Não tenho razões claras para comemorar o Dia Nacional do SNS e o Dia Internacional da Democracia em 2023!
Não podemos impávidos perceber que o SNS falha em hospitais e urgências, com escalas de encerramentos sucessivos e que 1.5 milhão de Portugueses não tem médico de família atribuído…
Custa a acreditar que continuemos sem conhecer em Portugal um verdadeiro pacto de regime que, no tempo e na vontade, permitisse aos cidadãos abraçar no SNS um pilar da Democracia Portuguesa e a prioridade das prioridades.
Assistimos ao definhar do SNS, enrolados em promessas e anúncios que o tempo revelou como mentiras e oportunidades desperdiçadas.
António Arnaut, “Pai” do SNS em 1979, concedeu à TSF uma entrevista no início de 2018, meses antes de falecer, defendendo que “o SNS fosse colocado no centro das prioridades políticas do País”, o que passa “por reforçar o seu financiamento, revalorizar as carreiras, acabar com as promiscuidades entre público e privado e tornar o serviço realmente acessível a todos os cidadãos.”
Recordava que, “a maior parte dos políticos não são utentes do SNS” e, por isso, “não compreenderam o sentido que ele tem no sentido da defesa da dignidade e na coesão social”!
Tal lucidez contrasta com a pouca seriedade com que outros andam pelo SNS.
No arranque de 2020, os responsáveis pelo Ministério da Saúde anunciaram “É a chave para o SNS”, referindo-se aos Centros de Responsabilidade Integrada (CRI) que permitiriam aumentar cirurgias e consultas, sob promessa de se tratar de “aposta com muito potencial e a assumir um carácter decisivo na diminuição das listas de espera e na retenção de profissionais no SNS!”
O Jornal Público citava um “instrumento chave” e que seriam criados mais 40 CRI, “que a juntar aos 17 que já existem, elevam para 57 o número de CRI no SNS”.
As promessas para os incautos eram grandes: “O Ministério da Saúde tem 100 milhões para os CRI em 2020; Os CRI são um meio para reter os melhores profissionais no SNS; As equipas vão trabalhar com autonomia de gestão e recebem incentivos de acordo com os resultados e com a atividade assistencial; os objetivos são definidos pelos profissionais, o que lhes aumenta a motivação”…
Em Agosto de 2023 é anunciada uma nova e “grande reforma” para 2024 e o SNS ficará organizado em 39 Unidades Locais de Saúde (ULS)!
“Esta é a grande reforma do SNS, não haja a mínima dúvida. Nós estamos a fazer uma reforma que vai abranger todo o país e vai alterar de forma profunda, do ponto de vista da organização, os cuidados de saúde”, li como declarações do CEO do SNS.
E que aconteceu ao anúncio e resultados e ao dinheiro anunciado sobre os CRI?
Sejamos claros, o modelo ULS não é novo, nasceu em Matosinhos (1999), é requentado…
Sejamos directos, o modelo organizacional das ULS é a integração vertical dos cuidados de saúde primários (CSP) e hospitalares num único órgão de administração e que não integra os cuidados continuados e paliativos, minimiza os CSP, a prevenção da doença e a promoção da saúde, mantendo, como está à vista, onde existem ULS uma cultura hospitalocêntrica.
Sejamos realistas, estudos dos resultados de ULS vigentes, realizados pela ACSS e ERS, incidindo sobre o acesso aos cuidados e à qualidade destes, a eficiência produtiva e desempenho económico-financeiro, apontaram para que o modelo organizativo em ULS não aportou ganhos significativos ao SNS.
Sejamos desmentidos, as novas ULS estão a ser “criadas de baixo para cima”, algo que “fará toda a diferença” foi dito na apresentação prometida para o SNS em 2024, mas os profissionais até agora nada sabem, nem em nada foram envolvidos, nomeadamente nas implicações legais e contratuais expectáveis!
E finalmente, não sejamos tidos por dementes. O financiamento das ULS sempre esteve associado à capitação e a ajustamento por estratificação pelo risco. Nada de novo!
Quo vadis? É uma expressão latina que significa “Para onde vais?” ou “Aonde vais?”
Serviu para que Jesus ressuscitado encorajasse Pedro para se tornar um mártir e ser crucificado com a cabeça para baixo…
Quo vadis SNS?
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