Maria Cabral: “O objetivo da criação do gestor do doente oncológico é o doente ter alguém com quem possa falar sempre que sinta necessidade”

10/16/2022
Para a Joaquim Chaves Saúde, burocracia é uma preocupação a eliminar na luta contra o cancro. Nesse sentido, o Grupo criou o cargo de gestor do doente oncológico, estreado por Maria Duarte Cabral em meados de julho.

Desta forma, marcação de consultas e exames e conhecimento financeiro e jurídico deixam de ser um peso extra, por vezes difícil de suportar.

HealthNews (HN)- O que faz um gestor do doente oncológico?

Maria Cabral (MC)- Um gestor do doente oncológico trabalha essencialmente com o doente. O objetivo é fazer o seu acompanhamento desde o diagnóstico, ou da fase em que há uma suspeita de situação maligna, até à fase de seguimento, em que o doente já terminou os tratamentos e se encontra em vigilância. Este acompanhamento é feito pelo menos durante cinco anos.

Quando há uma suspeita de doença oncológica, queremos um diagnóstico rápido. O médico faz as prescrições necessárias e sinaliza ao gestor do doente oncológico, que garante o agendamento dos exames o mais rapidamente possível, acompanhando quando estes ficam prontos, de forma a agilizar uma consulta para o doente saber o que se está a passar. Ou seja, agilizo todo o circuito do doente, incluindo o que estiver relacionado com uma eventual cirurgia, marcando os pré-operatórios. Ajudo o doente a perceber qual é o circuito, o que é que tem de ser feito e como é que as coisas se vão processando.

Também lhes falo dos benefícios fiscais. Todos os doentes oncológicos têm direitos fiscais. Explico-lhes como é que podem pedir uma junta médica ou beneficiar dos direitos que têm. A isenção das taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde, a isenção do imposto de selo automóvel, quando se tem carro em nome próprio, e a descida da taxa do IRS são benefícios que o doente pode ativar.

Por exemplo, verificamos sempre se o doente tem o certificado de incapacidade multiusos, que lhe permite ter uma série de benefícios. Todos os doentes oncológicos têm direito a um grau de incapacidade de, pelo menos, 60% durante cinco anos. Este grau de incapacidade é adquirido através do certificado de incapacidade multiusos, passado normalmente numa junta médica, mas, mais recentemente, também por um médico oncologista.

O doente, quando recebe o diagnóstico, muitas vezes fica desorientado. Então, o objetivo é que haja um elo de ligação entre todas as unidades. Se tiver alguma dúvida e precisar de falar com o médico, o doente liga para mim e eu faço essa orientação. Tudo o que é do foro clínico encaminho para o médico. Comunico com os médicos e os enfermeiros sempre que há necessidade. O doente não precisa de ligar para um contact center e ficar à espera de uma resposta, porque acaba por me conhecer e ter o meu contacto, e eu consigo fazer essa orientação. O objetivo da criação do gestor é esse: o doente ter alguém com quem possa falar sempre que sinta necessidade.

Nós não queremos que estes doentes se sintam perdidos. O que acontece muitas vezes é que, como têm tantos exames para fazer, tantas coisas em que pensar, a parte burocrática fica um pouco aquém daquilo que os doentes autonomamente podiam fazer. O objetivo é ter alguém que os ajude a perceber como é que tudo funciona. Esse é o meu papel.

HN- Um papel que a obriga a comunicar com toda a equipa?

MC- Nós somos uma equipa multidisciplinar e trabalhamos todos em conjunto. Na reunião multidisciplinar, quando há um diagnóstico maligno, discute-se o caso do doente, para se definir qual a melhor orientação e o que é que se vai fazer. É uma orientação muito precisa e muito rigorosa.

Há aqui uma partilha entre as especialidades. Decide-se em conjunto com várias especialidades a orientação do doente. É uma visão de um todo, não uma visão única – uma mais-valia para o doente. Nós olhamos para o doente como um todo.

O facto de eu pertencer à equipa multidisciplinar também me ajuda a delinear melhor todo o caminho do doente e a perceber qual é o percurso. É importante eu estar sempre a par de todo o processo.

Além disso, tento compilar os exames num só dia, sempre que possível, para o doente não ter de fazer muitas deslocações, e tento agilizar os resultados. O nosso objetivo é, após uma biópsia, ter o resultado no espaço de 48 horas. Muitas das vezes, nos casos de cancro, é necessário fazer estudos adicionais para caracterizar o tumor, o que pode atrasar um pouco, mas, normalmente, em cinco dias o doente terá o diagnóstico e começará a ser orientado para uma terapêutica.

Na Joaquim Chaves Saúde, preocupamo-nos muito com o conforto e o bem-estar dos doentes; por isso, estes têm sempre o meu contacto direto. Os doentes têm sempre um apoio além do suporte médico. Eles conhecem sempre a pessoa que está do outro lado, acabando por sentir algum conforto. Às vezes até me colocam questões que não surgiram em consulta, ou partilham comigo informação relevante para eu passar ao médico. A questão da empatia também ajuda muito neste processo.

O gestor do doente oncológico também é um suporte fundamental para as famílias dos doentes, que vão poder estar focados no seu tratamento.

HN- Qualquer doente com cancro pode pedir o seu acompanhamento?

MC- Certo. Os médicos também já estão sensibilizados.

Os doentes de fora que queiram uma segunda opinião também podem contactar-me e pedir o meu apoio.

Neste momento, estamos a começar a trabalhar em três grandes áreas: mama, pele e urologia. Em termos de diagnóstico, conseguimos dar resposta em várias áreas, mas estas três são as que estamos a orientar com mais frequência e para as quais fazemos um acompanhamento completo, desde o diagnóstico até ao tratamento.

Apesar de já fazermos a oncologia há muito tempo e de as coisas estarem organizadas internamente, não havia uma pessoa de referência. O Grupo quis elevar a experiência em termos de atendimento e orientação do doente.

Entrevista de Rita Antunes

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