Helen Rees, fundadora e diretora executiva do Instituto de Saúde Reprodutiva e HIV da Universidade de Witwatersrand, na África do Sul, falava num painel sobre a resposta à Covid-19 em África e a preparação para futuras ameaças, durante a primeira Conferência de Saúde Pública em Áfrca.
Citando um estudo recentemente publicado na revista científica Nature, Rees disse que de quase dois mil ensaios atualmente em curso, só 150 estão a ser feitos em África, a maioria dos quais no Egito e na África do Sul.
“Mais uma vez na terapêutica, não estamos a ver de todo a nossa proporção justa. E, no entanto, precisamos de terapêuticas, provavelmente mais do que qualquer outra região do mundo”, alertou, referindo-se às baixas taxas de vacinação no continente, que só tem cerca de 7% da população totalmente vacinada, enquanto os restantes continentes têm todos mais de 45% da população vacinada.
Rees, que é também investigadora em medicina, a região africana representa ainda uma muito pequena percentagem da investigação que se faz no mundo e está à margem da maioria das colaborações que existem na investigação entre diferentes instituições em todo o mundo.
A responsável alertou ainda que uma das consequências da pandemia de Covid-19 foi agravar a diferença entre homens e mulheres na investigação: “A autoria masculina voltou a subir e reduziu-se o número de mulheres autoras, com a região africana a ser a mais afetada. (…) Deixámos cair as nossas mulheres cientistas por causa da pressão de ter de publicar e de ter de fazer ciência urgente”, lamentou.
A especialista lembrou ainda que, embora represente 14% da população mundial, África apenas representa 1% da produção de vacinas e menos de 10 países do continente são autossuficientes em aquisição de vacinas.
“Temos uma necessidade urgente de vacinas produzidas localmente, acessíveis (…) e com preço mais justo”, afirmou.
O diretor da Aliança para Acelerar a Excelência na Ciência em África, Tom Kariuki, alertou que, além de ter falta de vacinas, o continente africano é também o que tem feito menos testes de diagnóstico, devido à dependência de ‘kits’ de diagnóstico importados.
Apelou por isso à urgência de construir melhores sistemas de laboratórios em África, o que considerou crucial para estimar o peso das doenças, fornecer diagnósticos atempados e monitorizar a evolução desta e de futuras pandemias.
Insistiu também na necessidade de construir plataformas para a investigação e desenvolvimento de medicamentos, sublinhando que, comparado com a falta de centros de diagnóstico, África tem ainda menos centros focados em fármacos, exceto na África do Sul e no Egito.
Defendeu ainda a aposta na investigação genética, sublinhando que, embora o genoma humano tenha sido descodificado em 2003, esta área da investigação científica “continua na sua infância”.
Em particular, destacou a falta de diversidade existente nas bases de dados genómicas, onde 95% das amostras são de descendentes de europeus, lembrando que está em curso um projeto de sete anos para aumentar significativamente o número de amostras de africanos na base de dados global.
Apesar dos desafios ainda existentes, Helen Rees sublinhou que a pandemia trouxe sucessos à saúde em África, nomeadamente a nível político e de cooperação entre os vários países da região, no aumento da capacidade laboratorial, no reforço do acesso a diagnósticos ou na criação de capacidade de produção de vacinas.
LUSA/HN
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