A mulher foi submetida a uma intervenção cirúrgica, na região de Castela e Leão, em 2018, e deixou previamente registada por escrito a recusa em receber transfusões de sangue durante ou depois da operação, mesmo que estivesse em causa a sua vida.
Na sequência de complicações da operação, foi transferida para um hospital de Madrid, noutra região autónoma, onde recebeu as transfusões, que foram previamente autorizadas por um tribunal.
Os médicos do hospital de Madrid pediram a autorização judicial para os tratamentos para salvar a vida da mulher porque sabiam que era Testemunha de Jeová, uma religião que recusa as transfusões de sangue.
No entanto, segundo a sentença conhecida hoje do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), o juiz tomou uma decisão com base em “informações muito limitadas, erradas e incompletas”.
O juiz, segundo o processo, foi informado de que a mulher recusava “qualquer tipo de tratamento” e que só havia manifestado essa vontade oralmente, tendo autorizado a adoção de “todos os procedimentos para lhe salvar a vida”, sem que soubesse, por exemplo, que havia documentos escritos em relação às transfusões de sangue.
Além disso, nem a mulher, num momento em que ainda estava consciente, nem os seus familiares foram informados da decisão do juiz ou de que a equipa médica iria fazer transfusões de sangue.
O TEDH considerou, assim, que Espanha violou a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, nomeadamente, o respeito pela vida privada e familiar e o direito à liberdade religiosa.
“Deixar que o paciente decida se aceita ou não um tratamento é um princípio elementar e fundamental” que “está protegido pela regra do livre consentimento”, afirmou o tribunal na sentença de hoje, citada pelas agências de notícias EFE e AFP.
“Quando um Estado decide pôr em marcha um sistema de diretivas médicas antecipadas e os pacientes se servem desse sistema, é importante que funcione de forma eficaz”, lê-se ainda na decisão do TEDH, numa referência aos mecanismos adotados em Espanha e noutros países relativos ao designado “testamento vital” e autorizações prévias dos pacientes relativas a tratamentos e procedimentos médicos.
Numa declaração à agência EFE, o advogado da mulher que recebeu as transfusões de sangue considerou que o TEDH tomou “uma excelente decisão” que “protege o direito dos pacientes em toda a Europa” e “acaba com certas exceções” ao livre consentimento, como aconteceu com a sua cliente.
O advogado Petr Muzny sublinhou que o problema neste caso não esteve nas regras que existem em Espanha, que considerou serem boas e não precisarem de alterações, mas numa “aplicação deformada da legislação”.
Este caso foi levado ao TEDH, com sede em Estrasburgo, depois de um percurso judicial nos tribunais espanhóis, que nunca deram razão à mulher que recebeu transfusões de sangue contra a sua vontade.
NR/HN/Lusa
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