuidados continuados, este ano, com a atualização salarial e a inflação, o valor do prejuízo pode chegar aos 500 euros mensais por utente.

Os autores sublinham que, apesar da atualização de preços em 2022, o valor pago pelo Estado “continua a ser consideravelmente menor do que os custos unitários suportados pelas instituições”, o que pode “comprometer a qualidade dos serviços” e até a sobrevivência das unidades.

Apontam para um subfinanciamento estatal nas três valências (convalescença, média duração e longa duração), mas com agravamento se se tiver em conta o peso da atualização salarial deste ano e da inflação.

Pegando nas contas dos associados da ANCC, o estudo concluiu que as Unidades de Média Duração e Reabilitação (UMDR) foram as que tiveram maior prejuízo mensal por utente no ano passado. Esta valência, que o Estado financia com 95,84€/utente/dia, teve um prejuízo de 10,40€/utente/dia em 2022, um valor que sobe para 15,01€ quando se tem em conta o peso da atualização dos salários este ano e para 16,68€ se for considerada a inflação.

Nas Unidades de Convalescença (UC,internamentos até 30 dias), em que o Estado paga 110,84€ por utente/dia, o prejuízo foi de 6,56€ utente/dia, um valor que sobe para 12,25€ contando com o peso da atualização salarial e para 13,72€ juntando a inflação.

Nas Unidades de Longa Duração e Manutenção (ULDM, internamentos superiores a 90 dias), o prejuízo foi de 5,28€/utente/dia, mas pode chegar aos 8,82€ no cenário traçado pela Faculdade de Economia do Porto juntando a atualização salarial e aos 10,01€ no segundo cenário, que conta também com o peso da inflação. Nesta valência, o valor pago pelo Estado é 75,48€/utente/dia.

A Faculdade de Economia da Universidade do Porto concluiu ainda que as unidades de cuidados continuados associadas da UNCC têm mais profissionais do que o exigido na legislação e José Bourdain lembra que sem estes profissionais as unidades não podiam funcionar. Estão aqui incluídos funcionários administrativos, de limpeza ou os de cozinha.

“O quadro de pessoal no qual se baseiam para as contas [para calcular o pagamento a fazer aos cuidados continuados] está completamente desajustado porque é impensável ter uma unidade de cuidados continuados a funcionar sem funcionários de limpeza, sem rececionistas e administrativos e sem pessoal de cozinha. É impossível. (…) Como é que não previram isto?”, questiona.

LUSA/HN

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