Doentes portugueses são os que mais esperam por medicamentos inovadores na Europa

8 de Julho 2020

A Federação Europeia de Indústrias e Associações Farmacêuticas (EFPIA) garante que milhares de doentes na Europa são impedidos de aceder a tratamentos inovadores devido à falta de recursos financeiros. Para a federação, novos modelos de pagamento e preços “podem ajudar a resolver o acesso dos pacientes a novos tratamentos”. Em Portugal o acesso de doentes a medicamentos inovadores pode demorar quase dois anos.

À medida que surgem tratamentos médicos inovadores que prolongam a sobrevivência e melhoram a qualidade de vida dos pacientes, surgem novos desafios para os sistemas de saúde. As novas opções de tratamento exigem, muitas vezes, novos preços e modelos de pagamentos.

No entanto, apesar de a indústria farmacêutica acreditar que estes novos modelos facilitam a acessibilidade dos doentes a tratamentos inovadores, nem sempre são acessíveis para todos. A falta de dados apropriados, barreiras legais e o atraso na adaptação aos sistemas atuais muitas vezes impedem o uso dos novos modelos de preço e pagamentos.

Tendo em conta todos estes obstáculos, a indústria propõe que o uso de modelos assentes no “princípio de acesso, valor, colaboração, transparência e de infraestrutura”. O objetivo consiste em garantir “o interesse dos pacientes em primeiro lugar”.

A EFPIA explica que nos últimos anos tem sido possível “observar os frutos do avanço científico e do investimento em tecnologias inovadoras”, sendo que a indústria conseguiu desenvolver cerca de sete mil medicamentos em diversas áreas terapêuticas, novas técnicas de diagnóstico, pesquisas genómicas e avanços em dados de análise, “refletindo um maior foco na medicina personalizada”.

“Um exemplo do progresso científico são as terapias de genes e células. Existem 34 genes a ser estudados em ensaios cruciais, sendo que vários já têm sido aprovados nos últimos dois anos. Os benefícios esperados para os pacientes e para o sistema de saúde são significativos, podendo aumentar o tempo de vida de doentes com cancro ou distúrbios genéticos com apenas uma administração”.

A EFPIA acrescenta que “eles aumentam a eficácia das vias de tratamento, compensando custos associados e a redução de hospitalizações de emergência. Os benefícios para pacientes individuais se traduzem em benefícios sociais a longo prazo – as pessoas passam a viver uma vida mais longa, saudável e produtiva, contribuindo para a economia e aliviando o impacto nos cuidadores.”

Os novos tratamentos que promovem a personalização das estratégias de tratamento, apesar de oferecer benefícios aos pacientes, representam novos desafios no que diz respeito ao pagamento e ao reembolso.

Entre os desafios inclui-se: o custo único para o sistema, “no caso de tratamentos curativos únicos, como genes e terapias celulares, quem paga enfrenta o desafio de um único pagamento adiantado enquanto os benefícios de curar um paciente ocorrem muitos anos no futuro e se estendem a áreas além da economia no sistema de saúde”; a incerteza em torno da magnitude e duração do benefício clínico; uso de medicamentos através de indicações e combinações, “avaliações de múltiplos valores e terapias combinadas podem resultar em encargos administrativos, podendo atrasar o acesso”.  “As preocupações existentes na acessibilidade e no impacto orçamental podem constituir uma barreira ao acesso equitativo e oportuno dos pacientes aos tratamentos”.

Tendo em conta os desafios que os pacientes enfrentam no acesso a tratamentos inovadores, a EFPIA defende a necessidade de novos preços e modelos de pagamento em casos específicos. “Novos modelos de preços e pagamento […] podem representar uma alternativa aos sistemas existentes com base em descontos, acordos simples de volume de preços e limites de orçamento”.

A utilização destes novos modelos têm demonstrado que a sua utilização amplia o acesso dos pacientes e contribui para a melhoria da sustentabilidade dos sistemas de saúde. No entanto, na Europa há registo de níveis variados de experiência. “Os quadros legais e regulamentares dos países europeus ainda não foram totalmente atualizados para acomodar a natureza dinâmica dos novos modelos de pagadores e da indústria farmacêutica. A necessidade para mudanças legislativas varia significativamente. Em alguns mercados, todos os novos modelos de preços e pagamentos já são possíveis. No entanto, em outros as mudanças são ou foram necessárias.”  A falta de quadros legislativos adequados, em alguns países, também pode servir como barreira aos processos de fixação dos preços e reembolso de combinações de várias empresas.

A EFPIA explica ainda que “a falta da infraestrutura de dados necessários, no registo electrónico de pacientes ou bancos de dados de pagadores, geralmente é a principal barreira na implementação de novas abordagens de preços e pagamentos. A coleta de dados também é um pré-requisito necessário para preços baseados em indicação e combinação viáveis ​​e baseados em resultados, nomeadamente através de rastrear a utilização de medicamentos em diferentes contextos e registrar os resultados dos pacientes. Os sistemas de saúde que lideram o uso de novas abordagens são aqueles com os mecanismos existentes de coleta de dados, como a Itália, algumas regiões da Espanha e Estônia. Uma barreira adicional é a falta de estruturas de governança definidas no compartilhamento de dados, mecanismo de solução de controvérsias, padrões de qualidade na coleta de dados e acordo sobre processo para realizar análise e interpretação dos dados.”

De acordo com um estudo sobre o tempo de espera para o acesso de doentes a terapias inovadoras nos países europeus, realizado pela EFPIA, demonstra que quase 50% dos medicamentos que são aprovados pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) não estão disponíveis em Portugal.

As estatísticas revelam que no sistema de saúde português 43% dos medicamentos aprovados pela EMA estão disponíveis no serviço público, 8% dos medicamentos são limitados, 1% são estão apenas disponíveis nos privados e 49% não estão sequer disponíveis no país.

Relativamente ao tempo de espera entre a autorização de introdução no mercado do medicamento pela EMA e a disponibilização do medicamento ao doente, Portugal também demonstra atrasos comparativamente com países como a Alemanha, Dinamarca, Suíça, Países Baixos, Suécia, Finlândia, Austria, Inglaterra , Turquia, Espanha e outros 17 países europeus. Em Portugal este período, em média, chega a 711 dias de espera.

Já no tempo que leva entre a aprovação de introdução no mercado do medicamento pela EMA e o tempo em que os doentes podem aceder ao medicamento de forma comparticipada, em Portugal este período chega aos 684 dias.

Para garantir o acesso de qualquer doente a tratamentos inovadores, a indústria farmacêutica garante o compromisso no “diálogo com os países para abordar possíveis barreiras regulatórias”, na “formação de parcerias”, na “criação de plataformas de coleta de dados com os pagadores”, bem como na promoção da “conscientização dos valores de novos modelos de pagamento e preços e os benefícios que eles oferecem”.

NR/HN/Vaishaly Camões

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