Em entrevista à Lusa, no âmbito da iniciativa Best of Estoril Conferences, que antecipa as Conferências do Estoril de 2022, a responsável pela organização internacional sem fins lucrativos que fundou em 2001 recordou que as mulheres estiveram na linha da frente do combate à pandemia, revelando-se “incrivelmente resilientes”.
Por isso, “não é justo” que “a maioria do trabalho mal pago” seja feito por mulheres. “Como é possível? Isto tem de mudar”, reivindica, em entrevista realizada por via remota.
Um estudo divulgado pelo Instituto Europeu para a Igualdade de Género a 5 de março mostrava que o impacto da pandemia foi mais forte nas mulheres, nomeadamente com as “pesadas reduções de emprego em profissões dominadas por mulheres”, como é o caso dos setores têxtil, retalho, alojamento, lares e trabalho doméstico.
As mulheres representam a maior fatia da força de trabalho nestes setores e foi nestes que se perderam “40% dos empregos” femininos, apontava o relatório “Igualdade de género e as consequências socioeconómicas da crise de covid-19”, preparado a pedido da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia.
Na primeira vaga de covid-19, verificou-se uma redução de 2,2 milhões de empregos para as mulheres em toda a União Europeia – com Portugal a ser o quinto país com mais perda de trabalho feminino (dados do segundo trimestre de 2020).
Os homens perderam 2,6 milhões de empregos, mas a recuperação do trabalho no verão beneficiou-os mais – as mulheres resgataram apenas metade dos empregos que os homens retomaram.
Isso significa que “o impacto económico da pandemia está a ter efeitos mais duradouros nas mulheres”, alerta o EIGE, sublinhando que as jovens (15-24 anos) são as mais vulneráveis.
Acresce que, com base em dados do primeiro trimestre de 2020, entre a população europeia que está a passar à inatividade – que, depois de ficar desempregada, não está a procurar emprego –, há mais mulheres em quase todos os Estados-membros (média de 40% vs. 33% nos homens). Também aqui Portugal ocupa a segunda posição, só atrás de Itália, no caso das mulheres, mas desce para sétimo no caso dos homens.
Salientando o papel das mães na educação, a diretora-executiva da Women without Borders, sediada em Viena e que trabalha para capacitar as mulheres como agentes de mudança, realça que “muitas vezes as mulheres não têm a confiança nem as competências para educar da melhor forma”.
Perante a atual crise que vivemos, Edit Schlaffer diz que “é preciso um movimento” de economistas e ativistas pelos direitos humanos e pela justiça social, que olhem para os planos de recuperação e resiliência nacionais e europeus, de forma a evitar que seja feito “negócio como de costume”, porque essa abordagem “não é sustentável”.
Assinalando que “estamos a caminhar para uma situação muito frágil”, com consequências desastrosas”, em que “as grandes empresas contratam mão-de-obra barata”, mas as pessoas “não estão tão caladas e pacíficas como costumavam”, protagonizando “muitas disrupções e revoltas”, urge uma reflexão sobre a atual liderança.
“Precisamos de virar a equação do avesso. Vivemos um processo em que os líderes estão no topo, mas as pessoas, todos nós, estamos em baixo, e somos muitos. As pessoas podem assumir o poder e talvez o exerçam, a dado momento”, realça.
LUSA/HN
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